CLONAGEM TERAPÊUTICA - DIREITOS FUNDAMENTAIS À SAÚDE, À VIDA E À DIGNIDADE HUMANA

Renata Salgado Leme

Universidade Santa Cecília – Unisanta, São Paulo

Márcia Fuchs dos Santos

Universidade Santa Cecília – Unisanta, São Paulo

RESUMO: O artigo analisa a violação de direitos fundamentais em decorrência da proibição da clonagem terapêutica, em face das modalidades de aborto permitidas no Brasil - aborto necessário e sentimental -, no que tange à tutela concedida aos embriões envolvidos nesses dois processos. Adota-se o método de abordagem dedutivo, pois a pesquisa tem como objetivo examinar se os direitos fundamentais são violados/​limitados, diante da proibição da clonagem terapêutica, pela Lei de Biossegurança. O procedimento adotado é o bibliográfico, a partir de consultas à legislação, doutrina, artigos científicos e jurisprudência que se referem ao tema em questão.

PALAVRAS-CHAVE: Clonagem terapêutica. Biodireito. Direitos fundamentais. Direito à saúde. Dignidade humana

Therapeutic cloning - fundamental right to health, life and human dignity

ABSTRACT: The article analyzes the violation of fundamental rights due to the prohibition of therapeutic cloning, in view of the abortion modalities allowed in Brazil - necessary and sentimental abortion - regarding the protection granted to the embryos involved in these two processes. The method of deductive approach is adopted because the research aims to examine if fundamental rights are violated /​ limited, in view of the prohibition of therapeutic cloning, by the Biosafety Law. The procedure adopted is the bibliographical one, from consultations to the legislation, doctrine, scientific articles and jurisprudence that refer to the subject in question.

KEYWORDS: Therapeutic cloning. Biolaw. Fundamental rights. Right to health. Human dignity.

Introdução

O trabalho que será apresentado tem como objetivo demonstrar a violação de direitos fundamentais, em virtude da proibição da clonagem terapêutica, pela Lei 11.105/​2005. A hipótese será analisada estabelecendo uma analogia entre a proibição da clonagem terapêutica e a determinação legal dos abortos necessário e sentimental, previstos no código penal. O tema envolve direitos fundamentais como a dignidade humana, a autonomia individual, o direito à saúde e o direito à vida.

A tese apresentada se desdobra em duas questões: de um lado, o direito à saúde, à vida, à autonomia individual em decidir sobre sua própria vida, mais especificamente sobre sua saúde, buscando por meio da clonagem terapêutica uma tentativa de tratamento e cura para a sua doença; do outro lado, o direito à vida dos embriões e as várias teorias que procuram esclarecer em qual momento a vida humana tem início.

Em um primeiro momento, analisaremos as definições dadas pela ciência acerca de células-tronco adultas e células-tronco embrionárias e suas diferenciações. No tópico seguinte serão abordados os mecanismos e objetivos da clonagem terapêutica. De forma concisa, serão apontadas as teorias sobre o início da vida e a Lei de Biossegurança. Nos últimos dois tópicos é que se adentra propriamente o debate, examinando os direitos fundamentais à vida, à saúde e à autonomia individual como elementos da dignidade humana e a proibição da clonagem terapêutica em contraposição às possibilidades legais de aborto no Brasil.

Pretende-se demonstrar o tratamento legal dado aos embriões in vitro, e aos embriões in utero e os possíveis benefícios da clonagem terapêutica para os indivíduos doentes.

1. Definindo células-tronco: adultas e embrionárias

De acordo com Mayana Zatz[1], há diferentes tipos de células-tronco em todo o corpo humano. As células-tronco adultas são aquelas que se originam durante o desenvolvimento fetal e permanecem no nosso corpo durante toda a vida. São encontradas em diferentes órgãos do corpo humano, como na medula sanguínea, no cordão umbilical, no tecido adiposo, na polpa do dente de leite etc. Essas células têm o potencial de formar tecidos iguais àqueles de onde foram extraídas. (ZATS, 2011, p.134) Contudo, seu uso é mais restrito por elas serem de difícil multiplicação e por sua dificuldade de diferenciar-se em outros tipos de células. No entanto, têm oferecido enormes benefícios, como por exemplo em casos graves de queimaduras de pele e problemas na retina. (NEIVA, 2005, p. 120-121)

Já as células-tronco embrionárias são extraídas de embriões obtidos por meio de técnicas de fertilização in vitro, ou então a partir de clonagem terapêutica. Essas células são destacadas do embrião na fase de blastocisto, ou seja, quando o embrião contém aproximadamente 200 células, estando com quatro ou cinco dias de fecundação. A característica principal dessas células é a sua capacidade de se autorreplicar e se autorrenovar infinitamente, isto é, podem se converter nos 216 tipos celulares que compõem o corpo humano, daí sua importância para fins terapêuticos.

2. Desvendando a clonagem terapêutica: transferência celular

“A clonagem é um procedimento que origina uma cópia idêntica de um organismo a partir de uma única célula. Em humanos, os clones naturais são os gêmeos idênticos que se originam da divisão de um óvulo fertilizado por um único espermatozóide.” (ZATS, 2004) Na clonagem reprodutiva, o processo se dá com a retirada do núcleo de uma célula somática de qualquer tecido do corpo humano. Então, esse núcleo é inserido em um óvulo e implantado em um útero. Caso o óvulo se desenvolva, um novo indivíduo seria criado com as mesmas características físicas e genéticas da célula diferenciada que lhe deu origem.

O processo de clonagem reprodutiva é muito difícil e pouco eficiente. Em clonagem de animais, apenas 10% dos embriões clonados são transferidos para o útero e geram um animal saudável. No caso da ovelha Dolly, foram 276 tentativas até se conseguir o animal clonado. A clonagem reprodutiva humana é proibida pela Lei 11.105/​2005, assim como em documentos internacionais – Declaração Universal sobre o Genoma Humano – e na legislação interna dos países.[2]

A clonagem terapêutica também é chamada clonagem não reprodutiva (art. 3º, X, da Lei 11.105/​2005). O pesquisador americano Bert Vogelstein sugere a expressão “transferência celular” em vez de “clonagem terapêutica”, por se tratar de procedimentos com objetivos diferentes: (REINACH; ZATS; CRUZ; CORRÊA, 2005, p.55) a clonagem reprodutiva tem como objetivo reproduzir uma cópia de um ser vivo, enquanto a clonagem terapêutica tem o intuito de retirar do embrião in vitro células-tronco embrionárias para tratamentos médicos. Desse modo, a clonagem terapêutica “é um procedimento no qual o núcleo de uma célula é transferido para um óvulo sem núcleo e este adquire as características de uma célula-tronco embrionária com potencial de originar qualquer tecido”. (ZATS, 2011, p.192).

