A propriedade fiduciária de base romanística e o trust inglês: perspectivas comparatísticas

Roman-based fiduciary ownership and the English trust: comparative perspectives

Tomás Olcese*

 

RESUMO: O ensaio explora e fomenta, desde uma visão histórico-funcional da propriedade fiduciária romanística e o trust de origem inglesa, o diálogo entre duas das maiores tradições jurídicas do mundo ocidental: a tradição de base romanística e a tradição baseada no Common Law. Por meio de um estudo baseado em fontes primárias e secundárias, busca-se traçar, de um lado, o desenvolvimento histórico da fiducia (cum amico e cum creditore) e, de outro, a elaboração jurisprudencial e estatutária do trust inglês (desde os uses medievais até o conceito atual do instituto, passando pelo Statute of Uses 1536). A seguir, mostra-se a estrutura jurídica básica, no Brasil, da propriedade fiduciária (e do seu consectário lógico, a propriedade resolúvel), a fim de proceder a uma comparação com o trust inglês e estabelecer relações de sentido entre essas duas figuras jurídicas.

 

PALAVRAS-CHAVE: Propriedade Fiduciária; Fiducia cum amico; Fiducia cum creditore; Trust; Propriedade Resolúvel.

 

ABSTRACT: The purpose of this paper is to contribute toward an open dialogue between two of the most important legal traditions of the Western civilization – namely, the civilian legal tradition and the common law tradition – by promoting a historical and functional analysis of Roman-based fiduciary ownership and the Trust rooted in the English common law. The objective is twofold: to delineate the historical development of the fiducia cum amico and the fiducia cum creditore through the analysis of primary and secondary sources and to summarize the main factors (regarding case law and statutory law) that shaped the Trust into what it is today (from medieval uses to its present-day structure, by way of the Statute of Uses, 1536). The article then offers a brief explanation of the basic legal structure of fiduciary ownership in Brazil (as well as its unavoidable consequence, temporary ownership) in order to compare it to the English Trust and establish a meaningful relationships between them.

 

KEYWORDS: Fiduciary ownership; Fiducia cum amico; Fiducia cum creditore; Trust; Temporary Property.

 

 

INTRODUÇÃO

 

A comparação entre sistemas jurídicos tornou-se um elemento habitual da metodologia do pesquisador contemporâneo. Analisar o Direito exclusivamente em termos de Direito Positivo nacional, apesar de dificilmente aconselhável mesmo em tempos passados, impinge certo sabor de incompletude a valorações mais profundas acerca do sentido e estrutura dos institutos jurídicos e pátrios.

A propriedade fiduciária é um instituto de suma relevância no campo jurídico-econômico nacional. Suas raízes podem ser traçadas ao Direito Romano e suas principais características histórico-genéticas ainda podem ser sentidas. O trust dos sistemas de matriz inglesa, por outro lado, permaneceu uma espécie de mistério para muitos juristas brasileiros, apesar de essa figura ter ingressado em inúmeros ordenamentos jurídicos de base romanística, inclusive na América Latina.

 Os objetivos gerais deste artigo são expor as origens romanas da propriedade fiduciária mediante uma narrativa da configuração histórica da fiducia cum amico e da fiducia cum creditore, bem como explicar as principais características do trust típico do sistema do common law por meio de uma apresentação da sua evolução com a origem do use medieval. O objetivo específico é traçar uma comparação entre os dois institutos, de modo a esclarecer melhor os seus contornos atuais e estimular o estudo fértil de institutos análogos pertencentes a sistemas jurídicos distintos.

A metodologia consiste no estudo das fontes primárias e secundárias elementares à compreensão dos institutos. No caso da fiducia romana, as principais fontes primárias provêm das Institutas, de Gaio, e do Digesto, de Justiniano, bem como de uma reconstituição da fórmula de pretor elaborada por Otto Lenel. Já no caso do trust inglês, as fontes primárias nas quais o estudo se baseia procedem tanto dos denominados books of authority ingleses quanto da case law emanadas dos tribunais superiores, especialmente da Court of Chancery. A fonte secundária, para ambos os institutos, é a literatura jurídica mais avalizada acerca dos respectivos temas.

