Ética e o ensino do Direito
Animal: estudo de caso
Ethics and the teaching of Animal Law: a case study
Heron
José de Santana Gordilho*
Bruno
Leal de Souza**
RESUMO: O
ensino sobre o Direito Animal não é nada fácil. Existem muitas barreiras a
serem conquistadas, principalmente aquelas que se referem ao campo do
comportamento humano, dos costumes, hábitos etc, além de “hábitos” da própria
sociedade. Este estudo tem como objetivo analisar o desenvolvimento de uma ACCS
– Atividade Curricular e em Comunidade e Sociedade - disciplina optativa, de
extensão, cujo nome é Ética e Direito Animal, da Faculdade de Direito da
Universidade Federal da Bahia, por meio de um estudo de caso.
PALAVRAS-CHAVE:
Ensino; Ética; Animal; Direito.
ABSTRACT:
The teaching on Animal Rights
is not easy. There are many barriers to be achieved, particularly those related
to the field of human behavior, habits, etc., and "habits" of society
itself. This study aims to analyze the development of ACCS - Curricular
Activity and Community and Society – subject, which is optional and
considered an extension, entitled Ethics and Animal Law, Federal University of
Bahia Law School, through a case study.
KEYWORDS:
Teaching; ethics; animal;
Right.
INTRODUÇÃO
É preciso, inicialmente, ter em conta que o Direito sempre
considerou os animais coisas suscetíveis de apropriação e comercialização,
mesmo porque, diariamente, milhares deles são capturados e mortos no comercio
legal ou clandestino (GORDILHO, 2010). Quebrar a barreira, com referência ao
direito de vida dos animais, para que a população, e os próprios estudantes,
percebam a relevância dos assuntos discutidos na atualidade não é tão fácil. E,
isto acontece porque, quando a pessoa nasce já encontra um modo se “ser” e agir
predeterminado; e, por ainda estar na sua fase de conhecimento daquilo que
existe para que comece a ter uma posição critica sobre aquilo que acontece, a
pessoa humana segue os mesmos preceitos sociais que, no caso, é o não
pensamento a respeito do direito de vida dos animais que se perpetua na cultura
brasileira.
Para Durkheim, as pessoas, ao nascerem, encontram prontas as
regras sociais, as normas de convivência, as tradições e as relações sociais,
assim como os valores e as crenças (MELO, 2012) e quebrar ou rediscutir esse
aprendizado anos após se ter consciência do que acontece é muito complicado,
talvez pela falta de interesse no assunto, ou até mesmo pela inacessibilidade
de informações.
Segundo o educador Paulo Freire (2013), conhecer é tarefa de
sujeitos, não de objetos. E é como sujeito, e somente na qualidade de sujeito,
que o homem realmente pode conhecer. Para o autor, só aprende verdadeiramente
aquele que se apropria do apreendido, aquele que é capaz de aplicar o
aprendido-apreendido a situações existenciais concretas (FREIRE, 2013). Em
outras palavras, os que lidam com a vida cotidiana possuem uma grande
capacidade de entender aquilo que está ao redor e, com isso, possibilitar a
melhoria, mudança ou inibição de determinadas ações do cotidiano. Nenhum objeto
seria capaz de entender os acontecimentos da vida, pois estes não possuem vida,
são concretos e inertes, ao contrário dos seres humanos e animais, que
conseguem perceber comportamentos, manifestações e sentimentos do dia a dia,
como a dor (SINGER, 2004).
Singer (2004) traz um bom exemplo que ajuda a se impulsionar o
pensamento, referente ao comportamento humano ante os animais que, todavia, foi
o objeto de estudo da disciplina do estudo de caso a seguir. O exemplo,
entretanto, foi o de que:
[…] as mulheres têm direito de votar, pois são tão capazes de
tomar decisões racionais sobre o futuro quanto os homens. Cães, por outro lado,
são incapazes de compreender o significado de votar, portanto, não pode ter o
direito de votar. Há várias semelhanças óbvias entre homens e mulheres, ao
passo que seres humanos e animais diferem bastante. Por conseguinte, seria
possível afirmar: homens e mulheres são seres semelhantes e devem ter direitos
semelhantes, enquanto seres humanos e não-humanos são
diferentes e seus direitos não devem ser iguais (SINGER, 2004).