Diante dessa perspectiva, a clonagem terapêutica teria o escopo de produzir tecidos ou órgãos para o tratamento de doenças, em vez de usar células embrionárias armazenadas nas clínicas de reprodução assistida. A ideia seria produzi-las a partir de células retiradas do próprio paciente, cultivá-las e multiplicá-las em laboratório, induzindo sua diferenciação em tecidos específicos de acordo com a necessidade. (ZATS, 2011, p. 182) Quando transplantadas, poderiam regenerar o tecido ou o órgão danificado sem o risco de rejeição.

Quando aprovada a Lei de Biossegurança no Brasil, em 2005, a clonagem terapêutica foi proibida. Segundo os oposicionistas, a técnica abriria caminho para a clonagem reprodutiva e iria gerar um comércio clandestino de óvulos, tutelando-se os embriões sob o argumento de sua destruição e instrumentalização. Diversos países já flexibilizaram a legislação autorizando a clonagem terapêutica, como a Bélgica, Finlândia, Espanha, Suécia, Reino Unido, México, Israel, África do Sul, Austrália, China, Índia, Japão, Singapura, Coréia do Norte e alguns estados dos EUA (Califórnia, Illinois, Iowa, Maryland, Massachusetts, Missouri, New Jersey, Rhode Island).[3]

Um dos principais objetivos da clonagem para fins terapêuticos seria a tentativa de solucionar o problema da doação de órgãos para transplantes.[4] Outra finalidade das células- tronco embrionárias é a reparação dos tecidos cardíacos em casos de infarto. O desenvolvimento dessa terapia tem revelado o caminho para a medicina do século XXI, porque torna possível a cura de doenças como Alzheimer e Parkinson, doenças neuromusculares e medulares, entre outras doenças degenerativas.

3. A Lei de Biossegurança e o debate sobre o início da vida

No Brasil, a Lei de Biossegurança 11.105/​2005, regulamentada pelo Decreto nº 5.591/​2005, condicionou o uso de células-tronco embrionárias aos limites do artigo 5º da referida lei e do artigo 63 do respectivo Decreto.[5] As pesquisas são permitidas com células-tronco de embriões excedentes de fertilizações in vitro, após o período de três anos, quando considerados inviáveis, necessitando do consentimento formal dos genitores.

São considerados embriões inviáveis, conforme determina o artigo 3º, XIII, do Decreto nº 5.591/​2005[6], aqueles que no período de 24 horas desenvolveram-se inadequadamente, ou que venham a apresentar alterações morfológicas, podendo comprometer o seu desenvolvimento. Depreende-se assim que somente os embriões inviáveis e remanescentes que foram congelados há mais de três anos podem ser utilizados para fins de pesquisa e terapia. A legislação brasileira proíbe a clonagem terapêutica para fins de pesquisa e tratamento.

Com efeito em maio de 2008, o Supremo Tribunal Federal manifestou-se acerca da constitucionalidade do art. 5º da Lei 11.105/​2005 em ação declaratória de inconstitucionalidade, proposta pela Procuradoria-Geral da República - ADin 3510 – sob a alegação de que o referido artigo violava o direito fundamental à vida, previsto no artigo 5º, caput, da Constituição Federal, bem como configurava ofensa ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, artigo 1º, inciso III da Carta Magna.

O Pleno do Supremo Tribunal Federal seguiu a relatoria do Ministro Carlos Ayres Britto e fez prevalecer, por seis votos a cinco, o entendimento de que o embrião in vitro não é pessoa, não se equipara ao nascituro e, portanto, não tem direito à personalidade, não possuindo assim, consequentemente, dignidade da pessoa humana e, com base nesse entendimento, as pesquisas com embriões humanos excedentes continuaram a ser autorizadas em todo o País. (ROCHA, 2012, p. 146)

Diante dessa perspectiva, ainda que a Lei de Biossegurança estabeleça determinadas condições para a realização de pesquisas com células-tronco embrionárias, não nos parece que os entraves tenham sido totalmente removidos, pois a clonagem terapêutica para fins de terapia não foi aprovada pela legislação.

Os debates éticos e jurídicos giram em torno do início da vida e, consequentemente, da utilização desses embriões para a retirada de células-tronco embrionárias. Os oposicionistas à técnica da clonagem terapêutica e à pesquisa com embriões argumentam que a retirada de células-tronco desses embriões para cultivo laboratorial implicaria a destruição desses seres e a sua instrumentalização, desrespeitando o direito à vida, pois consideram o embrião in vitro pessoa. Segundo entendimento da jurista Renata da Rocha: (2012, p. 106)

[…] à decisão confirmadora da constitucionalidade da pesquisa com embriões humanos é aquela que leva a compreender que, não sendo o embrião humano considerado pessoa, tal como se posicionou o Supremo Tribunal Federal e, não tendo, em virtude desse posicionamento, dignidade, está-se, a partir de então, autorizado a inseri-lo, conforme a tradicional classificação do Direito Civil, no regime jurídico Do Direito das Coisas – res – e aceitar que como objeto de direito, encontra-se submetido, por exemplo, ao instituto jurídico Da Propriedade.

Nesse sentido, tenta-se esclarecer quando a vida se inicia. O embrião humano fecundado em laboratório - embrião in vitro - pode ser considerado pessoa? Qual o status que se deve conferir a esse embrião? A ciência já definiu que o fim da vida ocorre quando se encerra a atividade cerebral, consenso adotado pela Lei dos Transplantes.[7] Inúmeras são as teorias que tentam explicar em que momento a vida humana se inicia. De forma concisa, abordaremos as mais importantes.