 

1 ORIGENS ROMANAS DA PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA: A FIDUCIA

 

O nascedouro da propriedade fiduciária do Direito Civil moderno encontra-se na antiga figura romana da fiducia, cuja evolução histórica, em larga medida, não é fácil traçar pelo fato de que, muito provavelmente, a sua tutela judicial tenha sido desenvolvida pelo praetor durante o período clássico. A dificuldade da reconstituição dessa figura  com base no texto do Digesto é agravada pelo fato de que os fragmentos que a mencionavam foram interpolados, sendo a palavra fiducia sistematicamente substituída pelo vocábulo pignus (Volterra, 1986, p. 488).

A fiducia, no Direito Romano, consistia na transmissão da propriedade de uma coisa infungível mediante a mancipatio ou a in iure cessio, pela qual o fiduciário assumia o compromisso (mediante a celebração de um pactum fiduciae) de restituir a propriedade ao fiduciante uma vez realizado o fim desejado pelas partes (D’Ors, 2004, p. 550).

Muito utilizada em época republicana, a fiducia tinha as seguintes aplicações: (i) garantir o adimplemento de uma obrigação preexistente; (ii) constituir o depositum ou o commodatum de um bem; (iii) assegurar a emancipação de um filiusfamilias ou a coemptio de uma mulher; (iv) assegurar a manumissio de um escravo; (v) possibilitar uma doação, por ato inter vivos ou mortis causa, e (vi) de acordo com alguns autores, teria constituído a base da mancipatio familiae (Volterra, 1986, p. 489).

Note-se: era, no Direito Romano arcaico, um verdadeiro negócio fiduciário, na medida em que, no período clássico do Direito Romano, a mancipatio – bem como, em certa medida, a in jure cessio (Marrone, 2006, p. 134) – era uma forma de alienação abstrata (Moreira Alves, 1996, p. 306) denominada imaginaria venditio, conforme explica o jurista Gaio:

Gai. 1, 119: Est autem mancipatio, ut supra quoque diximus, imaginaria quaedam uenditio [...] (Contudo, a mancipatio, conforme também dissemos acima, é uma espécie de venda imaginária [...].

 

Assim, o pacto fiduciário baseava-se originariamente na fides, pois o fiduciante, caso quisesse propor uma ação em face do fiduciário, ficava sujeito à causa negocial na qual se fundava a relação que dera origem à transferência do título (Marrone, 2006. p. 449).

A fiducia, de acordo com as fontes romanas, podia ser cum amico ou cum creditore:

 

Gai. 2, 60: Sed cum fiducia contrahitur aut cum creditore pignoris iure aut cum amico, quo tutius nostrae res apud eum essent, si quidem cum amico contracta sit fiducia, sane omni modo conpetit usus receptio; si uero cum creditore, soluta quidem pecunia omni modo conpetit, nondum uero soluta ita demum competit, si neque conduxerit eam rem a creditore debitor neque precario rogauerit, ut eam rem possidere liceret; quo casu lucratiua usus capio conpetit (Mas como a fidúcia pode ser contraída tanto com um credor a título de penhor, quanto com um amigo a fim de que nossas coisas junto a ele estejam a salvo, caso a fidúcia de fato seja contraída com um amigo, em qualquer caso sempre cabe a usureceptio. No entanto, se for <contraída> com um credor, somente cabe <a usureceptio> estando a dívida paga. Caso o devedor não tenha locado aquela coisa do credor nem a tenha solicitado a título precário, de tal forma que lhe seja lícito possuir a coisa, em tal caso cabe a usucapião lucrativa).