O exemplo mencionado por Singer permite dar início a uma grande
questão: os animais não compreendem o significado do voto porque não querem
votar ou porque não possuem, na sua “formação”
coletiva, um entendimento para tal? A Constituição Federal Brasileira de 1988,
em seu Art.º 14 expressa que, a soberania popular será
exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto […]. Logo, se o
voto foi instituído para possibilitar a democracia na escolha de determinadas
“coisas” (como eleições e outros) no País, sendo então uma criação social do
ser humano para construir e harmonizar um ambiente coletivo sendo que essa
elaboração se dá em sociedade com as outras pessoas (MELO, 2012), por que os
animais, não humanos, como cita o autor, deveriam ter consciência desse ato,
que porventura não é de sua criação?
É notório o fato de que a
linguagem entre humanos e animais não é a mesma, pois há que se chamar de
capacidade de fala que os animais não possuem. E, então, como se pode
estabelecer uma ponte de contato entre esses seres, que também habitam o
Planeta? Será que as ações humanas podem interferir no seu direito de vida, no
seu direito de andar pelo mundo livremente? Se os humanos e os
não humanos possuem direitos diferenciados, como relata Singer em seu
exemplo, qual seria então a diferença entre esses direitos? Um dos direitos dos
seres não humanos, que deveria ser instituído pelos entes humanos, não seria a
proteção daquilo que os humanos, ao decidirem viver em sociedade, criaram, de
forma que não afetasse o direito de vida dos animais?
Pelo mesmo motivo em que a ação é o objeto de ensaios da Ética,
far-se-á um comparativo das ações, mesmo que indiretas, do ensino do Direito no
viés do Direito Animal, por via de um estudo de caso, para que, nele, se possam
perceber as condutas tidas por estudantes no ensino de um assunto que emerge no
país, que é o Direito Animal. E, em paralelo ao estudo, demandar-se-ão soluções
que possibilitem a compreensão do comportamento humano perante animais na
tentativa de buscar explicações que viabilizem melhor inserção da ideia de
Direito Animal na sociedade.
1 NOÇÕES SOBRE ÉTICA
Nota-se, na atualidade, o fato de ser necessário o estudo do
comportamento humano, principalmente no que se refere ao campo da Ética, sobretudo
porque diz respeito à experiência cotidiana, conduzindo a uma reflexão sobre os
valores adotados, o sentido dos atos que se praticam e a maneira pela qual tomam
decisões e se assumem responsabilidades. (MARCONDES, 2007).
É em suporte numa reflexão sobre as ações de cada qual que se
podem perceber as consequências, sejam elas positivas ou negativas, e, por
consequência, se poderá determinar se esta foi ou não uma boa conduta; já que,
segundo Marcondes (2007), a problemática da Ética, portanto, em amplo sentido,
diz respeito à determinação do que é certo ou errado, bom ou mau, permitido ou
proibido, de acordo com um conjunto de normas ou valores adotados historicamente
por uma sociedade. A Ética “tenta” determinar a validade, num sentido positivo
ou negativo, de uma determinada conduta perante o desenvolvimento dos
comportamentos de certa sociedade no decorrer do processo histórico, que pode
ou não aceitar o fato ocorrido com base nos seus costumes, modos de vida e
maneira de agir.
Alguns autores, como Marcondes (2007), definem Ética como uma
teoria ou ciência do comportamento moral dos homens em sociedade. É a ciência,
pois, de uma forma específica de comportamento humano. O autor reforça, ainda, a
noção de que a Ética é uma ciência da Moral, isto é, de uma esfera do
comportamento humano. No dicionário Amora (2009), a ética é definida como um
ramo da Filosofia que se dedica ao estudo dos valores morais da conduta humana.