Para a teoria concepcionista, a vida humana inicia-se com a fertilização do óvulo pelo espermatozoide. A partir desse evento o embrião já possui condição plena de humano, é um ser único e irrepetível, com identidade genética própria, distinta daqueles que lhe deram origem.

A teoria genético-desenvolvimentista pretende analisar a proteção do embrião de acordo com a fase do novo ser que se forma. Para os adeptos dessa corrente, o embrião humano adquire status jurídico e moral conforme o avanço de seu desenvolvimento. Decorrem da teoria genético-desenvolvimentista outras teorias, entre elas a teoria da nidação do ovo, a teoria da formação dos rudimentos do sistema nervoso central e a teoria do pré-embrião.

A terceira é a teoria da pessoa humana em potencial, a qual considera o embrião humano uma criatura possível. Ou seja, o embrião humano não é identificado com a pessoa humana, porém seus defensores não admitem o seu status como um amontoado de células, pois em determinado momento há de ser vida. Essa teoria reivindica um estatuto próprio para o embrião.

Por sua vez, a teoria do pré-embrião, entre as teorias genético-desenvolvimentistas, é a que mais exerce influência no cenário legislativo mundial. (ROCHA, 2008, p. 106) Essa teoria entende que, até o 14º dia após a concepção, o que existe é uma célula progenitora com a capacidade de gerar um ou mais indivíduos. Foi a partir desse entendimento que as pesquisas com embriões humanos excedentes no Brasil foram aprovadas durante os primeiros 14 dias após a concepção. (ROCHA, 2008, p. 106-107)

Não existe um consenso científico e moral sobre o momento em que a vida humana se inicia. Setores da sociedade como a Igreja consideram que os embriões têm o mesmo direito à vida que os seres humanos já nascidos. A Igreja Católica defende a posição de que já o zigoto é uma pessoa humana, e por isso considera a utilização de células-tronco embrionárias como homicídio. Neste caso, o conflito entre a posição da Igreja Católica e a jurisprudência brasileira é evidente. (MALUSCHKE, 2009, p.58)

 Pesquisadores, cientistas, geneticistas e representantes de movimentos favoráveis ao uso de células embrionárias admitem que seja necessário conceder algumas proteções, porém consideram o embrião apenas um material biológico pertencente aos seus genitores, e qualquer uso só deveria ser permitido com o consentimento daqueles em cujo material genético e gametas foi gerado o embrião.

No próximo tópico analisaremos os direitos garantidos constitucionalmente aos indivíduos que necessitam das pesquisas e da terapia com células-tronco embrionárias e que veem seus direitos cerceados em face da proibição da clonagem terapêutica em nossa legislação.

4. Direitos fundamentais à vida, à saúde e à dignidade humana como elemento da autonomia individual

Sabe-se que a conquista de direitos do homem foi um longo caminho percorrido na história da humanidade. As constituições contemporâneas, inclusive a brasileira, elencam uma série de direitos fundamentais como o direito à vida, o direito à liberdade, o direito à saúde, o direito à igualdade, o direito ao trabalho, entre tantos outros. No entanto, direitos fundamentais foram cerceados quando a Lei de Biossegurança proibiu a clonagem terapêutica e limitou as pesquisas aos embriões excedentes.

O direito fundamental à saúde está reconhecido nos artigos 6º e 196 da Constituição Federal. Este último dispõe: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso igualitário e universal às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

A Constituição Federal, quando diz “recuperação”, está se referindo à saúde curativa; os termos “redução do risco de doença” e “proteção” estão relacionados à saúde preventiva; e o termo “promoção” se refere a qualidade de vida, posteriormente explicitada pelo art. 225 da Carta Magna. (SCHWARTZ, 2001, p. 27) [8] Nesse sentido, o legislador, ao proibir a clonagem terapêutica, não levou em conta o dever que cabe ao Estado de garantir a efetivação do direito à saúde a todos os brasileiros.

O desenvolvimento de técnicas de clonagem com fins terapêuticos deve ser considerado como uma nova alternativa para promover o direito à saúde. Ao vedar a clonagem terapêutica, a Lei de Biossegurança restringiu a possibilidade de busca e livre acesso a todos os recursos científicos disponíveis pela ciência. Impulsionar a promoção, a proteção e a recuperação da saúde por meio de tratamentos e novas tecnologias para possibilitar uma melhor qualidade de vida e, consequentemente, uma vida mais digna é dever do Estado.[9] Incumbe ao Estado proporcionar meios visando a alcançar a saúde.

A noção de saúde como direito fundamental no ordenamento brasileiro se fundamenta na definição adotada pela Organização Mundial da Saúde, como sendo o completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença ou enfermidade.[10] Gozar do melhor estado de saúde possível constitui um dos direitos fundamentais de todo ser humano. É por meio do direito à saúde que se reconhece o direito à vida. Para viver uma vida digna é necessário ter o direito de ter e buscar a saúde.

Logo, a saúde é um direito indissociável do direito à vida e da garantia da dignidade humana. Nessa perspectiva, a saúde é um elemento de cidadania. Nas palavras de Cunha Junior (2008, p. 385) o direito à saúde:

[…] constitui uma exigência inseparável de qualquer Estado que se preocupa com o valor “vida” o reconhecimento de um direito subjetivo público à saúde, uma vez que, denegá-lo, significaria o mesmo que admitir a aplicação da pena de morte, que é, como se sabe vedada constitucionalmente […] e o que é pior, sem crime e sem processo.

Fica evidente a relevância do direito à saúde como direito fundamental para a garantia de uma vida digna. Afinal, a proteção à saúde é muitas vezes um imperativo da manutenção do próprio direito à vida, bem como da integridade física e psíquica das pessoas. (SARLET, 1998, p. 296-297) A clonagem terapêutica para muitos pacientes é a única esperança de cura ou, pelo menos, alívio de sintomas. Como negar ou mesmo limitar essa chance de tratamento e cura que envolve direitos fundamentais essenciais aos seres humanos, como o direito à saúde e à vida?