 

No primeiro caso, se a coisa caísse em poder do fiduciante, este podia readquiri-la mediante a usureceptio, forma especial de usucapião que prescindia de justa causa e cujo prazo, no caso de bens imóveis itálicos, era de um ano (Talamanca, 1990, p. 478 e 554):

 

Gai. 2, 59: Adhuc etiam ex aliis causis sciens quisque rem alienam usucapit: nam qui rem alicui fiduciae causa mancipio dederit uel in iure cesserit, si eandem ipse possederit, potest usucapere, anno scilicet soli si sit. Quae species usucapionis dicitur usureceptio, quia id, quod aliquando habuimus, recipimus per usucapionem (Agora, também <há> outras causas pelas quais alguém ciente <de que a coisa pertence a outrem> adquire por usucapião uma coisa alheia. Assim, aquele que tiver alienado o pleno domínio de uma coisa a alguém a título de fidúcia, ou a tenha cedido em juízo, pode usucapi-la, caso ele próprio possua a mesma coisa, em um ano exatamente se <o prazo> for o de um imóvel. E essa espécie de usucapião denomina-se usureceptio, porque adquirimos por usucapião aquilo que já tivemos <como nosso> em algum momento).

 

Já no caso da fiducia cum creditore, o fragmento explica que somente pode ocorrer a usureceptio se a dívida já tivesse sido paga. Por outro lado, se o devedor fiduciante não fosse mero detentor da coisa, poderia recuperar a coisa mediante a usucapio lucrativa, mesmo não tendo pagado a dívida. De acordo com William Smith (1842, p. 1062-1063), a usucapio lucrativa permitia a usucapião de uma herança por parte de um terceiro, o que também ocorria no prazo de um ano.

 

1.1  Fiducia cum creditore

 

Esta é a mais primitiva das garantias reais (Moreira Alves, 1996, p. 350) e surgiu, portanto, em momento cronologicamente anterior ao depósito, ao comodato e ao penhor. Nesse caso, a transferência de propriedade constituía a garantia de um crédito oferecido pelo fiduciário ao fiduciante (a causa era a mesma do penhor), devendo aquele devolver a propriedade da res fiduciae data a este, uma vez ocorrida a extinção do débito (Marrone, 2006, p. 449).

O comprador fiduciário assumia o compromisso de restituição mediante uma declaração especial formulada no momento da celebração da mancipatio. Entende-se que o compromisso era assumido mediante um pactum aposto ao ato de alienação, que, no período pré-clássico, estaria desprovido de actio, configurando um nudum pactum. Teria sido o pretor quem, mediante a concessão de uma actio in factum, sancionou esse pacto, nascendo, assim, o pactum fiduciae, que tinha eficácia apenas pessoal (Guarino, 2001, p. 860 e Moreira Alves, 1997, p. 125).

 

1.1.1 Actio fiduciae

 

Em meados do século II a.C., o pretor passou a conceder uma actio fiduciae ao fiduciante, cujo escopo era, indiretamente, lhe restituir a coisa. A ação era in personam, reipersecutória e infamante (Marrone, 2006, p. 450) e a fórmula correspondente, que constava no edito do pretor, foi reconstituída por Otto Lenel (1883, p. 233):

 

Si paret Aulum Agerium Numerio Negidio fundum quod de agitur ob pecuniam debitam fiduciae causa mancipio dedisse eamque pecuniam solutam eove nomine satisfactum esse aut per Numerium Negidium stetisse quo minus solveretur eumque fundum redditum non esse negotiumve ita actum non esse, ut inter bonos bene agier oportet et sine fraudatione, quanti ea res erit, tantam pecuniam Numerium Negidium Aulo Agerio condemnato, si non paret, absolvitur (Caso fique provado que Aulo Agério, a título de fidúcia, alienou a Numério Negídio o pleno domínio do terreno acerca do qual se litiga por causa de uma dívida de valor, e que a mesma dívida de valor foi adimplida <por ele> ou em seu nome ou que por Numério Negídio foi estabelecido que fosse adimplida por menos, e que esse terreno não foi restituído ou que o negócio não foi realizado tal como se deve proceder corretamente e sem fraude entre pessoas honestas, condena Numério Negídio a pagar a Aulo Agério tanto quanto valer a coisa; caso não fique provado, absolve-o).

