Doutor e Mestre em Direito Constitucional pela
Universidade Federal de Minas Gerais. Professor da Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais e da Escola Superior Dom Helder Câmara. Procurador da
República.
RESUMO: A questão
ambiental ingressou no temário das Constituições apenas no final do século XX.
Desde então, tem passado por um rápido processo de universalização e de “densificação”
normativa. Os ciclos constitucionais evoluíram de proclamações retóricas ou
programáticas da proteção ambiental ao reconhecimento de um direito fundamental
ao meio ambiente equilibrado, prenunciando uma guinada ainda incipiente na
direção de um “constitucionalismo verde profundo” ou “ecocêntrico”. O cenário
político e institucional ainda é muito instável e dinâmico para que se conclua
pela definição de adotado um novo paradigma do constitucionalismo ecológico.
Dúvidas sobre a efetividade de suas normas e o empenho do status quo econômico
lançam suas sombras sobre a efetividade desse processo.
PALAVRAS-CHAVE:
Constitucionalismo ecológico; Ciclos constitucionais; Proteção ambiental.
ABSTRACT: Environmental issues entered into agenda of the
Constitutions only in the late twentieth century. Since then it has gone
through a rapid process of universalization and “densification” of its rules.
The constitutional cycles have evolved from rhetorical or programmatic proclamations
of environmental protection to the recognition of a fundamental right to a
balanced environment, foreshadowing an incipient shift toward a “deep green” or
“ecocentric constitutionalism”. The political and institutional setting is
still very unstable and dynamic in order to conclude the definition of a new
paradigm of ecological constitutionalism. Doubts about the implementation of
its rules and the opposition of the economic status quo cast their shadows on
the effectiveness of this process.
KEYWORDS: Ecological Constitutionalism; Constitutional
cycles; Environmental protection.
Quando foi
aprovada a Declaração de Estocolmo, em 1972, raras eram as Constituições que
tratavam do tema ambiental. Desde então, é notável o crescimento da afirmação
constitucional do tema na forma de um dever geral de tutela, mas sobretudo como um novo direito fundamental. Se, em alguns
países, as cortes se têm valido de uma interpretação mais ou menos criativa
para extraí-lo de um texto silente, cada vez mais, mais esse silêncio é
substituído pelo reconhecimento expresso. Calcula-se que, hoje, pelo menos,
cento e cinquenta Constituições versem sobre a questão ambiental, entre as
quais, noventa e duas, no mínimo, fazem-no por meio da afirmação de um direito
ao meio ambiente equilibrado (BOYD, 2015a, p. 172),[1] sendo,
da safra dos novos direitos fundamentais, o que mais foi reconhecido
constitucionalmente nos últimos quarenta anos (LAW; VERSTEEG, 2011, p. 1200-1201).
Esse fenômeno é chamado de diversas formas — e de acordo com a ênfase que se dê
— como “constitucionalismo ambiental”, “verde”, “ecológico” ou, em sua
expressão universalizante, como “mundialização” ou “globalização” do
constitucionalismo “ambiental”, “verde”, “ecológico” ou, ainda,
“constitucionalismo ambiental global”[2], “a
representar a convergência do direito constitucional, do direito internacional,
dos direitos humanos e do direito ambiental” (MAY; DALY, 2015, p. 1).
As primeiras
manifestações constitucionais sobre a questão ambiental tinham um caráter mais
programático tanto na forma de um dever genérico de proteção de aspectos
particulares do meio ambiente como o patrimônio histórico e cultural ou do
patrimônio e recursos naturais como, de modo mais abrangente, da própria
natureza. A viragem dos anos 1970 e 1980 passou a
assistir a uma redefinição desse quadro, por meio da afirmação de um direito ao
meio ambiente não poluído, livre de contaminação, adequado, sadio, equilibrado,
conforme as diferentes dicções constitucionais, tanto pela reinterpretação do
mero dever de proteção, imposto, primariamente ao legislador, a quem cabia
definir-lhe o conteúdo ou modo de exercício, quanto do próprio reconhecimento
de um direito em sentido subjetivo e de aplicação direta pelas cortes (VERNET; JARIA, 2007, p. 526).
Um terceiro ciclo
das Constituições ecológicas (ou ambientais), consagrador de um
“constitucionalismo verde profundo”, estaria a definir-se com a proclamação de
“direitos ambientais pós-humanos” ou “direitos ambientais stricto senso”[3]. O
prenúncio estaria nas referências de um “direito da natureza” nas Constituições
de alguns países, todavia, radicalizado por uma guinada ecocêntrica no final da
primeira década do século atual. Nessa nova fase, haveria um vero “direito da
natureza”, superador do mero “direito à natureza”, atribuindo-se titularidade
ou mesmo subjetividade ora à “comunidade da Terra”, à “Gaia” em sua inteireza;
ora a seres não humanos, animais especialmente.
O presente texto
aborda esse fenômeno, sob um recorte analítico e empírico, valendo-se,
metodologicamente, da revisão bibliográfica associada à análise comparativa dos
textos das Constituições de diversos países.
As primeiras
Constituições que trataram do tema ambiental o fizeram de um modo mais
enunciativo de propósitos ou programas, que haveriam de guiar a atuação do
Estado, do que instituidor de deveres jurídicos capazes de possibilitar exigibilidade.
A positivação constitucional se fazia por meio de enunciações programáticas e,
de regra, sobre aspectos particulares do ambiente. A Constituição italiana foi
a grande precursora dessa fase, embora tratasse apenas do patrimônio histórico
e cultural: “A República […] tutela a paisagem e o patrimônio histórico e
artístico da Nação” (ITÁLIA, 1947, art. 9.2).[4]
Lendo-se sob os
olhos daquele tempo, seria até difícil a associação
dessa proteção ao meio ambiente como se faz hoje. De toda forma, abria-se o
horizonte da ideia de fraternidade ou solidariedade que inspiraria a defesa de
um direito ao meio ambiente que contemplasse além dos aspectos naturais, uma
dimensão cultural (HÄBERLE, 2009). Algo que, na Suíça, desenvolveu-se
com particular antecipação aos demais países.
A proteção
fragmentária e instituída na forma de repartição de competência federativa, nem
por isso menos louvável, era a grande tônica da Constituição helvética que, já
em 1874, dispunha sobre o dever de proteção das florestas e da adoção de
medidas contra as enchentes (art. 24). Em 1953, instituíra o dever estatal de
proteger lagos e rios (FOEN, 2013, p. 5). Em 1957, obrigou-se o legislador
federal a aprovar normas contra os perigos das radiações ionizantes (art. 24d.2). A viragem para o que seria, depois em outros países,
o processo de constitucionalização da proteção do meio ambiente ou da natureza,
definidora do segundo ciclo das Constituições ecológicas, dar-se-á na Suíça com
a introdução, em 1962, de normas constitucionais, aprovadas por mais de 90% do
eleitorado, que previam o dever geral de proteção da natureza e do patrimônio
cultural (art. 78), dividindo as competências entre poder federal e cantonal.