Outros autores, como Alencastro (2013), trazem uma definição de Ética um pouco
mais simplificada. Segundo ele, a Ética é, portanto, teoria. Seja como ciência
do comportamento ou como reflexão filosófica da Moral, ela tem como objeto de
estudo um determinado tipo de costumes, cujas normas são interiorizadas por
socialização e coletivamente aceitas numa dada sociedade.
Com os conceitos ora citados, percebe-se que o objeto da Ética são
as ações humanas, os hábitos, costumes e até mesmo regras e leis que regem determinada
sociedade (ALENCASTRO, 2013). E, pode-se notar, analisando os fragmentos dos
autores, que, a Ética estuda o comportamento humano de cada sociedade, tendo
como base os marcos históricos e as interações sociais
das pessoas com o corpo social.
Já o Direito é uma fração de todo o estudo da Ética, uma vez que se
percebe o seu aparecimento na tentativa de modelagem do comportamento no meio
social, balizada pelas normas, leis e códigos sociais, que prescrevem certas
condutas de um indivíduo em uma sociedade. E, se a Ética estuda a conduta
humana, e porventura a lei também busca “modelar” certos comportamentos havidos
por seres humanos, percebe-se que o campo do Direito está diretamente ligado à
Ética, sendo esta um terreno mais amplo que o Direito, já que este trabalha com
uma parte do comportamento regido por normas de conduta e aquela não estuda
todo o tipo de comportamento.
Ao se falar de Ética, não se pode esquecer a Moral, uma vez que
ela é o conjunto de hábitos e costumes efetivamente vivenciado por um grupo
humano (SANTOS 1997 apud ALENCASTRO, 2013). E, pelo fato de a Moral ser um
conjunto de ações desenvolvidas pelo indivíduo, é lícito dizer que a Moral está
mais próxima do campo do Direito, já que a lei é aquele conjunto de hábitos e
costumes considerados fundamentais e indispensáveis a
sociedade, ou seja, acordos de caráter obrigatório estabelecidos entre pessoas
de um grupo, para garantir justiça mínima, ou direitos mínimos de ser (SANTOS
1997 apud ALENCASTRO 2013). Logo, com isso, é notório o fato de que a Ética é instância
geral e teórica capaz de promover a reflexão e a critica em relação às ações
humanas (ALENCASTRO, 2013), ao passo que a Moral e o Direito são as próprias
ações em si, em outras palavras, é a ação que porventura é o objeto de estudo
da Ética.
Pelo mesmo motivo que a ação é o objeto para estudar a Ética, será
feito um comparativo das ações, mesmo que indiretas, do ensino do Direito no viés
do Direito Animal mediante um estudo de caso, para que, nele, se percebam as
condutas tidas por estudantes no ensino de um assunto que em curso no País, que
é o Direito Animal.
2 ESTUDO DE CASO
O estudo em tela tem como objetivo analisar o desenvolvimento de
uma ACCS – Atividade Curricular e em Comunidade e Sociedade – disciplina optativa,
de extensão, cujo nome é Ética e Direito Animal, da Faculdade de Direito da
Universidade Federal da Bahia. Como forma de explicar a todas as pessoas o
significado desta disciplina de extensão, a Universidade Federal da Bahia
(2014, p. 108) publica, em seu Manual de Extensão Universitária, que:
A Atividade Curricular em Comunidade e em Sociedade (ACCS) é um
componente curricular, modalidade “disciplina” de cursos de Graduação e
Pós-Graduação, em que estudantes e professores da UFBA, em relação
multidirecional com os grupos da sociedade, desenvolvem ações de extensão no
âmbito da criação, tecnologia e inovação, promovendo o intercâmbio, a
reelaboração e a produção de conhecimentos sobre a realidade com perspectiva de
transformação.