 

 De acordo com essa fórmula, o juiz deve avaliar a conduta do réu, isto é, do fiduciário, de modo a determinar se o seu comportamento se ajusta ao critério de “proceder corretamente e sem fraude entre pessoas honestas”. É a referência à ausência de fraude (“...sine fraudatione...”) que alguns interpretam como indicador de que a ação era de boa-fé (Marrone, 2006, p. 450), embora essa opinião seja disputada (D’Ors, 2004, p. 555). De outra parte, percebe-se que o Judex não podia determinar a restituição da coisa ao devedor, mesmo após ter pagado a dívida, o que sempre constituiu um dos principais entraves da fiducia romana (Moreira Alves, 1996, p. 351).

Não é difícil perceber que, na fiducia com escopo de garantia, a natureza do compromisso de restituição da coisa colide, de fato, com a faculdade que o proprietário tem de dispor plenamente da coisa fiduciada, pois o dono fica obrigado a restituir a mesma coisa diante do pagamento do débito objeto da garantia. Para superar essa contradição, era comum que as partes estabelecessem um pacto em virtude do qual o fiduciante (devedor) que não pagasse ao fiduciário (credor) a dívida na data avençada somente poderia reclamar em juízo o superfluum (D’Ors, 2004, p. 557), isto é, o valor excedente do preço obtido por meio da venda da res fiduciae data (Talamanca, 1990, p. 478-479).

Nem as Institutas de Gaio, tampouco as de Justiniano incluem a fiducia entre os contratos reais, muito embora, ao que tudo indica, o contrato de fiducia tenha servido como modelo para os demais contratos reais (D’Ors, 2004, p. 550):

 

Gai. 4, 62: Sunt autem bonae fidei iudicia haec: ex empto uendito, locato conducto, negotiorum gestorum, mandati, depositi, fiduciae, pro socio, tutelae, rei uxoriae” (Por outro lado, estes são os juízos de boa-fé: os <derivados> da compra e venda, da locação, de gestão de negócios, de mandato, de fidúcia, em favor do sócio, da tutela e do patrimônio da mulher).

 

Gaio, conforme se vê no fragmento há pouco reproduzido, menciona o instituto e o inclui entre os Judicia bonae fidae, que eram as actiones in personam delimitadas e posteriormente fundadas na bona fides que conferiam ao Judex amplo poder discricionário, podendo condenar o réu ao pagamento de certas prestações acessórias, tais como juros moratórios e compensatórios, bem como ao cumprimento do pacta adiecta (Talamanca, 1990, p. 313-314).

Apesar dessa omissão das fontes, a maioria dos autores classifica a fiducia como contrato real, não impedindo que alguns romanistas cheguem a negar que os latinos considerassem a fiducia um contrato (contractus) e defendam  a ideia de que se trataria de um pacto (pactum fiduciae) aposto à mancipatio ou à in Jure cessio (Moreira Alves, 1997, p. 120).

Sustenta-se, inclusive, que a sua ausência das Institutas de Gaio, decorre do fato de que a fiducia, no final do Período Clássico, era utilizada, principalmente, com escopo de garantia real. As Institutas de Justiniano, por outro lado, não a teriam incluído entre os contratos reais, porque, no Período Pós-Clássico, ela já teria caído em desuso e sido gradualmente substituída pelos contratos de comodato, depósito e penhor, institutos mais elásticos e, portanto, mais aptos a atingir as principais finalidades da fiducia (Guarino, 2001, p. 861-862). De fato, a eliminação da mancipatio e da in Jure cessio, como modos derivados da aquisição da propriedade, teriam resultado na abolição da fiducia por via indireta (D’Ors, 2004, p. 556).

Com base no entendimento de que certos fragmentos relativos à actio pignoraticia foram interpolados para substituir as referências à fidúcia (Ulp. 30 ad ed., D. 13, 7, 22 pr.-2 e Ulp. 30 ad ed., D. 13, 7, 24, 1, para a actio fiduciae directa, e Ulp. 30 ad ed., D. 13, 7, 22, 2-4 e Ulp. 30 ad ed., D. 13, 7, 24 para a actio fiduciae contraria), entende-se que a actio fiduciae tenha existido nas modalidades directa (para exigir a restituição da coisa por parte do devedor fiduciante) e contraria (para o ressarcimento de despesas e danos sofridos pelo credor fiduciário), conforme explica Otto Lenel (1883, p. 232).