Aos cantões era
atribuída a competência para proteção da natureza e da paisagem. Cabia à
Confederação cuidar, no desempenho das suas funções, dos aspectos
característicos da paisagem, das localidades evocativas do passado, dos pontos
turísticos, reservas e monumentos naturais, mantendo-os intactos sempre que
houvesse um interesse público preponderante. Para tanto, poderia apoiar, por
meio de subvenções e contratos, os esforços de proteção da natureza e da
paisagem ou mesmo expropriar áreas de importância nacional. Estava também
autorizada a legislar sobre a preservação da fauna e flora (art. 24e)[5]. Em
1968, a garantia do “uso criterioso de solo” e o “uso racional da terra” foi
também imposta à Confederação e aos cantões (art.
22quater) (SUÍÇA, 1874/1999).
O processo de
universalização do constitucionalismo do ambiente se inicia mais claramente nos
anos setenta do século XX. A Suíça não poderia deixar de ocupar a cimeira desse
processo, com a introdução do artigo 19f, que, na linha do que já se vinha
fazendo na década anterior, atribuía à legislação federal o dever de conferir
proteção ao homem e ao seu ambiente natural contra os efeitos nocivos ou
incômodos a que estavam submetidos, particularmente, a poluição atmosférica e
sonora (SUÍÇA, 1874/1999) (SCHMITT, 2012, p. 83-84). No mesmo ano, o texto
constitucional da Bulgária (a denominada “Constituição Zhivkov”)
introduziu, no “constitucionalismo balanço” dos países comunistas, o temário
ambiental, ao dispor que: “a
proteção e a conservação da natureza e dos recursos naturais, da água, do ar e
do solo, bem como os seus monumentos culturais são deveres das autoridades
públicas e das empresas, cooperativas e organizações públicas, e de cada
cidadão” (art. 31)[6].
Muitos dos países
comunistas seguirão o precedente. A reforma da Constituição, realizada pela
Polônia em 1976, parece até já prenunciar um direito mais que uma competência
ou tarefa de Estado, que marcará o ciclo constitucional seguinte, ao dispor:
“Os cidadãos da República Popular da Polónia terão o direito de beneficiar-se
do ambiente natural e o dever de protegê-lo” (POLÔNIA, 1976, art. 71).[7] A
Constituição soviética do ano seguinte é menos explícita a esse respeito,
embora, como elemento do direito à saúde, reconhecido aos cidadãos, inclua
medidas “para melhorar o meio ambiente” (art. 42). Entretanto, seguindo de
perto a redação da Constituição cubana do ano anterior (CUBA, 1976,
art. 27)[8]; — e,
talvez, portuguesa do mesmo ano —, refira-se à proteção ambiental como
interesse das gerações presentes e futuras (art. 18) (URSS, 1976) [9]. O texto
chinês de 1982 retoma a linha de atribuição de um dever estatal de salvaguarda
e melhoria do “ambiente vivo” e do “ambiente ecológico”, prevenindo e
controlando a poluição (CHINA, 1982, art. 26). [10]
Fora do eixo
comunista, algumas Constituições também passaram a prever disposições sobre o
meio ambiente, ainda com o feitio de um dever do Estado mais que um direito de
indivíduos ou da coletividade, todavia, nos passos da Suíça, já avançando sobre
mera “norma em projeto” ou “enunciações semânticas”. A Constituição da Suécia
de 1974 estabelecia como tarefa do Estado, em seu artigo 2(3), a defesa do
patrimônio e recursos naturais (CORDINI, 1995, p. 36). No ano seguinte, o texto
grego dispunha que a proteção do ambiente natural e cultural constituía um
dever estatal, cabendo-lhe adotar as medidas preventivas ou repressivas
necessárias para promovê-la (GRÉCIA, 1975, art. 24.1).[11] Um do
mais ousados dos textos constitucionais desse ciclo, embora com um traço
semântico ou programático bem presente, talvez seja o da Constituição de Papua
Nova Guiné, também de 1975, a declarar como objetivo do Estado a conservação e uso em benefício de todos, dos recursos
naturais e do meio ambiente, devendo ser restaurados em benefício também das
futuras gerações (PAPUA NOVA GUINÉ, 1975, art. 4).
O texto
constitucional português de 1976 pode ser apontado como o primeiro grande marco
da nova fase de positivação, agora, jus fundamental do meio ambiente. Em seu
artigo 66.1 proclamava: “Todos têm direito a um
ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender”. Em seguida, impunha ao Estado a obrigação de
prevenir e controlar a poluição e os seus efeitos e as formas prejudiciais de
erosão; ordenar o espaço territorial de forma a construir paisagens biologicamente
equilibradas; criar e desenvolver reservas e parques naturais e de recreio, bem como
classificar e proteger paisagens e sítios, de modo a garantir a conservação da
natureza e a preservação de valores culturais de interesse histórico ou
artístico; promover o aproveitamento racional dos recursos naturais,
salvaguardando a sua capacidade de renovação e a estabilidade ecológica; e de promover a melhoria progressiva e acelerada da qualidade de vida de todos
os portugueses. Chama a atenção, a antecipada preocupação com o acesso à
Justiça ambiental, ao reconhecer ao cidadão ameaçado ou lesado no direito ao
ambiente sadio, o poder de “pedir, nos termos da lei, a cessação das causas de
violação e a respectiva indemnização” (PORTUGAL, 1976).
Esse direito
passou a ser afirmado ou interpretado principalmente em sentido objetivo como
dever do Estado, tanto na forma de uma tarefa ou dever estatal, quanto de um
princípio ou diretriz de ordem pública ou constitucional, em qualquer caso, sob
a reserva de lei (BRANDL; BUNGERT, 1992, p. 8). Entretanto, a literalidade dos
textos ou a interpretação criativa logo o trataram também como poderes ou
direitos subjetivos, que poderiam ser reivindicados judicialmente. Parte da
doutrina tem entendido, no entanto, que só há direito fundamental, se o
reconhecimento constitucional se der dessa forma, é dizer, atribuindo-se o
poder de titulares ou substitutos processuais acionarem o Judiciário para
exigência do cumprimento dos deveres correlatos (BRANDL; BUNGERT, 1992, p. 9).
São aspectos diferenciados de aplicabilidade, mas moedas do mesmo direito.
Claro que, em
sendo judicializável, esse direito se mostra como posições jurídicas mais
fortes contra os caprichos políticos e a discricionariedade do legislador. Um
direito próprio, jurídico mais que político (MAY, 2006, p. 118). Entretanto, o
direito apenas em sentido objetivo, embora mais fraco inclusive para impor
obrigações jurídicas, pode ser visto em perspectiva, um direito-a-vir-a-ser
mais vigoroso do que a mera proteção de aspectos isolados do meio ambiente,
embora, como se verá, também essa forma não é negativa de extração hermenêutica
de um direito.