A vida e a saúde, direitos essenciais à existência humana, são instrumentos da dignidade. O direito à vida abrange não só o direito de não ser privado da vida, mas também o direito de continuar vivo e desfrutar a vida com saúde. Segundo Ronald Dworkin, os gregos expressavam o conceito de vida usando duas expressões: zoe, para significar vida física ou biológica, e bios, para designar a vida como um processo vivido, formado pela totalidade de ações, decisões e motivos. (DWORKIN, 2003, p. 115)

Assim, proibir que pessoas busquem tratamentos é atentar contra a vida e a dignidade humana. As condições físicas e emocionais das pessoas que esperam por tratamentos com células-tronco embrionárias são dolorosas, elas reclamam a possibilidade de realizar a clonagem terapêutica, a partir das suas próprias células, como uma última alternativa para contornar o problema da rejeição em decorrência das enfermidades acometidas.

A dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º, III) e tem sido invocada em casos de grande complexidade moral, em virtude de sua força jurídica e argumentativa. (GOLDMAN, apud BARROSO, 2010, p.5) Segundo o imperativo categórico kantiano, a dignidade pressupõe que toda pessoa é um fim em si mesma, isto é, todo ser humano possui um valor intrínseco, inerente. (KANT, 2004, p. 68)

Logo, a dignidade humana pode se expressar na responsabilidade de cada um por sua própria vida, pelas escolhas de seus valores e objetivos. As decisões da vida de uma pessoa não devem ser impostas por uma vontade externa a ela. (DWORKIN, 2008, p. 9) O homem como um ser ético, uma vez que de sua racionalidade derivamos a sua autonomia, ou seja, a sua inata capacidade de impor normas para si mesmo e de se guiar pelas normas que sua razão livremente impõe.

A dignidade humana constitui o núcleo, o fundamento dos direitos humanos. As várias formas de vida estão reunidas na dignidade humana, indo muito além da integridade física, englobando a esfera moral e psicológica, visando o real conceito de pessoa humana. É diante do direito à vida e à saúde que cabe discutir a dignidade humana como fundamento da escolha/​autonomia individual, em outras palavras, como fundamento da opção de realizar a clonagem terapêutica para fins de tratamento. A dignidade humana materializada na autonomia, como poder individual, concentra quatro elementos: a capacidade de autodeterminação, as condições para o exercício da autodeterminação, a universalidade e a inerência da dignidade ao ser humano. (BARROSO; MARTEL, 2010, p. 251)

A capacidade de autodeterminação diz respeito à liberdade individual sem interferências ilegítimas do Estado nas escolhas morais e pessoais do indivíduo, como casamento, religião, gênero e outras opções, desde que não violem direito de terceiros. Nesse sentido, a laicidade e o pluralismo estão associados à ideia de dignidade como autonomia.

No que se refere às condições para o exercício da autonomia, é indispensável a garantia de um “mínimo existencial” (BARROSO; MARTEL, 2010, p. 25) de direitos fundamentais, como o direito à saúde, alimentação, moradia, educação, ou seja, a satisfação de necessidades básicas essenciais para uma existência digna configura o instrumento de efetivação da dignidade como autonomia. Existe uma ligação entre as condições mínimas de vida – mínimo existencial – associadas à dignidade humana.

Quanto à perspectiva da universalidade da dignidade humana, significa dizer que a dignidade deve ser igual para todos, não cabendo comparações entre os indivíduos, considerando obviamente os aspectos multiculturais. Quanto à sua natureza intrínseca, a dignidade não pode ser obtida nem perdida, ela está interiorizada à condição de ser humano, não precisa ser demonstrada, apenas reconhecida.

Verifica-se que a dignidade como autonomia individual valoriza o indivíduo, sua liberdade e seus direitos fundamentais. (BARROSO; MARTEL, 2010, p. 260) Contudo, a dignidade também pode ter outro viés, a heteronomia. A dignidade como heteronomia traduz uma concepção que abriga valores compartilhados pela comunidade como bem comum, interesse público e moralidade. O ponto de vista albergado por essa concepção reside em contemplar interesses da coletividade em contraposição a interesses individuais. Por conseguinte, a dignidade teria o objetivo de demarcar limites à liberdade dos indivíduos de acordo com os valores da comunidade, resguardando os sujeitos de atos provocados contra si mesmo e protegendo direitos de terceiros e valores sociais. Em muitas situações é necessário que a dignidade tenha uma dimensão heterônoma, legitimando restrições à liberdade com base na proteção à dignidade do próprio indivíduo, como nos casos de defesa da vida.

A Constituição Federal garante a dignidade humana nas duas perspectivas, como autonomia e como heteronomia. No entanto, é dada uma maior ênfase à dignidade como autonomia, haja vista as liberdades pessoais asseguradas pela constituição que perfazem o rol de direitos individuais e garantias. (BARROSO; MARTEL, 2010, p. 261)

Assim, proibir que indivíduos se utilizem de tratamentos a partir da clonagem terapêutica cerceia o direito à vida, à saúde e à dignidade humana como autonomia. Deve-se admitir como uma escolha possível por parte do paciente ou familiares/​responsáveis a clonagem terapêutica.

Diante desse contexto, percebe-se que não basta viver ou existir, há de se garantir que a vida seja experimentada em sua integridade, entendida como qualidade intrínseca ao ser humano. É o princípio da dignidade humana que dá unidade aos direitos fundamentais.

5. Tutela dos embriões e a proibição da clonagem terapêutica

Destacamos o tratamento dado pelo código penal no artigo 128, I e II - aborto necessário e o aborto sentimental.[11] O legislador, ao permitir esses dois tipos de aborto, sopesou os direitos da gestante e do embrião/​feto, priorizando os direitos da mulher gestante. Cabe ressaltar que a autorização para esses casos de aborto sempre foi moral e juridicamente aceita, nunca tendo sido questionada sua constitucionalidade.

Traçando um paralelo quanto ao direito à vida dos embriões in vitro e dos embriões in utero, percebemos que a legislação concedeu tutelas diferenciadas nesses casos. Quando a lei penal permite o aborto, está protegendo única e exclusivamente os direitos reprodutivos, o direito à vida e à saúde das mulheres, sobrepondo-se ao direito à vida dos embriões/​fetos, in utero. Quanto aos embriões in vitro, a Lei de Biossegurança concede uma tutela diferenciada, proibindo a clonagem terapêutica, sua instrumentalização e o comércio desses embriões.[12]

Verifica-se que o embrião in vitro teve sua tutela blindada pela Lei de Biossegurança. Além do mais, limitou as pesquisas científicas com células embrionárias, ou seja, foi concedida uma tutela desproporcional em detrimento do direito à saúde, do direito à vida e da autonomia individual de pessoas que aguardam por tratamento via clonagem terapêutica. Constata-se que houve uma diferente valoração do direito à vida desses embriões, com relação a outras proteções concedidas pela lei.