Há mesmo quem afirme a existência de uma ação no sistema das legis actiones para exigir a restituição da coisa pelo devedor, denominada legis actio per arbitri postulationem (D’Ors, 2004, p. 555), se bem que também é provável que a mera fides fosse suficiente para determinar a devolução no período pré-clássico (Marrone, 2006, p. 450).

 

1.2 Fiducia cum amico

 

Conforme relatam as Institutas de Gaio, a fiducia, no âmbito patrimonial, se desdobrava em mais uma vertente, a fiducia cum amico (Gai. 2, 60, supra). Se, de um lado, o objetivo da primeira modalidade (fiducia cum creditore) era constituir uma garantia real mediante a transferência ao credor da propriedade de um bem ao lado da constituição da obrigação de restituí-lo uma vez adimplida a obrigação, a finalidade da segunda figura era possibilitar que o fiduciante colocasse uma coisa, mediante a transferência da sua propriedade, em segurança junto a um amigo, comprometendo-se o fiduciário a devolvê-la quando solicitado pelo fiduciante (Moreira Alves, 1997, p. 126-127).

Como será visto, o Direito brasileiro desenvolveu a propriedade fiduciária nos moldes da fiducia cum creditore. O common law, por outro lado, desenvolveu autonomamente o use e depois o trust como institutos em muitos aspectos análogos à fiducia cum amico do direito romano.

 

2 O TRUST DO DIREITO INGLÊS

 

Pode-se dizer que o conceito de fiducia é hodiernamente utilizado, no sentido mais amplo do termo, para designar dois fenômenos jurídicos distintos. De um lado, existe a propriedade fiduciária, pela qual o direito de gozar e dispor de um determinado bem pertence ao proprietário, porém não para satisfazer os próprios interesses, e sim os de um terceiro. De outro, há o contrato (negócio) fiduciário, pelo qual o fiduciante transfere a propriedade de um bem ao fiduciário mediante a celebração de um pactum fiduciae, obrigando-se este último a devolver a propriedade desse bem ao fiduciante, uma vez atingido o fim proposto. Nos sistemas de base romanista, não há, entre esses dois fenômenos, um nexo de causalidade, pois a propriedade fiduciária não nasce, necessariamente, de um contrato fiduciário (GALGANO, 1999, p. 179).

Em sentido técnico, só se pode falar em propriedade fiduciária quando o vínculo que determina que o bem seja administrado em benefício de um terceiro é de natureza real, o que ocorre no caso do trust da Common law. No Direito inglês, o trust é um instituto da real property law. Nos sistemas de Direito Civil, esse campo corresponde à categoria dos direitos reais. A property law foi fortemente influenciada pela cultura jurídica medieval e dela provêm suas categorias e conceitos fundamentais, donde resulta a “diversa tessitura o grammatica” que a caracteriza (Moccia, 2004, p. 38).

Cabe ressaltar que a propriedade fiduciária prevista no Código Civil brasileiro não se harmoniza ao critério técnico apontado há pouco, na medida em que sua principal função é servir de objeto em contrato fiduciário com escopo de garantia, e não a de fornecer um vínculo jurídico de natureza real aplicável à administração de patrimônio alheio, como ocorre no caso do trust de origem inglesa.

 

2.1 Os uses da Inglaterra medieval

 

O trust inglês remete a algumas situações que, com o passar do tempo, foram reconhecidas como válidas pelo ordenamento jurídico da Common law. Passou a ser comum que um feudal tenant ficasse pessoalmente obrigado, por força de um acordo formal ou mesmo da boa-fé, a transferir o chamado beneficial enjoyment de terras que lhe pertencessem (Baker, 2002, p. 248).

As situações que podiam ensejar esse tipo de relação eram bastante diversas. As fontes relatam casos de soldados que partiam rumo às Cruzadas e deixavam suas terras ao irmão. No ato de alienação, entretanto, o concedente pedia que o patrimônio alienado revertesse em benefício dos próprios descendentes, ou da própria mulher e a sua irmã. Vários casos dessa índole são relatados em The Notebook of Bracton, uma coletânea jurisprudencial com base na qual Henry de Bracton teria modelado a obra De legibus et consuetudinibus angliae, de acordo com a tradição jurídica do common law (Maitland, 1887, passim).