Há mesmo quem
enxergue benefícios na adoção da estratégia constituinte de reconhecer um
direito em sentido meramente objetivo. Embora acabe impondo um dever mais
político do que jurídico, ele teria por destinatário imediato, do ponto de
vista democrático, o legislativo e os formuladores de políticas, que deteriam
mais dados e condições, comparativamente aos juízes, para tomar decisões mais
bem planejadas e exequíveis diante das disponibilidades orçamentárias
existentes e da necessidade de equilibrar adequadamente a sua alocação também a
outras prioridades sociais. A exigibilidade continuaria a existir, agora, menos
por meio de ações judiciais, mas mediante reivindicações e discursividade na
arena própria, a política, com o estímulo da organização e militância ambiental
da sociedade (SUNSTEIN, 2004; OSIATYNSKI, 2007). Os políticos, se não cumprirem
com a sua obrigação, poderiam ter de pagar a conta nas urnas (SADURSKI, 2002;
MINKLER, 2009).
A distinção entre
direito objetivo e subjetivo, em geral, é feita pela forma e texto do enunciado
normativo, de sua posição na organização constitucional e de sua história constituinte
(BRUCH; COKER; VANARSDALE, 2007, p. 17; MINKLER, 2009; JEFFORDS, 2011). Em
primeiro lugar, deve-se distinguir normas de expressa
atribuição de direitos daquelas que apenas impõem deveres ou tarefas. É
preciso, no entanto, diferenciar o modelo em que tais deveres vêm prescritos na
Constituição para identificar se há mesmo um direito em causa.
Na perspectiva do
primeiro ciclo constitucional, eles podem aparecer apenas na forma de proteções
gerais ou de aspectos particulares do ambiente, tanto no âmbito da repartição
territorial de competências, sobretudo nos Estados federais; como no
estabelecimento de uma tarefa estatal em dispositivo próprio. É preciso um
esforço hermenêutico muito grande para se extrair de tais enunciados um direito
implícito. A depender do espaço criativo da jurisprudência, do grau de
independência dos juízes e do inadimplemento estatal, no entanto, podem até dar
alguma margem para o reconhecimento de um direito postulável em juízo, ainda
que mais em seus particulares aspectos constitucionalizados tais como um
direito à proteção das florestas, dos rios ou à adoção de medidas antipoluição,
conforme o caso, do que um direito em sentido geral.
O dever pode estar, direta ou indiretamente, ligado ao reconhecimento de
um direito. Diretamente, pode assumir a forma de “o Estado garante o direito a
um ambiente sadio”, como se lê no texto tunisiano (art. 45.1). Indiretamente,
podem-se encontrar fórmulas lexicais como aquela da Constituição panamenha: “o
Estado tem a obrigação fundamental de garantir que sua população viva num
ambiente saudável”. A primeira redação parece mais óbvia com a menção expressa
a “direito”, facilitando a compreensão do intérprete. A
próprio uso das expressões atributivas do dever pode repercutir na
afirmação de um direito subjetivo ou meramente objetivo.
Se forem
empregados termos como “é dever”, “é obrigação”, “é garantido”, “deve”,
“incumbe”, “garante” ou análogos, sobretudo se vierem na forma de obrigações
negativas (de não fazer) ou proibitórias, há maior probabilidade de serem
interpretados como direitos subjetivos (FERNANDEZ, 1993, p. 375; DU BOIS, 1996, p.
155-156; HILL; WOLFSON; TARG,
2003, p. 392; FREDMAN, 2004, p. 94 e ss; BRUCKERHOFF, 2007, p. 627). O artigo 41 da
Constituição de Togo dá um bom argumento nesse sentido. Começa por dizer que
todos têm direito a um ambiente saudável, mas logo afirma que ao Estado incumbe
a sua proteção. A segunda cláusula reforça — e não diminui — a força normativa
da primeira, pelo verbo empregado. O uso, porém, de expressões como “deve
esforçar-se”, “deve empenhar-se”, “deve trabalhar para”, “deve tomar medidas
para” tende a ser interpretada como mero direito objetivo. A Finlândia,
Maldivas e Seychelles podem ser lembradas a esse respeito.
Mesmo a afirmação
de um direito sem integrar o conteúdo de um dever estatal não significa que
possa ser objeto de postulação judicial, pois ele pode estar sujeito à uma cláusula de contenção da eficácia ou de
autoaplicabilidade. Diversas Constituições definem expressamente o direito ou,
menos forte ainda, a proteção ambiental como princípio orientador da ação
estatal, de regra, carente de judicialidade, diferenciando-os do regime dos
direitos fundamentais. Por exemplo, na Espanha, Malaui, Gana, Lesoto,
Bósnia-Herzegovina, Cazaquistão, Gâmbia, Eritreia e Sudão. Outras, como a da
Coreia do Sul, da República Dominicana, Senegal e Zimbábue, submetem-nos à
disciplina da lei. Essas manifestações constitucionais seriam indicativas de um
direito meramente objetivo. Situação oposta é aquela em que, além de ser
reconhecido sem cláusula de contenção, ainda é constitucionalmente protegido
por uma norma de garantia de efetividade. Na Costa Rica, no Paraguai e Quênia,
por exemplo, prevê-se a possibilidade de indivíduos provocarem as autoridades
públicas, no segundo caso, e, de modo mais explícito, no primeiro e segundo, de
acesso à Justiça para defesa de seus direitos ambientais. Não restaria dúvida à
sua fundamentalidade, portanto.
A topografia é
outro elemento importante para diferenciação. Estando no rol da declaração de
direitos, como sucede na África do Sul, é quase certo que se trate de um
direito subjetivo (BRUCH; COKER; VANARSDALE, 2007, p. 16), a menos que haja, na
declaração, uma distinção entre categorias de direitos. Na Turquia, em São Tomé
e Príncipe, e no Timor-Leste, por exemplo, os direitos ambientais estão
listados entre os “direitos econômicos, sociais e culturais”, e não entre os
“direitos civis e políticos”. Na República Democrática do Congo, eles estão no
elenco dos “direitos coletivos” e, em Ruanda, entre “outros direitos”,
distintos dos demais “direitos fundamentais”. Esse tratamento diferenciado pode
levar a um enfraquecimento da judicialidade, submetendo-o a uma política de
efetividade progressiva, às vezes, prevista expressamente pelo próprio texto
constitucional (BRANDL; BUNGERT, 1992, p. 67; BAIA, 2013; PARLAK, 2007, p. 149). E se os direitos ambientais estiverem fora da declaração de direitos,
a situação se agrava mais ainda. Estando no preâmbulo, como em Camarões e
Comoro, pode ser mero elemento interpretativo sem valor de norma ou, em o
tendo, será um direito objetivo, uma tarefa de Estado, sem vincular diretamente
o juiz (BRUCH; COKER; VANARSDALE, 2007, p. 7). Lançados ao âmbito da
Constituição econômica têm mesma disciplina dos princípios e diretrizes do
Estado, prevalecendo como direitos objetivos apenas (LI, 2013).