O estudo foi realizado após o término da disciplina, que se
desenvolveu no segundo semestre do ano de 2014, e como objeto de estudo foram
analisados os diários de campo dos discentes, para que se pudesse notar a
importância desta atividade em comunidade no desenvolvimento crítico dos
discentes a respeito das realidades em que se inseriram no tempo.
O diário de campo foi a atividade
avaliativa proposta para a disciplina, em que os alunos deveriam contar as
experiências, além de criticas, questionamentos e outros, tida no decorrer dos
17 da disciplina no semestre. Cada dia possuía uma carga de quatro horas, o que
proporciona ao discente uma maior inserção na realidade presenciada,
potencializando sua capacidade de critica, ao perceber se existem
inconformidades entre aquilo que deveria ser feito com aquilo que está sendo
feito.
Logo no início do semestre, havia 29 discentes matriculados no
componente curricular, porém, ocorreram 6 desistências
no decorrer do curso e, no final, três deles perderam por ultrapassar o máximo
de faltas permitido, o que poderia comprometer sua aprendizagem já que a vivência
de um dia não poderia mais ser repetida. Consoante Jaegwon Kim (LECLERC, 2014),
um evento é uma instanciação de uma propriedade por um objeto (que pode ser um
agente) em um momento determinado. Logo, se a vivência de um determinado dia é
um evento, com propriedades, que ocorreu num determinado tempo este não
ocorrerá da mesma forma duas vezes.
Ao final do semestre, 13 dos 20 diários, referentes aos 20
discentes que frequentaram a atividade até o final sem perderem por falta de
frequência ou desistência, foram entregues. E, dentre estes entregues, dez
estavam dentro do período, enquanto três foram entregues após o período
estipulado pela própria turma no primeiro encontro.
Dentre os diários cedidos, tentou-se estabelecer alguns parâmetros
avaliativos para que se pudesse perceber o desenvolvimento crítico dos
discentes: a quantidade de textos juntada ao diário, se houve
descrição, opinião, argumentos que validassem seu posicionamento, exemplos,
plágio, se foi registrado mero resumo dos acontecimentos vivenciados, se as
citações foram referenciadas ou não e se os textos necessitavam de debates que
o complementassem.
Dentre todos os diários, somente 13 foram estudados neste artigo,
uma vez que os três diários entregues fora do prazo foram escritos de ultima
hora e em texto corrido, o que impossibilitava uma comparação com os demais que
estavam no prazo.
Entre os 13 diários entregues, havia alguns incompletos, uma vez
que houve 17 dias de aulas distribuídos nos cinco meses letivos, sendo uma aula
cada semana. E, pela lógica, calculando a quantidade de dias e de textos a
serem produzidos pelos discentes, dever-se-ia receber um total de 169 textos
dos 13 discentes que tiveram seus diários aqui analisados. Esta quantidade de
textos teve como base o cálculo feito pela multiplicação entre a quantidade de
dias vezes o total de discentes, no caso, 17 vezes 13, que é igual a 169
textos. Apenas foram apresentados, todavia, 155 textos, faltando um total de 14
textos.
Após a contabilização dos escritos e depois da tabulação dos dados
de cada um, foi possível notar que dos 155, apenas 101, que representavam cerca de 65,16%, descreveram as vivências de cada encontro
com a comunidade e reuniões, enquanto 54 textos, que representavam a parcela de
34,84%, não descreveram o que ocorreu, apenas citaram alguns acontecimentos e
logo foram tomando posições críticas sobre as vivências, enquanto a maior parcela
optou pelo enfoque da descrição de cada acontecimento do dia.