De modo similar, muitas doações à Igreja – tais como aquelas em favor da ordem dos franciscanos – frequentemente se destinavam a uma determinada finalidade (a manutenção de uma biblioteca ou de um hospital), em cujo caso a instituição religiosa devia assegurar que o patrimônio em questão se destinasse ao fim determinado pelo doador (Pollock e Maitland, 1899, p. 231 e Tarello, 1957, p. 520-523).

No linguajar técnico da época, o tenant – figura análoga ao fiduciário no Direito Romano – detinha as terras “ad commodum” ou “ad opus of the beneficiary, embora mantivesse a titularidade formal (nominal ownership) e tivesse a obrigação de honrar a relação de confiança que caracterizava a transferência (Baker, 2002, p. 248). A própria locução “ad opus (meum, tuum, suum)” é de origem feudal e pode ser encontrada em diversas fontes europeias medievais (Zeumer, 1886, p. 115; Pollock e Maitland, 1899, p. 28 e 233-239; MAITLAND, 1910, p. 24; Kemble, 1847, p. 66-67 e 69). Existem, também, análises das principais fórmulas que determinavam as relações de natureza real (PLUCKNETT, 1956, p. 576).

Normalmente, o principal objetivo dessa transação era facilitar a transferência feudal (feoffment) de um bem imóvel sob certas condições. Em termos medievais, o feoffamentum era um negócio gratuito equiparável, do ponto de vista formal, a uma doação, conforme explica Charles du Fresne Du Cange (1678, t. 3, col. 479b): “Datio ad feodum, donatio feudi, sæpe simplex donatio”. O fiduciante (feoffor) podia outorgar em confiança (grant on trust) sua terra a um grupo de fiduciários (feoffees) para que estes a transferissem, após a sua morte, a quem ele tivesse indicado. Podia-se, com efeito, escolher o sucessor (o que não era possível pelo Direito Feudal inglês), bem como evitar os pesados ônus que incidiam sobre a transmissão causa mortis, de acordo com o sistema das tenências (tenures).

O instituto resultante da operação há pouco descrita denominou-se use. Deve-se, porém, atentar para o fato de que o termo, em princípio, não está etimologicamente relacionado ao verbo latino utor, uteris, uti, usus sum (usar, utilizar ou fazer uso de algo para algum propósito), nem ao substantivo usus, us, que significa usar alguma coisa cujo domínio pertence a outrem (Glare, 1982, p. 2119-2120 e p. 2111-2112; PLUCKNETT, 1956, p. 575-576; Pollock e Maitland, 1899, p. 228-229; Baker, 2002, p. 250; Milsom, 1981, p. 200). O beneficiário, por sua vez, passou a ser denominado cestui que use, cujo termo provém da frase “cestui a que use le feoffment fuit fait”, [=“aquele em favor de quem o use foi feito”] (Bean, 1968, p. 104).

O use foi uma situação de fato – de forma análoga à possessio romana e, em certos aspectos, ao nudum pactum fiduciae – que adquiriu reconhecimento e proteção jurídicos ao longo do tempo (PLUCKNETT, 1956, p. 579 e Baker, 2002, p. 250) por meio da atividade jurisdicional do Chancellor, que paulatinamente transformou o interesse do beneficiary em uma espécie de “direito real” (Baker, 2002, p. 251) projetado para evitar que os fiduciários (feoffees) pudessem burlar ou interpretar equivocadamente a vontade do fiduciante (feoffor).

Foi esse o motivo pelo qual o Tribunal da Chancelaria (Court of Chancery) passou a dotar de força judicial (enforcement) as instruções do fiduciante (feoffor), conforme se pode apreciar no caso Prioress of Thetford v Wychyngham, de 1426, aproximadamente (BAKER e MILSOM, 2010, p. 105-106). A consolidação da posição do beneficiary ocorreu com a promulgação do Feoffments to Uses Act 1483 [=Stat. 1 Ric. III (1483), c. 1], que considerava válida a alienação feita por um cestui que use independentemente dos feoffees (Hanbury, 1962, p. 98-101 e Baker, 2002, p. 251-252).