A interpretação
histórica pode auxiliar na caracterização. As discussões constituintes e
exposições motivos, às vezes, existentes podem revelar se havia a intenção de
se criar um direito pleno, subjetivo e objetivo, ou somente um direito a ser
integrado por meio da lei e das ações executivas. Os estudiosos, usando essa
pesquisa da vontade constituinte, revelam que em países como Bélgica, Grécia,
Holanda e Índia, pretendia-se criar apenas um dever do Estado para proteção
ambiental, sem espaço para intervenção judicial direta (GRANVILLE, 1966, p. 75;
LAVRYSEN; THEUNIS, 2007, p. 9).
Essas orientações
se devem tomar com a devida cautela. A atenção apenas ao texto pode trair o leitor,
sobretudo se ficar atento somente à disposição enunciativa de um direito ou
dever. Na República Checa e na República Eslováquia, por exemplo, a
literalidade da enunciação normativa daria a entender que o direito ao meio
ambiente equilibrado seria fruível sem necessidade de interpositio legislatoris. Em ambas, o texto constitucional anuncia
que “todos têm o direito a um ambiente favorável” (art. 35.1 e 44.1,
respectivamente). Um dispositivo adiante, no entanto (art. 41 e 44.4), no
entanto, submete o exercício à disciplina da lei[12] (BOYD,
2012, p. 66). Por outro lado, a interpretação gramatical da Constituição espanhola
levaria à conclusão de se tratar, por lá, de um direito não autoaplicável, pois
está incluído como princípio diretivo da ação do Estado. A jurisprudência
passou a dar-lhe um sentido subjetivo, desde que vinculado com outros direitos
fundamentais, embora o tema ainda esteja envolvo em polêmica (VERNET; JARIA,
2007, p. 515). Na Turquia, conquanto se anotem problemas de efetividade, o
Judiciário tem sido utilizado para proteção ambiental, em que pese a literalidade constitucional parecer afirmar contrariamente
(PARLAK, 2007, p. 153).
A topografia
constitucional pode ser outra armadilha. Em Timor-Leste, o direito ao meio
ambiente equilibrado está entre os direitos econômicos, sociais e culturais,
mas possui tutela jurisdicional, notadamente por meio do ministério público,
embora se tenha de dizer que por desenvolvimento legislativo (OLIVEIRA; GOMES;
SANTOS, 2015, p. 36, 173). Em Burkina-Faso esse direito também se encontra
entre os direitos sociais, mas é a própria Constituição que prevê actio popularis para defesa do ambiente
(art. 30)[13]. Brandl
e Brungert, ao analisarem o deslocamento do direito ao meio ambiente
equilibrado no Brasil para a Ordem Social, fora, portanto, do Título dos
Direitos Fundamentais, avaliaram que a escolha constituinte indicaria mais o
estabelecimento de um princípio de política pública do que de um direito
subjetivo e judicializável (1992, p. 78). Erraram no prognóstico (SAMPAIO,
2003). Assim também a interpretação histórica tem seus limites. É pouco
produtiva a indagação sobre a vontade do constituinte, seja pelo império da
pré-compreensão do intérprete, seja pela autoridade evolutiva do próprio texto,
a requerer adaptações a novos contextos políticos, sociais e axiológicos
(SAMPAIO, 2013). Será, quando muito, argumento de apoio ou rechaço, em qualquer
caso, incompleto, imperfeito e impreciso. Essas críticas não podem ser
entendidas como refutação às orientações apresentadas; apenas recomendam
cautela em seu emprego, devendo-se buscar fontes atualizadas, tanto na
doutrina, quanto na jurisprudência de cada país, para que se possam tirar
conclusões mais acertadas sobre o tratamento constitucional dispensado ao tema,
o que nem sempre é tarefa das mais fáceis.
Poder-se-ia,
ainda, questionar até que ponto não haveria excesso de zelo esquemático em
reconhecer repartições de competências, deveres ou princípios diretivos como
direitos, para enquadrá-los em novo ciclo constitucional. Seriam remanescentes
do estágio anterior no movimento do antropocentrismo ambiental e jusfundamental
ou um indício de que se estaria ainda numa fase de transição entre o primeiro e
segundo ciclo. Entretanto, a atividade interpretativa dos tribunais, ainda que
não se possa generalizar para todos os países, mas que tampouco pode ser
refutada sua crescente universalização, é indicativa
de que há uma nova perspectiva ou paradigma da proteção ambiental no âmbito das
Constituições, vendo em tais enunciados conteúdos jusfundamentais (ANKERSEN, 2003; MAY, 2006; BOYD, 2012)[14].
Essa diferença
conceitual leva a leituras constitucionais diversas. É certo que os textos
constitucionais que reconhecem apenas o sentido objetivo (como tarefa ou como
princípio diretivo) são em maior número do que os que também o fazem em sentido
subjetivo (MAY, 2006, p. 114). Mas as estatísticas apresentadas por quem
restringe o conceito de direito fundamental apenas ao reconhecimento de
posições jurídicas subjetivas acabam por ampliar ainda mais essa diferença[15]. Desde
que o olhar crítico não se perca na confusão entre um direito em sentido
próprio e um direito em projeto, é até possível chamar a ambos os aspectos,
objetivo e subjetivo, como “direito”. É uma atitude menos laboriosa e,
especialmente, pragmática de quem avalia apenas ou principalmente o texto
constitucional em sua expressão semântica. Ou aspire a um cenário em que a comunidade
jurídica local e os tribunais dos respectivos países já o interpretaram ou
possam vir a interpretar também como direito autoaplicável.
A relação entre
as dimensões substantiva e processual do direito ao meio ambiente equilibrado
também sofre diferenciação ou grau de aplicabilidade nem sempre a seguir a
sorte um do outro. Por vezes, atribui-se apenas o caráter objetivo ao direito
substantivo ao meio ambiente equilibrado, mas se lhe dá uma forma subjetiva e
autoaplicável no aspecto processual — como direito à informação e à
participação, como sucede na na Geórgia de 1995 (art.
37.5), na Albânia de 1997 (art. 56), na Polônia de 1997 (art.74.3 e 4), na
Letônia de 1998 (art. 115), na Tailândia de 2007 (arts. 57 e 66), em Kosovo de
2008 (art. 52.2 — ser ouvido), em Madagascar de 2010 (art. 149) e na Tunísia
(art. 45.1 — participação). Naqueles países em que o direito substantivo é
autoaplicável, de modo expresso ou implícito, também se consideram
autoaplicáveis os aspectos processuais mencionados a que se soma o acesso à
justiça (BOYD, 2012, p. 66-67).
Deixadas as questões
interpretativas de diferenciação entre direito objetivo e direito subjetivo,
ainda se precisa notar que na evolução desse ciclo constitucional, sobretudo a
partir dos anos 1990, a linguagem constitucional passou a incorporar as ideias
de “desenvolvimento sustentável”[16] e, de
modo mais enfático do que nos textos de duas décadas anteriores, o princípio da
“equidade intergeracional”[17]. Esses
acréscimos estariam, para alguns, a reforçar o viés antropocêntrico e econômico
da proteção ao meio ambiente (PERROW, 1997; HAJER, 1997, p. 34-35; SADELEER, 2002, p.