Mesmo diante do caráter não absoluto dos direitos fundamentais, como no caso aqui do direito à vida, não nos parece coerente o tratamento adotado pela legislação. De um lado, a lei autorizando o aborto necessário e sentimental e, de outro, proibindo a clonagem terapêutica. Verifica-se um contrassenso na legislação, pois os bens jurídicos tutelados são os mesmos, em outras palavras, a autonomia individual, a saúde, a vida e a dignidade humana.

Afinal de contas, qual a diferença no que tange ao direito à vida entre o embrião in vitro e o embrião in utero? Considerando a teoria concepcionista, tanto o embrião in vitro quanto o embrião in utero, são dignos de igual proteção. Logo, não se poderia admitir a interrupção da gravidez em nenhuma dessas hipóteses.

 Partindo desse ponto de vista, o ilustre jurista Glauco Cidrack do Vale Menezesy (2004, p.146), ao refletir sobre a possibilidade do aborto eugênico assevera que:

Ora, ao se decidir pela autorização do aborto, ainda que em casos semelhantes ao abordado, afronta-se, além de um direito natural, um princípio fundamental, vez que, se traduz na intervenção do Estado na esfera jurídica do indivíduo pela limitação do direito à vida, quando o próprio Estado edita normas de proteção à vida. Sob nenhum aspecto, como iremos verificar, é justificável tal impropério jurídico.

No mesmo sentido, Maria Helena Diniz: “Examinando a questão sob a perspectiva no embrião in utero/​feto, fruto de um estupro não haveria um desrespeito à sua vida, sendo-lhe cobrada uma culpa que não tem? Não se deveria proteger a vida deste embrião também?” (2014, p. 96).

Portanto, do ponto de vista moral e jurídico não existe uma justificativa plausível que autorize a interrupção da gravidez e ao mesmo tempo proíba a clonagem terapêutica. O procedimento da clonagem terapêutica não contraria preceitos constitucionais, pelo contrário, os tratamentos advindos da clonagem terapêutica podem ser a forma de garantir o direito à vida, à saúde e à dignidade das pessoas que aguardam uma chance de cura.

Nesse contexto, admitindo que o direito à vida seja ponderável e adotando-se a teoria que entende que, até o 14º dia após a concepção, o que existe é uma célula progenitora com a capacidade de gerar um ou mais indivíduos, o tratamento a partir de células-tronco embrionárias do próprio paciente (clonagem terapêutica) também deveria ser autorizado, em consonância com a legislação que permite o aborto sentimental e o aborto necessário, ainda que os motivos da autorização da interrupção da gravidez sejam diversos, estão em jogo direitos fundamentais idênticos como à saúde, à vida e à autonomia do indivíduo.

Ademais, o Supremo Tribunal Federal, nas decisões que envolvem o direito à vida, tem se posicionado no sentido de ponderar esse direito respeitando a autonomia individual, o direito à saúde e o direito à vida das pessoas já nascidas, conforme determina o artigo 2º do Código Civil, conferindo personalidade jurídica ao feto somente após o nascimento com vida.[13] O voto proferido pelo Ministro Marco Aurélio na Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.51-0 demonstra esse entendimento[14]:

Assentar que a Constituição protege a vida de forma geral, inclusive a uterina em qualquer fase, já é controvertido – a exemplo dos permitidos aborto terapêutico ou do resultante de opção legal após estupro -, o que se dirá quando se trata de fecundação in vitro já sabidamente, sob o ângulo técnico e legal, incapaz de desaguar em nascimento. É que não há a unidade biológica a pressupor, sempre, o desenvolvimento do embrião, do feto, no útero da futura mãe. A personalidade jurídica, a possibilidade de considerar-se o surgimento de direitos depende do nascimento com vida e, portanto, o desenlace próprio à gravidez, à deformidade que digo sublime: vir o fruto desta última, separado do ventre materno, a proceder à denominada troca oxicarbônica com o meio ambiente.

Diante da perspectiva do término da vida humana, a Lei nº 9.434/​1997, Lei dos Transplantes, vincula a morte de uma pessoa ao momento em que se dá a morte cerebral. Nesse sentido, a permissão legal da clonagem terapêutica não fere o direito à vida dos embriões in vitro, pois, segundo a teoria da formação dos rudimentos do sistema nervoso, até o décimo quarto dia após a fecundação os embriões ainda estão desprovidos de qualquer atividade cerebral, inexistindo vida humana[15]. (ROCHA, 2008, p. 105)

Outrossim, a aprovação das pesquisas com embriões humanos foi assentada na teoria do pré-embrião, a qual entende que até o décimo quarto dia o que existe é uma célula progenitora dotada de capacidade de gerar um ou mais indivíduos. (ROCHA, 2008, p. 106) Segundo essa teoria, a célula progenitora ainda não pode ser considerada vida humana. Isso posto, no relatório do Ministro Carlos Britto, na ADI 351-0, manifesta seu entendimento em relação ao status protetivo do embrião in vitro antes de ser transferido ao ventre materno.