Há, ainda, um percentual parecido com o citado há pouco, onde 104
dos 51 textos exprimirão opiniões e posicionamentos sobre suas vivências. É
notório que a parcela de 67,10% expressou críticas e posicionamentos sobre as
experiências obtidas no decorrer da disciplina, enquanto 32,90% dos discentes
preferiram apenas descrever os fatos dos encontros. Além disso, observou-se
também que, praticamente, metade dos textos apresentados (cerca
de 49,68%) justificou sua opinião ou posicionamento, enquanto os demais
textos, 50,32%, preferiram apenas descrever o ocorrido ou dar uma opinião sobre
sua vivência, enquanto outros foram além de um simples posicionamento do que
vivenciaram. E, como se nota, cerca de 45,16% dos textos
exprimiram exemplificações, enquanto o restante dos textos, 85, representativos
de 54,84% do montante, preferiram não dar exemplos daquilo que escreviam.
Foi verificado que em nenhum dos diários houve plágio ou qualquer
cópia indevida da internet; todos os textos foram realmente escritos pelos
estudantes. Na escrita de seus diários, entretanto, foram detectadas algumas
citações referenciadas, cerca de 20%, e, em 80% não houve as devidas
referenciações.
Cerca de 117 textos analisados
foram percebidos com uma grande quantidade de resumos. Em outras palavras,
foram encontradas muitas citações como forma de resumir aquilo que vivenciaram
e, com isso, cerca de 81,29 % dos textos apresentados,
o equivalente a 126 textos, necessitavam de mais discussões para que pudessem
relatar mais sobre aquilo que vivenciaram em cada encontro, principalmente, com
a comunidade.
Percebe-se que entre os 13 diários analisados, há média de cerca de 7,8 textos que possuem a presença de descrição, enquanto
há a presença de 4,2 textos que não possuem descrições do que aconteceram em
cada encontro.
Verificou-se, ainda, que em 13 textos presentes em cada diário,
cerca de 8 possuíam opiniões sobre as vivências e
aproximadamente 5 textos apenas continham as descrições detalhadas do que
ocorreram no dia a dia da disciplina.
Quanto menos os textos eram descritos, havia opiniões em quase
todos eles e, além disso, tinha-se mais a presença de justificações daquilo que
se opinava e mais exemplos eram citados, o que acarretava baixa necessidade de
discussões por haver um posicionamento justificado daquilo que se vivenciou. Em
contrapartida, pode-se perceber que quanto mais os discentes descreviam passo a
passo o que ocorreu na sua vivência, opinavam, mas não justificavam seus
posicionamentos e, com isso, menos exemplos eram dados e mais se necessitavam
de uma discussão em seus textos, uma vez que praticamente só escreviam o que
ocorreu no dia, sem nenhuma, ou quase nenhuma, experiência, questionamento,
dúvida ou quaisquer outro posicionamento sobre a visão
de sua vivência.
Além disso, foi possível inferir que
ao multiplicar 4,2, que é a média de textos com posicionamentos seguidos de
justificativa e exemplificação, pelo número 13, que significa o total de
diários entregues, ter-se-á um total de 55 textos. Ou seja, do total de 155
textos entregues, 55 textos foram considerados como completos em discussão por
conter posicionamentos e justificativas sobre as vivências proporcionadas pela
Atividade Curricular em Comunidade e em Sociedade.
Outro dado importante é o fato de que apenas três textos de cada
diário apontavam alguma citação com referenciação ao seu autor, enquanto,
aproximadamente, 5 em cada 13 textos apresentavam
citações sem as devidas referenciações. Todavia, vale ressaltar que as citações
apareciam nos textos como formas de exemplificação.
Outro indicativo a ser alvo de menção é o fato de que 75,48% dos
diários que mostrava uma predominância maior de resumos necessitavam de
discussões acerca do que foi vivenciado. Enquanto isso, aqueles que não resumiram, 24,52% dos textos, possuíam uma tendência de não
haver necessidade de mais discussões. Isso não impossibilitava, no entanto, de
proporem mais argumentos. Quanto maior a prevalência de resumos dos
acontecimentos vividos, pelos próprios discentes em seus textos, maiores eram
as necessidades de mais discussões e, quanto menor a prevalência de resumos,
menores eram as necessidades de incidências de mais discussões sobre os fatos
vivenciados.