277; BRUCKERHOFF, 2007, p. 615 e ss). Por outro lado,
e já a gravitar em torno de um ideário que o mitigasse ou se pusesse a alguns
passos na direção biocêntrica, algumas Constituições, como a costarriquense,
paraguaia e a brasileira, preferiram o termo “ecologicamente equilibrado” à
expressão “meio ambiente saudável”, “sadio” ou equivalentes,
o que indicaria, no processo interpretativo, que a proteção ambiental não
estava obrigatoriamente (ou apenas) vinculada à promoção da saúde humana (ANKERSEN, 2003, p. 823). Sobre esse derradeiro ponto, há quem defenda a
presença, mesmo na expressão “ambiente saudável”, de um ingrediente bio ou até
ecocêntrico, sem necessidade de substituição do texto, mas do contexto e
fundamento da interpretação (BRUCKERHOFF,
2007; SSENYONJO, 2016, p. 119).
A mesma ordem de ideia também se aplicaria a
uma compreensão mais holística de desenvolvimento sustentável e, com mais força
argumentativa ainda, do princípio de equidade intergeracional. A
sustentabilidade, ainda que introduzida nos textos internacionais e nas
Constituições como produto de uma “convergência” entre a encampação tática pela
economia do discurso ambiental e a concessão pragmática do ambientalismo à
política, não seria, de todo, incompatível, pelo menos, com as correntes mais
atenuadas do antropocentrismo e do biocentrismo (MILNE; TREGIDGA; WALTON,
2009). Menos ainda a ideia de que se deve pensar
no pacto intergeracional como um projeto e um compromisso da atual geração para
benefício das futuras gerações humanas e não humanas (SAMPAIO, 2003, p. 53 e ss). Resta a dúvida, todavia.
Um terceiro ciclo
estaria a se desenvolver, afirmando-se não mais um mero direito fundamental à
natureza em seu equilíbrio ou integridade, funcionalizado às necessidades
humanas, mas um direito da natureza à sua própria existência. A primeira fase
seria caracterizada por textos constitucionais que, embora ainda orientados
predominantemente, por uma visão antropocêntrica, atribuíam direitos aos
animais não humanos e, por vezes, às plantas.
O texto
constitucional da Suíça (art. 80), da Eslovênia (art. 72.4), do Egito (art.
45), de Gâmbia (art. 22.2, f), Gana (art. 20.4,c),
Granada (art. 6.6,v), Guiana (art. 142.2,a, v), Ilhas Salomão (art. 8.2,v),
Seychelles (26.2, e), Samoa (art. 14.2,f), São Vicente e Granadinas (art. 6.6,
a, v), Santa Lúcia (art. 6.6, a, v), São Cristóvão e Neves (art. 6.6, a, v),
Tuvalu (art. 20, 9, a, v), Malta (art. 37,2,i), Jamaica (art. 15.2,l), Hungria
(art. P), Lesoto (art. 17.4,a, v), Malásia (L. 3, 3 e 4), Nigéria (art.
44.2,f), Brasil (art. 225, § 1º, VII) e Suécia (cap. 8, art. 7.4), por exemplo,
imputam ao Estado o dever de proteção dos animais.[18] É
preciso distinguir, no entanto, as formas e teleologia dessa proteção.
Em Gâmbia, Gana,
Granada, Guiana, Jamaica, São Vicente e Granadina, e São Cristóvão e Neves, a
proteção é feita como justificativa de eventual desapropriação de terra. Vale
dizer, se o proprietário não estiver dispensando o devido cuidado, via de regra, sanitário, pode ter sua terra desapropriada. É
paradoxal que, em Granada, Ilhas Salomão, Samoa, Santa Lúcia, São Cristóvão e
Neves, São Vicente e Granadinas e em Tuvalu, não haja reconhecimento de um
direito nem o estabelecimento de proteção geral ao meio ambiente equilibrado.
Em geral, são textos mais antigos: Samoa é de 1962, Malta é de 1964, Granada de
1973, Ilhas Salomão e Santa Lúcia de 1978, São Vicente e Granadinas de 1979,
São Cristóvão de 1983 e Tuvalu de 1986. Algumas delas, no entanto, passaram por
revisões recentes (Malta em 2014, Samoa em 2013, Ilhas Salomão em 2009 e
Granada em 1992).
Em vários
lugares, a proteção é feita apenas contra tratamento cruel. É assim no Brasil e
na Eslovênia. Um tema recorrente em outros textos constitucionais. Na Malásia,
embora não haja uma previsão expressa ao direito ou à proteção em geral ao meio
ambiente, atribuem-se à competência legislativa concorrente dos entes federais
a proteção dos animais e aves selvagens; a criação de animais, os serviços
veterinários e também a prevenção da crueldade contra eles (Lista 3, itens. 3 e 4). No caso da Guiana, há ainda a proclamação de que o
“bem-estar da nação depende da preservação do ar puro, solos férteis, água pura
e da rica diversidade de plantas, animais e ecossistemas” (art. 36). No Egito,
prevê-se a proteção das plantas, dos animais e das pescas; das espécies
ameaçadas de extinção e a prevenção da crueldade aos animais (art. 45).
Na Hungria, o
artigo P dos “Fundamentos” da República declara que os recursos naturais,
particularmente em terras aráveis, as florestas e as reservas de água, a
biodiversidade, particularmente das plantas e animais nativos, bem como os bens
culturais integram o patrimônio comum da nação, devendo ser protegidos,
mantidos e preservados para as gerações futuras. A Constituição de Papua Nova
Guiné de 1975, com a revisão que promoveu em 2015, declara
como um dos objetivos da nação o uso e conservação dos recursos naturais e do
ambiente “para o benefício coletivo de todos […] e das gerações futuras”. Assim
também impõe o dever de serem adotadas todas as medidas necessárias para
“proteção adequada aos nossos valiosos pássaros, animais, peixes, insetos,
plantas e árvores” (PAPUA NOVA GUINÉ, 1975/2015, art. 4).
Mesmo em países
de democracia mais consolidada, a proteção de seres não humanos ainda tem
fortes marcas do viés antropocêntrico. Na Suécia e na Suíça, há a previsão da
caça (Suécia, cap. 8, art 7.4; Suíça, art. 79). A suíça ainda merece um destaque
pela restrição ao uso de tecnologia genética não-humana.
A Confederação deve disciplinar o uso de material reprodutivo e genético de
animais, plantas e outros organismos. Ao fazê-lo, deve ter em conta a
“dignidade dos seres vivos, bem como a segurança dos seres humanos, dos animais
e do ambiente, e deve proteger a diversidade genética das espécies animais e
vegetais” (art. 120.2). Curiosa e contraditória é a Constituição austríaca.
Embora pareça se antecipar à maioria dos textos, ao também conferir proteção
aos animais, também admitida a caça e a pesca segundo
disposição legal (art. 11.1(8)), e de reconhecer o meio ambiente como valor a
pautar a educação do país (art. 14, 5a), ela o reduz, em seguida, a simples
objeto de repartição de competência federativa (ÁUSTRIA, 2009, arts. 10.1(9 e
12), e 11.1(7)).