 

2.2  O surgimento do trust

 

A denominação trust, por sua vez, surgiu como resultado indireto da promulgação do Statute of Uses 1536 [=Stat. 27 Hen. VIII (1536), c. 10] por parte de Henrique VIII, que “consolidou” os uses em vigor na época e assim eliminou a maior parte deles. Com a origem nas situações jurídicas que escapavam ao âmbito de aplicação do referido statute que o trust, já em sentido moderno, se desenvolveu (Moffat, 2009, p. 42).

Uma dessas situações passou a ser conhecida peloa expressão “use upon a use(ou “double use”), cuja fórmula, de modo genérico, era “to A and his heirs unto and to the use of B (or A) and his heirs in trust nevertheless for C”, ou seja, “para A e seus herdeiros em benefício de B (ou A) e os seus herdeiros; em confiança, no entanto, para C” (Baker, 2002, p. 291). De modo simplificado, eram dois uses sucessivos, cuja finalidade era evitar que o Statute of Uses 1536 incidisse sobre o segundo use. A fim de diferenciá-lo do primeiro, o segundo use passou a ser chamado “trust” e foi com essa configuração que a Court of Chancery lhe concedeu uma tutela cada vez mais robusta.

A elaboração jurisprudencial do estatuto do beneficiary inclui vários leading cases cuja análise deixa claro que, inicialmente, os trusts estavam praticamente à margem da legalidade, e que somente a jurisdição do Chancellor, competente para julgar demandas que envolvessem a boa-fé das partes, poderia resolvê-las adequadamente. Nesse sentido, são memoráveis Tyrrel’s Case, de1557, e Bartie v Herenden, de 1560.

Em razão desse desenvolvimento, e apesar das várias descrições que a doutrina oferece acerca do instituto (Keeton, 1947, p. 1-4), pode-se dizer que o trust é a relação jurídica pela qual um bem ou conjunto de bens é administrado por um titular formal (denominado trustee) em benefício de um terceiro (denominado cestui que trust ou beneficiary) também titular de uma pretensão real sobre o mesmo bem ou conjunto de bens (Malaguti, 1999, p. 183), ou mesmo para a consecução de uma determinada finalidade.

Hoje, considera-se que o trust é uma das principais e mais duradouras criações da equity inglesa, o que faz ressoar as palavras de Maitland (1910, p. 23): “Of all the exploits of Equity the largest and the most important is the invention and development of the trust”.

Desde uma perspectiva comparatística, contudo, o fenômeno denominado dual ownership, pelo qual dois sujeitos distintos são (supostamente) titulares de um (aparente) direito de “propriedade” sobre os mesmos trust assets, é talvez um dos principais obstáculos à compreensão desse instituto nos sistemas de base romanística.

O contexto histórico em que se desenvolveu o trust e as particularidades jurisprudenciais que moldaram suas regras resultaram em uma tendência à crescente proteção das pretensões do beneficiary (MAITLAND, 1910, p. 23). Hoje, o patrimônio pessoal do trustee é juridicamente desvinculado dos bens afetados pelo trust. Não é por outro motivo que credores pessoais do trustee não podem lançar mão dos bens sujeitos ao trust, a fim de satisfazer eventuais direitos creditórios. Por outro lado, eventuais credores do beneficiary (que não têm a titularidade formal desse patrimônio) podem fazê-lo.

Pelo mesmo motivo, alienações de trust assets feitas pelo trustee revertem em favor do beneficiary (por meio de um mecanismo similar ao da sub-rogação real) e alienações não onerosas ou de má-fé resultam em uma espécie de sub-rogação pessoal do adquirente na posição de trustee (Malaguti, 1999, p. 187). Percebe-se, assim, que o complexo de bens e direitos que integra o objeto do trust é dotado de autonomia, muito embora não seja de um ente dotado de personalidade jurídica.