CONCLUSÃO
A Atividade Curricular em Comunidade e Sociedade (ACCS) é uma das
formas que a Universidade encontra para aproximar os estudos, e aquilo que é
produzido pelas suas faculdades, da vivência cotidiana nas comunidades. Essa
aproximação possibilita que os discentes percebam que nem sempre a teoria
estudada esta aplicada e, nela, pode haver muitas distorções daquilo que se
estuda. E esta junção entre teoria e prática visa a um aprendizado critico,
onde há a possibilidade de investigar o porquê dos problemas existentes e das
dificuldades e facilidades encontradas nesses caminhos.
Vivenciar a realidade é perceber, com os próprios olhos, sentir na
própria pele, a realidade que ora se estuda em um estado de “perfeição” na
universidade e que ora se vivencia, mas não se dá as devidas atenções a essas
diferenças. A experiência de vivenciar a realidade vai além do imaginário,
ultrapassa as fronteiras que se possui quando apenas se leem os assuntos
ligados ao objeto de estudo. Poder ver a ação acontecer é o mesmo que abrir
portas e semear fronteiras para distintos conhecimentos que podem e vão
enriquecer mais a vida, seja ela profissional ou não.
Analisando os diários de campo dos discentes do estudo de caso, contudo,
notou-se que muitos deles, perto de 70%, apenas fizeram seus diários por fazer,
para cumprir tabela, apenas no intuito de poder obter a nota da atividade para
que seu escore ou placar geral da faculdade não diminua. Tem-se, então, um
interesse maior por números que, com certeza, vão demonstrar que o discente é
melhor do que outros, do que com o conteúdo e a proposta da atividade, que é a
percepção e desenvolvimento da crítica por meio das vivências.
Muitos dos textos escritos pelos discentes continham uma
reprodução daquilo que se discutiu em sala e, com isso, pode-se pensar que essa
reprodução ocorreu pelo fato de não quererem opinar ou discutir os casos
abordados, apenas pensando em cumprir a atividade de maneira a obter a nota
final, ou talvez para não acharem que suas opiniões são irrelevantes e
supérfluas. Alguns textos até exprimiam algumas opiniões ou citações como forma
de não deixar somente uma breve descrição do que ocorreu no encontro, podendo-se
dizer que deu o “jeitinho” brasileiro, como diz DaMatta
(1986), para que se pudesse perceber que houve uma critica sobre o
ocorrido/observado. A omissão do debate, porém, em quase todos os textos pode
comprovar, ou comprova, que os discentes não querem discutir sobre o assunto.
Levou-se, ainda, em conta que a falta de discussões pode ser causada pelo
primeiro contato com o assunto ou pela desmotivação relativa aos debates, ou
até pelo modo como eram guiados.
Como, porém, o assunto Direito Animal é emergente, não havendo
muitas décadas de debates, convém propor maneiras atrativas e que chamem a
atenção dos espectadores, pois discutir assuntos com modo tradicional de ensino
pode não estar mais despertando o interesse dos discentes, o que levam a buscar
outros assuntos mais interativos. Outro ponto importante a ser destacado é que,
quanto mais o assunto em discussão se aproxima da realidade daqueles que ouvem,
mais rápido se poderá despertar a atenção e interesse para o que está sendo
abordado. Nas discussões, deve-se ser simples, objetivos e inovadores, pois,
assim, se logrará fazer com que o outro perceba a relevância da discussão.
O que se sente, dia a dia, com maior força aqui, menos ali, em
qualquer dos lados em que o mundo se divide, é um homem simples esmagado,
diminuído e acomodado, convertido em espectador, dirigido pelo poder dos mitos
que forças sociais poderosas criam para ele (FREIRE, 2014). As pessoas têm para
si que é mais fácil resignar-se do que levantar-se contra as forças que as
mantém inertes, e se pode perceber isso quando se analisam os diários e se
percebem que quase não há opiniões ou posicionamentos sobre o que acontece.