A Lei Fundamental
alemã impõe ao Estado o dever de proteção da natureza (arts. 72.3.2, 74.1.29)
e, ainda, como responsabilidade para com as gerações futuras, dos “recursos
naturais vitais e dos animais, dentro do âmbito da ordem constitucional, por
meio da legislação, e, de acordo com a lei e o direito, por meio dos poderes
executivo e judiciário” (ALEMANHA, 2004, art. 20a) [19].
Os textos de alguns Länder também seguem essa linha, protegendo-se, genericamente,
“as bases naturais da vida presente e futura” (Mecklemburgo-Pomerânia
Ocidental, art. 12) ou, mais especificamente, os animais (Turíngia, art. 32.1)
e também as plantas (Brandeburgo, art. 39.3). (HABERLE, 2009). Em Kosovo e em
Laos, a disposição está redigida de um modo mais amplo do que, em geral, é
apresentado o direito ao meio ambiente equilibrado. Em Laos, dispõe o artigo 19
que “todas as organizações e os cidadãos devem proteger o ambiente e os
recursos naturais: as superfícies de terra, [os recursos] subterrâneos, as
florestas, os animais, as fontes de água e a atmosfera”. No texto kosovar,
lê-se: “a natureza e a biodiversidade, o meio ambiente e a herança natural são
responsabilidade de todos” (art. 52.1) e a “proteção ambiental é um dos valores
da ordem constitucional” (art. 7.1) (KOSOVO, 2008). No Sudão (2005), prevê-se
que o “Estado não pode adotar qualquer política, realizar ou permitir qualquer
ação que possa afetar negativamente a existência de quaisquer espécies de vida
animal ou vegetal, seu habitat natural ou adotivo” (art. 11.2).
O ciclo
biocêntrico parece mais bem definir-se com a Constituição da Bolívia de 2009 e
do Equador de 2008 dentro do chamado “constitucionalismo andino” ou
“neoconstitucionalismo transformador” que teria incorporado a cosmovisão dos
povos ancestrais, de suas práticas de convivência e compreensão do entorno,
expressos em dois eixos de ressignificado existencial, o Sumak kawsay ou bom
viver e a Pachamama ou
Mãe Terra ou Natureza (SANTAMARÍA, 2011)[20].
Na Bolívia, o direito
ao meio ambiente saudável, protegido e equilibrado deve permitir, não apenas a
indivíduos e coletividades das presentes e futuras
gerações, mas também a “outros seres vivos” o desenvolvimento de “maneira
normal e permanente” (BOLÍVIA, 2009, art. 33). Mas é a Constituição equatoriana
que mais atenção dedica ao
tema, ao reconhecer os “direitos inalienáveis da natureza (Pachamama)” num
capítulo próprio (SANTOS, 2010).
Já no preâmbulo
se pode ler que a harmonia com a natureza é uma nova forma de convivência
cidadã e condição essencial para alcançar o “bom viver” ou “Sumak Kawsay”. O
artigo 10, II, afirma categoricamente que “a natureza será sujeito dos direitos
que lhe reconheça a Constituição”. Esses direitos estão enumerados nos artigos 71 e 72. São
eles: a) o respeito integral à existência; b) a manutenção e regeneração dos
ciclos vitais, estrutura, funções e processos evolutivos; e c) direito à
restauração.
A interpretação e aplicação de tais direitos devem seguir os princípios
específicos da precaução e da restrição que vedam atividades que possam levar à
extinção das espécies, destruição de ecossistemas e alteração permanente dos
ciclos naturais (art. 73). Também deve ser considerado o princípio in dubio pro natura, de modo que,
em caso de dúvida, seja atribuído sempre o sentido mais favorável à proteção da
natureza (art. 395.4). No âmbito do “Régimen
del Buen Vivir”, volta-se a impor o dever de
respeito “ao ambiente, à natureza, à vida, às culturas e à soberania” (art.
385), sendo responsabilidade do Estado garantir a liberdade de criação e
pesquisa, respeitados “a ética, a natureza, o ambiente e o resgate dos conhecimentos
ancestrais” (art. 387.4). É reconhecida ampla legitimação ativa a indivíduos,
comunidades, povos ou nacionalidades para exigir do poder público o cumprimento
desses direitos, reforçada por um “sistema nacional descentralizado de gestão
ambiental”, garantido pela defensoria do ambiente e da natureza (art. 399).
Há, todavia, disposições constitucionais que parecem remeter ao paradigma
antropocêntrico, embora com alguma mitigação. Reconhece-se, por exemplo, o
direito de os seres humanos se beneficiarem do ambiente e das riquezas naturais
que lhes permitam o “bom viver”. São, por outro lado, obrigados a respeitar os
direitos da natureza, a preservar um ambiente são e utilizar os recursos
naturais, “de modo racional, sustentável e sustentado” (art. 83.6). Da mesma
forma, é proibida a apropriação dos serviços ambientais, mas sem limitar sua
prestação, produção, uso e aproveitamento, desde que na forma regulada pelo
Estado. A atividade e a política econômicas, além de
reconhecerem o ser humano como sujeito e fim, “devem propender a uma relação
dinâmica e equilibrada entre a sociedade, o Estado e o mercado, em harmonia com
a natureza”. Devem, ainda, ter “por objetivo garantir a produção e reprodução
das condições materiais e imateriais que possibilitem o bom viver” (art. 283).
O constitucionalismo andino teria, ao
inaugurar o novo ciclo constitucional, promovido uma “guinada civilizatória”
com a “desmercantilização” da natureza, reduzida, no capitalismo, a mero objeto
de exploração a serviço do capital (MARTÍNEZ, 2009, p. 97; ZAFFARONI, 2011, p. 57). Os objetivos econômicos, conforme prescreve
sobretudo o texto constitucional equatoriano, devem subordinar-se às
leis do funcionamento dos sistemas naturais, sem perder de vista o respeito
pela dignidade humana e a garantia da qualidade de vida das pessoas (ACOSTA,
2010; 2011).
Para muitos autores, é cedo falar ainda de um novo ciclo constitucional.
Os dois textos discutidos seriam marcados por uma ambivalência no tratamento
dispensado à natureza, pois tanto a trata como sujeito de direitos quanto como
objeto de apropriação e exploração. Os efeitos práticos, pelo menos, no campo
jurídico não mostraram ainda ganhos significativos sobre as formas tradicionais
de proteção do meio ambiente. As transformações
exigidas nos institutos consolidados talvez não justifiquem tanto “experimento
normativo”, sobretudo porque até agora se mostra mais como apelo retórico e
projeto político-ideológico do que uma visão e forma diferentes de proteção
ambiental (PARGA, 2011; CAMPAÑA, 2013). Seja como
for, pelo menos, do ponto de vista semântico e simbólico, os textos
constitucionais andinos parecem introduzir novas leituras e perspectivas aos
ciclos constitucionais ecológicos. Se vingarão ou
serão efetivos, ainda é cedo para qualquer prognóstico.