[…] III – A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DO DIREITO À VIDA E OS DIREITOS INFRACONSTITUCIONAIS DO EMBRIÃO PRÉ-IMPLANTO – O Magno Texto Federal não dispõe sobre o início da vida humana ou o preciso instante em que ela começa. Não faz de todo e qualquer estádio da vida humana um customizado bem jurídico, mas da vida que já é própria de uma concreta pessoa, porque nativiva (teoria “natalista”, em contraposição às teorias “concepcionista” ou da “personalidade constitucional”). Quando se reporta a “direitos da pessoa humana” e até dos “direitos e garantias individuais” como cláusula pétrea está falando de direitos e garantias do indivíduo-pessoa, que se faz destinatário dos direitos fundamentais “à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”, entre outros direitos e garantias igualmente distinguidos com o timbre da fundamentalidade (como direito à saúde e ao planejamento familiar). Mutismo constitucional hermeuticamente significante de transpasse de poder normativo para a legislação ordinária. A potencialidade de algo para se tornar pessoa humana já é meritória bastante para acobertá-la, infraconstitucionalmente, contra tentativas levianas ou frívolas de obstar sua natural continuidade fisiológica. Mas as três realidades não se confundem: o embrião é embrião, o feto é o feto e a pessoa humana é a pessoa humana. Donde não existir pessoa humana embrionária, mas embrião de pessoa humana. O embrião referido na Lei de Biossegurança (“in vitro” apenas) não é uma vida a caminho de outra virginalmente nova, porquanto lhe faltam possibilidades de ganhar as primeiras terminações nervosas, sem as quais o ser humano não tem factibilidade como projeto de vida autônoma e irrepetível. O Direito infraconstitucional protege de modo variado cada etapa do desenvolvimento biológico humano. Os momentos da vida humana anteriores ao nascimento devem ser objeto de proteção pelo direito comum. O embrião pré-implanto é um bem a ser protegido, mas não uma pessoa no sentido biográfico a que se refere a Constituição.

É oportuno também destacar que a primeira turma do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 124.306, no ano de 2016, afastou a suposta prática do crime de aborto.[16] Em seu voto-vista o Ministro Luis Roberto Barroso atestou que a criminalização do aborto no primeiro trimestre da gestação viola direitos fundamentais da gestante. Embora essa decisão não tenha caráter vinculante, limitando-se à concessão do Habeas Corpus no caso específico, observa-se que a legislação que trata da interrupção da gravidez, mais cedo ou mais tarde, será legitimada em nosso país, como já ocorre em outros países.

Caso a interrupção da gravidez até o primeiro trimestre seja permitida, seria possível ainda proibir a clonagem terapêutica? Essa postura antagônica da legislação terá de ser examinada.

É nessa linha de raciocínio que se procura demonstrar que a proibição da clonagem terapêutica afeta direitos fundamentais, carecendo ser revista.

Não se trata de negar ao embrião in vitro nenhuma proteção, porém o direito à vida e o direito à saúde dos indivíduos que aguardam pela clonagem terapêutica, deve ser ponderada, assim como ocorre nos casos em que o aborto é permitido pela legislação penal. A exceção conferida pela legislação penal é incompatível com a crença de que o feto/​embrião é uma pessoa com direito à vida; igualmente, a proibição da clonagem terapêutica pela Lei de Biossegurança é contraditória aos direitos assegurados pela Constituição Federal.

Conclusão

Conforme analisado ao longo deste estudo, podemos constatar que a Lei de Biossegurança, ao proibir a clonagem terapêutica, viola direitos constitucionalmente protegidos dos indivíduos que podem vir a necessitar desse tipo de terapia. Traçando um paralelo entre a proibição da clonagem terapêutica e a interrupção da gravidez autorizada pela legislação penal, verificou-se existir diferente valoração no que diz respeito à inviolabilidade do direito à vida desses embriões, sobrepondo-se aos direitos e interesses da mulher gestante.

Constatou-se também que as decisões do Supremo Tribunal Federal têm sido ponderadas a favor do direito à vida e à saúde do ser humano, pessoa já nascida. Essas decisões imprimem uma forte tendência à descriminalização do aborto voluntário no país.

Parece-nos razoável que o Brasil reconheça a clonagem terapêutica, como já ocorre em vários países. Vale ressaltar que não existe um consenso ético e científico que determine o início da vida humana. Contudo, ao adotarmos a teoria que entende que, até o 14º dia após a concepção, o que existe é uma célula progenitora com a capacidade de gerar um ou mais indivíduos, o direito à vida dos embriões in vitro não pode servir de obstáculo para a garantia de direitos fundamentais inerentes à pessoa humana.

 O Estado é laico, a sociedade é plural, a ciência é neutra e o direito imparcial. Logo, um Estado democrático deve assegurar o exercício da autonomia individual, respeitar a valoração ética de cada um, sem a imposição externa de condutas. O progresso científico é inevitável, faz-se necessário conciliar os avanços da ciência no âmbito jurídico e na perspectiva da ética, respeitando o significado e o valor que cada indivíduo tem em relação à vida. Admitindo-se a clonagem terapêutica como uma escolha possível de tratamento por parte do paciente ou seus familiares/​responsáveis, deve ser legalmente prevista e desejável como fruto da autonomia individual e expressão da dignidade.

No momento atual, os tratamentos por meio da clonagem terapêutica ainda não trazem garantia de cura ou eficácia, porém a busca de um consenso acerca da permissão da clonagem terapêutica se faz presente como uma forma legítima de garantia do direito à saúde e à vida, buscando novas alternativas de tratamento. É de fundamental importância que seja concebida uma solução para que o paciente e seus familiares possam optar ou não pela clonagem terapêutica, da mesma forma como ocorre nos casos de interrupção legal da gravidez.

Referências

AMERICAN ASSOCIATION FOR THE ADVANCEMENT OF SCIENCE. Disponível em: http://www.aaas.org/​spp/​cstc/​briefs/​stemcells/​index.shtml.

BARROSO, Luis Roberto. O Direito Constitucional e a efetividade de suas normas. Rio de Janeiro /​ São Paulo: Renovar, 2009.

BARROSO, Luis Roberto. A dignidade da pessoa humana no direito constitucional contemporâneo: Natureza jurídica, conteúdos mínimos e critérios de aplicação. Versão provisória para debate público. Mimeografado, dezembro de 2010. Disponível em: https:// ​www.luisrobertobarroso.com.br/​wp-content/​uploads/​2010/​12/​Dignidade_​texto-base_​11dez2010.pdf.

BARROSO, Luis Roberto; MARTEL, Letícia de Campos Velho. A morte como ela é: Dignidade e autonomia individual no final da vida. Revista da Faculdade de Direito - UFU. Uberlândia, v. 38, 2010. Disponível em: http://​www.luisrobertobarroso.com.br/​wp-content/​themes/​LRB/​pdf/​a_morte_como_ela_e_dignidade_e_autonomia_no_final_da_vida.pdf.