Freire (2014) ainda complementa, exprimindo a ideia de que a pessoa sem a
capacidade de visualizar esta tragédia, de captar criticamente seus temas, de
conhecer para interferir, é levada pelo jogo das próprias mudanças e manipulada
pelas já referidas prescrições que lhes são impostas.
Em outras palavras, precisa-se, primeiramente, proporcionar ao
indivíduo o início de uma conscientização crítica sobre a sua vivência. Isso se
dará, todavia, com base em discussões ligadas ao seu contexto mais próximo, e
não distante, para que ele possa começar a perceber que, assim como uma só
palavra pode possuir múltiplos significados, uma intenção é passível de
conduzir a diversos caminhos, intimamente atrelados ao seu comportamento diante
do meio social.
REFERÊNCIAS
ALENCASTRO,
Mário Sergio Cunha. Ética empresarial na prática: liderança, gestão e responsabilidade
corporativa. Curitiba: InterSaberes, 2013.
AMORA,
Antônio Soares. Minidicionário Soares Amora da língua portuguesa. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
BRASIL.
Constituição Federativa do Brasil de 1988. 26. ed.
Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2006.
DAMATTA,
Roberto. O que faz o Brasil, Brasil? Rio de Janeiro: Rocco, 1986.
FERRAZ
JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do
direito: técnica, decisão,
dominação. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2001.
FREIRE,
Paulo. Extensão ou comunicação? Tradução Rosiska Darcy de Oliveira. 16. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2013.
______.
Educação como prática da liberdade. 36. ed. ver
atual. São Paulo: Paz e Terra, 2014.
GORDILHO,
Heron José de Santana. Direito Ambiental pós-moderno. Curitiba: Juruá,
2010.
______,
Heron José de Santana. Abolicionismo animal. Salvador: Evolução, 2008.
MELO, Alessandro de. Fundamentos socioculturais da educação. Curitiba:
InterSaberes, 2012. (Série Fundamentos da Educação).
REGAN,
Tom. Jaulas vazias: encarando o
desafio dos direitos animais. Porto Alegre, RS: Lugano, 2006.
SINGER,
Peter. Libertação animal. Porto Alegre, São Paulo: Lugano, 2004.
TORRES,
João Carlos Brum (org.). Manual de Ética: questões de ética teórica e aplicada. Petrópolis, RJ: Vozes; Caixa
do Sul, RS; Universidade de Caxias do Sul; Rio de Janeiro: BNDES, 2014.
UNIVERSIDADE
FEDERAL DA BAHIA. Pró-Reitoria de Extensão Universitária. Manual de extensão
universitária da UFBA. Salvador: UFBA, 2014.
* Pós-Doutor pela Pace University Law School, New York (EU), onde integra a diretoria do Brazil-American Institute for Law and Environment (BAILE). Doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Professor Associado das Faculdades de Direito da Universidade Católica do Salvador (UCSAL) e da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFBA. Professor do Mestrado em Direito Animal e Sociedade da Universidade Autônoma de Barcelona (ESP). Presidente da Associación Latinoamericana de Derecho Animal (ALDA). Promotor de Justiça do Meio Ambiente na comarca de Salvador (MP/BA). E-mail: [email protected].
** Bacharelando Interdisciplinar em
Saúde da UFBA, Bacharelando em Administração Hospitalar da UNOPAR, Licenciando
em Matemática da UNINTER e Pesquisador do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e
Extensão em Direito dos Animais, Meio Ambiente e Pós-Modernidade da UFBA.
E-mail: [email protected]/ [email protected].
Data
de recebimento do artigo: 10/01/2016 – Data de avaliação: 04/02/2016 e 09/02/2016.