O meio ambiente
era quase um tema desconhecido dos textos constitucionais no início dos anos
setenta do século passado. No final do século, mais de uma centena tratava do
assunto, inclusive na forma de um direito fundamental. Essa mundialização ou
universalização do constitucionalismo ecológico se fez, entretanto, em ciclos
ou ondas de positivação. Os primeiros textos constitucionais trataram da
proteção ambiental de um modo mais enunciativo de propósitos ou programas do
que instituidor de deveres jurídicos capazes de possibilitar exigibilidade. Aos
poucos, as normas constitucionais se foram ganhando em juridicidade e
ressignificando-se ou afirmando-se como reconhecedoras de um direito
fundamental, em alguns casos, com a possibilidade de acionamento imediato do
Judiciário para se fazer valer ou efetivar-se. É claro
que o próprio Judiciário desempenhou um importante papel nesse processo,
inclusive de extraí-lo de meros enunciados de deveres e princípios ou mesmo
como derivação de outros direitos.
Esse ganho de
significado jusfundamental caracterizou o segundo ciclo constitucional da
proteção ambiental, iniciado no final dos anos setenta daquele século. Reformas
em textos antigos ou a aprovação de novos textos constitucionais, sobretudo, na
África, Américas e Ásia conferiram-lhe a natureza de direito num processo
crescente, todavia, inconcluso, de subjetivação e de proteção judicial. A
progressiva referência à equidade intergeracional e ao desenvolvimento
sustentável reforçava a leitura, já antecipada por qualificativos do ambiente
como “sadio”, “saudável” ou “favorável”, de que a defesa e o direito eram
feitos em benefício e interesse dos seres humanos.
Mesmo no âmbito
de alguns textos constitucionais, caracterizados pela proteção ambiental
antropocêntrica, já havia ou foram introduzidos por reformas dispositivos que
visavam à proteção de animais ou mais genericamente da flora e fauna, o que
indicava, pelo menos, uma matização da centralidade humana da proteção
conferida. Novos textos constitucionais aprovados, principalmente, na América
do Sul, com destaque para a Constituição equatoriana de 2008, giraram o pêndulo
da proteção na direção da defesa do meio ambiente como tal, sem vínculo necessário com o benefício, interesse ou saúde humanos.
Esse novo ciclo
ainda é objeto de polêmica. Entretanto, a dicção literal dos textos
constitucionais está a indicar um novo olhar sobre o fundamento e orientação da
proteção ambiental conferida, a ponto de merecer uma distinção. Se haverá um
efeito prático importante sobre a efetividade e o alcance dessa proteção, ainda
é cedo para afirmar. Certo é que o texto e a teleologia, pelo menos, instigam
um ciclo formalmente novo, de um direito da natureza, ou distinto do anterior,
de um direito à natureza. A história e os comportamentos estão a ser contados.
E feitos.
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. Recebido em: 4 nov.
2016. Avaliado em: 20 e 22 nov. 2016.
[1] Esse
número varia, de acordo, como se verá, com a interpretação dada ao texto
constitucional e ao sentido da palavra “direito”. Para Daly, haveria cerca de 95 países que o reconheciam, substantivamente, e,
entre 30 e 40, processualmente, a considerar seu desenvolvimento legislativo
(DALY, 2012, p. 72). Existiriam 76 que reconheceriam um direito individual ao
meio ambiente equilibrado (MAY; DALY, 2015, p. 4). Boyd, em mesma data, via
tais direitos em 93 Constituições (BOYD, 2012, p. 59). Para Tim Hayward,
escrevendo quase 10 anos antes, em torno de 50 Constituições afirmariam esse
direito entre mais de 100 que previam algum tipo de proteção ambiental
(HAYWARD, 2005, p. 3-4). Para Bosselmann, no entanto, no mesmo
2015 de May e Daly, haveria algo como 92 Constituições que
explicitamente reconheciam o direito entre 125 que estabeleciam normas
ambientais em geral, com predominância para os países em desenvolvimento (107
delas) (BOSSELMANN, 2015, p. 177). O próprio Boyd, citado no texto, afirmou
também em 2015 que, em, pelo menos, 110 países garantiam, em suas
Constituições, a proteção ambiental (2015b).
[2] Essa
expressão pode apresentar, pelo menos, quatro sentidos: um,
mais empregado no texto, refere-se ao movimento expansivo do tema para
os textos constitucionais em diversos países; outro, a mencionar um
“constitucionalismo global para além do Estado”, a estabelecer instituições e
normas transnacionais de governança ambiental (GAREAU, 2013; KOTZÉ, 2012;
KYSAR, 2012; BODANSKY, 2009; PALMER, 1992). Um terceiro, a indicar a emergência
de normas ambientais internacionais que assumem um caráter de fundamentalidade
capaz de influenciar os ordenamentos jurídicos internos (ARAGÃO, 2014, p. 18).
E, enfim, o diálogo de dentro para fora e de fora da dentro dos países, a
partir dos ideais e princípios constitucionais ambientais que criariam um
espaço de convergência que facilitaria uma “institucionalidade ambiental e
internacional”, assim como seriam também influenciados pelas iniciativas e
documentos internacionais sobre o ambiente, ampliando aquele espaço
(BOSSELMANN, 2015, p. 172). Registre-se o esforço ainda de autores que procuram
diferenciar um “constitucionalismo ambiental fundamental”, referido ao direito
ao meio ambiente equilibrado, e um “constitucionalismo ambiental estrutural”,
identificado pelas relações entre competências constitucionais centrais e
periféricas no âmbito da proteção ambiental (HUDSON, 2015).
[3] Empregar-se-á,
preferencialmente, no texto a expressão “direito fundamental ao meio ambiente
equilibrado”. O termo “direitos ambientais” lhe é sinônimo para fins do artigo,
ambos a se referirem ao plexo de situações de vantagem, tanto processuais
(informação, participação, acesso ao Judiciário) quanto
materiais (meio ambiente equilibrado). Não se desconhece que alguns
autores o associam também a outros direitos humanos como o acesso à água, à
alimentação, à moradia, à saúde e à educação. Ou a eles se referem como
direitos do ambiente em si considerado. Na perspectiva antropocêntrica adotada,
o equilíbrio do ambiente contempla, para os seres humanos, o atendimento
daquelas necessidades. Veja-se
SHELTON, 1991.
[4] La
Repubblica […] tutela il paesaggio e il patrimonio storico e artistico della
Nazione.
[5] Art.
24sexies: 1 La protection de la nature et du paysage relève du droit cantonal.
2 La Confédération doit, dans l’accomplissement de ses tâches, ménager l’aspect
caractéristique du paysage et des localités, les sites évocateurs du passé,
ainsi que les curiosités naturelles et les monuments et les conserver intacts
là où il y a un intérêt général prépondérant. 3 La Confédération peut soutenir
par des subventions les efforts en faveur de la protection de la nature et du
paysage et procéder, par voie contractuelle ou d’expropriation, pour acquérir
ou conserver des réserves naturelles, des sites évocateurs du passé et des
monuments d’importance nationale. 4 Elle est autorisée à légiférer sur la protection
de la faune et de la flore.