BRASIL. Código Penal Brasileiro. Rio de Janeiro, 1940. Disponível em: http://​www.planalto. gov.br/​ccivil_03/​decreto-lei/​Del2848compilado.htm.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 1988. Disponível em: https://​www.planalto.gov.br/​ccivil_03/​constituicao/​constituicao.htm.

BRASIL. Lei 9.434 de 04 de fevereiro de 1997. Lei de Transplantes. Brasília, 1997. Disponível em: http://​www.planalto.gov.br/​ccivil_03/​leis/​L9434.htm.

BRASIL. Lei nº 11.105, de 24 de março de 2005. Lei de Biossegurança. Brasília, 2005. Disponível em: http://​www.planalto.gov.br/​ccivil_03/​_ato2004-2006/​2005/​lei/​l11105.htm.

BRASIL. Decreto nº 5.591/​2005 de 22 de novembro de 2005. Regulamentação da lei 11.105/​2005. Brasília, 2005. Disponível em: http://​www.planalto.gov.br/​ccivil_03/​_ato2004-2006/​2005/​decreto/​d5591.htm.

BRASIL. Habeas Corpus 124.306 RJ. Rio de Janeiro, 2016. Disponível em: http://​www.stf.jus.br/​arquivo/​cms/​noticiaNoticiaStf/​anexo/​HC124306LRB.pdf.

BERNASIUK, Helen Lentz Ribeiro. A pesquisa com células-tronco embrionárias: Breve análise sobre a posição do Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 351-0. Revista da AJURIS. Porto Alegre, v. 41, n. 136, dezembro 2014, p.511-531.

CANOTILHO, Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almeida, 1998.

CASTRO, Cristina Veloso de; APARECIDA, Renata. Atuação judicial como instrumento da efetivação do direito fundamental à saúde e os seus limites constitucionais brasileiros. V Encontro Internacional do CONPEDI Montevidéu. Uruguai: Processo, Jurisdição e Efetividade da Justiça, 2016.

COELHO, Luis Fernando. Clonagem reprodutiva versus clonagem terapêutica: Avanços e limites. Revista CEJ. Brasília, n. 16, p. 29-48, jan./​mar. 2002. Disponível em: http://​www.jf.jus.br/​ojs2/​index.php/​revcej/​article/​viewFile/​445/​626.

CUNHA JUNIOR, Dirley da. A efetividade dos direitos fundamentais sociais e a reserva do possível. In: AMARGO, Marcelo Novelino (Org.). Leituras complementares de direito constitucional: Direitos humanos e direitos fundamentais. 3ª ed. Salvador: Jus Podiam, 2008

DWORKIN, Ronald. La democracia posible: principios para un nuevo debate político. Traducido por Ernest Weikert García. Barcelona: Paidós, 2008.

DWORKIN, Ronald. Domínios da Vida: Aborto, eutanásia e liberdades individuais. São Paulo: Martins Fontes, 2011.

FEÓ, Christina. Um estatuto para o embrião humano. Revista Bioethikos. São Paulo, Centro Universitário São Camilo, v. 4, n. 3, 2010.

KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. São Paulo: Edipro, 2004.

MALUSCHKE, Günther. A bioética e o biodireito: Aspectos e controvérsias. Revista Jurídica da FA7, Fortaleza, v. 6, 2009. Disponível em: http://​www.uni7.edu.br/​periodicos/​index.php/​revistajuridica/​article/​view/​234. Acesso em: 16 out. 2018.

MENEZESY, Glauco Cidrack do Vale. Aborto Eugênico. Revista Jurídica da FA7, Fortaleza, v. 1 2004. Disponível em: http://​www.uni7.edu.br/​periodicos/​index.php/​revistajuridica/​article/​view/​169. Acesso em 16 out. 2018.

MINAHIM, Maria Auxiliadora. Direito penal e biotecnologia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

NAVES, Bruno Torquato de Oliveira; SÁ, Maria de Fátima Freire de. Manual de Biodireito. 2. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2011.

NEIVA, Paula. Células que salvam vidas. Veja. São Paulo, v. 38, n. 47, 23 nov. 2005.

NOGUEIRA FILHO, Luis Nodgi. Estatuto ético do embrião humano. Revista Bioethikos. São Paulo, Centro Universitário São Camilo, v. 3, n. 2, 2009.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE - OMS. Constituição da Organização Mundial da Saúde. Nova York, 1946.

PAN AMERICAN HEALTH ORGANIZATION. Organização Mundial da Saúde – OMS. Disponível em: http://​www.paho.org/​bra/​.

PRADO, Luís Regi; HAMMERSCHMIDT, Denise. A clonagem terapêutica e seus limites de permissibilidade na Lei de Biossegurança brasileira (Lei 11.105/​05). Anais do XX Encontro Nacional do CONPEDI. Belo Horizonte, 2011, p.5134-5148. Disponível em: http://​www.conpedi.org.br/​manaus/​arquivos/​anais/​bh/​denise_hammerschmidt.pdf.

REINACH, Fernando; ZATZ, Mayana; CRUZ, Thiago; CORRÊA, Marcos Sá. Transgênicos e células-tronco: Duas revoluções científicas. São Paulo: Bei, 2005.

ROCHA, Renata da. Direito à vida e as pesquisas com células-tronco. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008.

ROCHA, Renata da. A vida e a norma como valores supremos do ser humano: a previsão constitucional do biodireito. 2012. 204 f. Tese (Doutorado em Direito) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012.

SAGAN, Carl. Bilhões e bilhões. Reflexões sobre vida e morte. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais - Uma Teoria Geral dos Direitos Fundamentais na Perspectiva Constitucional. 10ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012.

SARLET, Ingo Wolfgang; PETTERLE, Selma Rodrigues. Liberdade de Pesquisas como Direito Humano. Espaço Jurídico Journal of Law. Chapecó, v. 15, n. 1, jan./​jun. 2014.

SARMENTO, Daniel. Legalização do aborto e Constituição. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, v. 240, abr. 2005. Disponível em: http://​bibliotecadigital.fgv.br/​ojs/​index.php/​rda/​article/​viewFile/​43619/​44696. Acesso em: 27 jul. 2017.

SCHWARTZ, Germano. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.