[6] Защитата и опазването на природата и природните богатства, на водата, въздуха и почвата, както й на културните паметници е задължение на държавните органи и предприятия, кооперациите и обществените организации и дълг на всеки гражданин.
[7] Citizens
of the Polish People's Republic shall have the right to benefit from the
natural environment and it shall be their duty to protect it.
[8] The
State protects the environment and natural resources of the country. It recognizes
their close link with the sustainable economic and social development for
making human life more sensible, and for ensuring the survival, welfare, and
security of present and future generations. It corresponds to the competent
organs to implement this policy. It is the duty of the citizens to contribute
to the protection of the water and the atmosphere, and to the conservation of
the soil, flora, fauna, and all the rich potential of nature.
[9] In
the interests of the present and future generations, the necessary steps are
taken in the USSR to protect and make scientific, rational use of the land and
its mineral and water resources, and the plant and animal kingdoms, to preserve
the purity of air and water, ensure reproduction of natural wealth, and improve
the human environment (art. 18). Citizens of the USSR have the right to health
protection. This right is ensured by […] the development and improvement of
safety and hygiene in industry; by carrying out broad prophylactic measures; by
measures to improve the environment (art. 42).
[10] The
state protects and improves the living environment and the ecological
environment, and prevents and controls pollution and other public hazards. The
state organizes and encourages afforestation and the protection of forests.
[11] The
protection of the natural and cultural environment constitutes a duty of the
State. The State is bound to adopt special preventive or repressive measures
for the preservation of the environment.
[12] Note-se
que, no caso da Eslováquia, seriam apenas os detalhes do direito que deveriam
ser tratados pela norma legal.
[13] O
art. 101.2.1 ainda estabelece que cabe à lei definir
os princípios fundamentais de proteção e promoção do ambiente.
[14] Utiliza-se
aqui o conceito de “paradigma” como estruturas teóricas, valores, crenças,
instituições e hábitos que, dominantemente no corpo social ou de sua
intelectualidade, atribuem prioridades e significados a experiências e fatos
(COTGROVE, 1982, p. 26); ou que funcionam como lentes
para grupos e indivíduos interpretarem seu mundo social (MILBRATH, 1984, p. 7).
[15] Vejam-se
os exemplos de MAY (2006, p. 114) e GELLERS (2012, p. 12-13): “Since 1850, of
those constitutions with provisions for environmental protection, 72% have
featured positive duties of the government in the form of public policy
statements. However, historically less than one-third of constitutions with
environmental protection provisions have included fundamental environmental
rights, resulting in a relatively meager percentage of constitutions worldwide
to include such rights. Today, approximately 40% of countries
with environmental protection provisions in their constitutions include
fundamental environmental rights” (p. 13). Deve-se mencionar que há previsão do dever de
proteção ambiental nalguns textos apenas como dever dos indivíduos. É o caso de
Vanuatu de 1980 com a revisão de 1983 (art. 7.1, d).
[16] Cite-se,
por exemplo, a Constituição da África do Sul, Albânia, Angola, Bélgica, Butão,
Bolívia, Colômbia, Equador, Egito, El Salvador, Eritreia, Etiópia, França,
Geórgia, Grécia, Guiana, Hungria, Malaui, Maldivas, Mauritânia, México,
Montenegro, Moçambique, Nepal, Peru, Polônia, Portugal, Qatar, Quênia,
República Dominicana, Sérvia, Síria, Sudão do Sul, Suécia, Suíça, Tailândia,
Timor-Leste, Tunísia, Uganda, Venezuela e Zimbábue (CONSTITUTION PROJECT,
2016a).
[17] Consultem-se,
entre outros, os textos constitucionais da África do Sul, Albânia, Alemanha,
Angola, Argélia, Argentina, Armênia, Azerbaijão, Butão, Bolívia, Brasil,
Burundi, Cazaquistão, Cuba, Egito, Equador, Eritreia, Estônia, Fiji, França,
Geórgia, Guiana, Hungria, Irã, Jamaica, Japão, Lesoto, Letônia, Líbia,
Luxemburgo, Macedônia, Madagascar, Malaui, Maldivas, Marrocos, Moldova,
Moçambique, Níger, Noruega, Papua Nova Guiné, Polônia, Quênia, República
Dominicana, República Tcheca, Rússia, Suazilândia, Sudão do Sul, Suécia, Suíça,
Tajiquistão, Timor-Leste, Tunísia, Ucrânia, Uganda, Uruguai, Uzbequistão,
Vanuatu, Venezuela, Zâmbia e Zimbábue (CONSTITUTION PROJECT, 2016b).
[18] Constava
no texto da Constituição de 1991 a obrigação estatal de “sustento dos animais e
a manutenção de sua diversidade” (BULGÁRIA, 1991 [2007], art. 16)
[19] Esse
dispositivo foi acrescentado por uma emenda de 2002 e outra em 2004. Coube a
essa última incluir os animais no texto. Os debates durante a elaboração dessas
emendas, girando em torno do viés antropocêntrio e biocêntrico, são
interessantes (BOSSELMANN, 2015, p. 178-179). Não se trata, todavia, de um
direito que se possa acionar judicialmente (RODI, 2002). Os debates são ricos
também na Suíça (EVINS, 2010). Em alguns lugares, a jurisprudência se encaminha
para reconhecer um direito constitucional (ou fundamental) aos animais. Assim
na Índia e em Sri Lanka, embora a Suprema Corte dos respectivos países não se
tenha manifestado a respeito (WALDAU, 2011, p. 108).
[20] Curiosa
a distinção feita por Santamaría. Haveria o
neoconstitucionalismo europeu, o neoconstitucionalismo latino-americano e o
neoconstitucionalismo transformador ou andino. No primeiro, ter-se-iam os
valores dos direitos fundamentais, sobretudo liberais, uma flexibilidade da
hermenêutica clássica e um protagonismo judicial. No segundo, seriam marcas a expansão dos direitos, inclusive com a
judicialização dos direitos sociais; a ampliação do
controle de constitucionalidade; o redimensionamento do Estado; o
constitucionalismo econômico direcionado à equidade e o hiperpresidencialismo.
No último, mais do que recepção das formas ainda colonizadas do discurso
constitucional, ter-se-iam em
conta os quadros gerados pela colonização com a segregação e exclusão de
populações originárias e da institucionalização parcial das conquistas
emancipatórias europeias, para incorporar as novas
linguagens, narrativas, imaginários, problemas e soluções, reivindicados pelos
movimentos sociais, mediante processos participativos radicais e da democracia
comunitária e descentralização, destinadas à universalização igualitária de
conquistas, com a revalorização dos saberes tradicionais ao lado do
conhecimento científico, e da cultura do território e da terra, expressa na
tradição da Pachamama e do bom viver (SANTAMARÍA, 2011, p. 53 e ss).