SCHWARTZ, Germano; SCHEINER, Elisana. (Im)possibilidade da clonagem humana frente à legislação brasileira: Uma análise da obra admirável mundo novo. Revista de Direito Sanitário. São Paulo, v. 9, n. 3, nov. 2008 /​ fev. 2009.

SEMIÃO, Sérgio Abdalla. Biodireito e direito concursal. Belo Horizonte: Del Rey, 2012.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.51-0. Brasília, 2008. Disponível em: http://​redir.stf.jus.br/​paginadorpub/​paginador.jsp?​docTP=​AC&​docID=​611723.

UNESCO. Declaração Universal sobre o Genoma Humano. Disponível em: http://​unesdoc.unesco.org/​images/​0012/​001229/​122990por.pdf.

ZATZ, Mayana. Clonagem e células-tronco. Revista de Estudos Avançados. São Paulo, USP, v. 18, n. 51, maio/​agosto 2004.

ZATZ, Mayana. Genética, escolhas que nossos avós não faziam. São Paulo: Globo, 2011.

Recebido em: 10 ago. 2018.

Aceito em: 19 mar. 2019.

 



[1]    Mayana Zatz é professora-titular de Genética Humana e Médica do Departamento de Biologia do Instituto de Biociências (IB) da USP, coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano do IB-USP, presidente da Associação Brasileira de Distrofia Muscular e membro da Academia Brasileira de Ciências.

[2]    Lei 11.105/​2005, Art. 6º: “Fica proibido: [...] IV – clonagem humana; [...]” Declaração Universal sobre o Genoma Humano UNESCO, Artigo 11: “Práticas contrárias à dignidade humana, tais como a clonagem de seres humanos, não devem ser permitidas. Estados e organizações internacionais competentes são chamados a cooperar na identificação de tais práticas e a tomar, em nível nacional ou internacional, as medidas necessárias para assegurar o respeito aos princípios estabelecidos na presente Declaração.”

[3]    Sobre essas informações, consultar: AMERICAN ASSOCIATION FOR THE ADVANCEMENT OF SCIENCE. Disponível em: <www.aaas.org/​spp/​cstc/​briefs/​stemcells /​index.shtml>.

[4]    Lei nº 9.434/​97, Art. 3º: “A retirada ‘post mortem’ de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano destinados a transplante ou tratamento deverá ser precedida de diagnóstico de morte encefálica, constatada e registrada por dois médicos não participantes das equipes de remoção e transplante, mediante a utilização de critérios clínicos e tecnológicos definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina.”

[5]    Lei 11.105/​2005, Art. 5º “É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições: I – sejam embriões inviáveis; ou II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento. § 1o Em qualquer caso, é necessário consentimento dos genitores.” Decreto 5.591/​2005, Art. 63: “É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições: I - sejam embriões inviáveis; ou II - sejam embriões congelados disponíveis. § 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores. § 2º Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou terapia com células-tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à apreciação e aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa, na forma de resolução do Conselho Nacional de Saúde. § 3º É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo, e sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997.

[6]    Decreto nº 5.591/​2005, Artigo 3º: “[...] XIII - embriões inviáveis: aqueles com alterações genéticas comprovadas por diagnóstico pré-implantacional, conforme normas específicas estabelecidas pelo Ministério da Saúde, que tiveram seu desenvolvimento interrompido por ausência espontânea de clivagem após período superior a vinte e quatro horas a partir da fertilização in vitro, ou com alterações morfológicas que comprometam o pleno desenvolvimento do embrião; [...]”

[7]    Lei nº 9.434/​97, Art. 3º: “A retirada ‘post mortem’ de tecidos, órgãos, ou partes do corpo humano destinados a transplante ou tratamento deverá ser precedida de diagnóstico de morte encefálica, constatada e registrada por dois médicos não participantes das equipes de remoção e transplante, mediante a utilização de critérios clínicos e tecnológicos definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina.”

[8]    Constituição Federal, Art. 225: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.” (grifo nosso)

[9]    Constituição Federal, Capítulo IV - Da Ciência, Tecnologia e Inovação, Art. 218: “O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa, a capacitação científica e tecnológica e a inovação.”

[10]  Preâmbulo do Ato Fundador da Organização Mundial da Saúde, assinado por 61 Estados, entre os quais o Brasil. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE - OMS. Constituição da Organização Mundial da Saúde. Nova York, 1946.

[11]  Código Penal, Art. 128: “Não se pune o aborto praticado por médico: Aborto necessário I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante; Aborto no caso de gravidez resultante de estupro II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.”

[12]  Lei de Biossegurança, 11.105/​05, Art. 6º: “Fica proibido: [...] VII – a utilização, a comercialização, o registro, o patenteamento e o licenciamento de tecnologias genéticas de restrição do uso.”

[13]  Código Civil, Art. 2º: “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.”

[14]  “EMENTA ADI 3.510 CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DE BIOSSEGURANÇA. IMPUGNAÇÃO EM BLOCO DO ART. 5º DA LEI Nº 11.105, DE 24 DE MARÇO DE 2005 (LEI DE BIOSSEGURANÇA). Pesquisas com células-tronco embrionárias. Inexistência de violação do direito à vida. Constitucionalidade do uso de células-tronco embrionárias em pesquisas científicas para fins terapêuticos. Descaracterização do aborto. Normas constitucionais confortadoras do direito fundamental a uma vida digna, que passa pelo direito à saúde e ao planejamento familiar. Descabimento de utilização da técnica de interpretação conforme para aditar à lei de biossegurança controles desnecessários que implicam restrições às pesquisas e terapias por ela visadas. Improcedência total da ação.”

[15]  A teoria da formação dos rudimentos do sistema nervoso central relaciona o início da vida humana ao aparecimento dos primeiro sinais de formação do córtex central, que ocorre por volta do décimo quinto dia ao quadragésimo dia da evolução embrionária.

[16]  Ementa HC 124.306: “Direito processual penal. Habeas Corpus. Prisão preventiva. Ausência dos requisitos para sua decretação. Inconstitucionalidade da incidência do tipo penal do aborto no caso de interrupção voluntária da gestação no primeiro trimestre. Ordem concedida de ofício.”