 

3        A PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA NO BRASIL

 

3.1 A propriedade resolúvel

 

A discussão acerca da propriedade fiduciária (similar em alguns pontos ao trust da Common law) no Direito Civil brasileiro implica, necessariamente, um excurso pelo âmbito da propriedade resolúvel. Isso porque aquela é um tipo específico desta, que se restringe às coisas móveis e infungíveis entregues pelo devedor ao credor com escopo de garantia, conforme estabelece o art. 1.361, caput do Código Civil brasileiro de 2002, segundo o qual se considera fiduciária a propriedade resolúvel de coisa móvel infungível que o devedor, com escopo de garantia, transfere ao credor.

Para Clóvis Bevilaqua (1930, p. 190), a propriedade resolúvel ou revogável “é a que, no próprio título da sua constituição, encerra o princípio que a tem de extinguir, realizada a condição resolutória, ou advindo o termo extintivo, seja por força de declaração da vontade, seja por determinação da lei”.

O instituto, assim, relaciona-se, no campo das obrigações, ao negócio pelo qual se subordina a aquisição da propriedade de um bem a uma cláusula resolutória, ficando desfeito o negócio em função do implemento da condição ou do termo (Barros Monteiro e Dabus Maluf, 2011, p. 334).

É o que ocorre no caso da compra e venda subordinada ao pacto de melhor comprador, que, já no Direito Romano, era uma espécie de contrato de compra e venda cujos efeitos ficavam subordinados ao eventual oferecimento de uma melhor oferta e sua aceitação pelo vendedor, conforme explica Queiroz de Moraes (2010, p. 31), em obra que trata exaustivamente do tema, especialmente no que diz respeito à configuração da in diem addictio no Direito Romano e nas principais codificações civilísticas modernas.

 

 

 

3.1.1 Hipóteses

 

Existem várias hipóteses de propriedade resolúvel no Direito pátrio, a qual pode advir de negócio jurídico a título gratuito ou oneroso, inter vivos ou causa mortis, desde que esteja subordinado a evento futuro, certo ou incerto (Diniz, 2010, p. 337-339; Barros Monteiro e Dabus Maluf, 2011, p. 334-335):

(i) o contrato de compra e venda com pacto de retrovenda, pelo qual o vendedor se reserva o direito de readquirir a coisa dentro do prazo máximo decadencial de três anos, mediante devolução do preço e de eventuais despesas contratuais, inclusive as que, durante o período de resgate, se efetuaram com a sua autorização escrita, ou para a realização de benfeitorias necessárias, conforme previsto no art. 505 do Código Civil de 2002;

(ii) a venda a contento sob condição suspensiva, estipulando-se o desfazimento da venda se a coisa não agradar o adquirente e reputando-se perfeita apenas quando o adquirente manifestar o seu agrado, conforme disposto no art. 509 do Código Civil de 2002;

(iii) a venda feita pelo condômino da sua quota ideal a terceiro estranho ao condomínio sem observar o direito de preferência dos demais condôminos, desfazendo-se a venda em caso de exercício da preferência no prazo de 180 dias, na medida em que o art. 504 do Código Civil de 2002 proíbe que um condômino em coisa indivisível venda a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto e concede a prerrogativa ao condômino, a quem não se der conhecimento da venda, de depositar o preço e haver para si a parte vendida a estranhos, desde que assim o requeira no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência;

(iv) a doação com cláusula de reversão ao patrimônio do doador, caso este sobreviva o donatário, em cujo caso o evento determinante da revogação é a morte do doador (Gomes, 2008, p. 272);

(v) a substituição fideicomissária, em que o testador dispõe em testamento que a sua herança passe a determinada pessoa, denominada fiduciário, que ficará obrigada a transmiti-la a outra, o fideicomissário, uma vez verificado o implemento da condição, conforme dispõe o art. 1.953 do Código Civil brasileiro de 2002, segundo o qual o fiduciário tem a propriedade da herança ou legado, mas restrita e resolúvel;

(vi) a alienação fiduciária em garantia, cuja exposição segue.

 

3.1.2 Natureza

 

Quanto à sua natureza jurídica, divergem os autores. De um lado, sustenta-se que se trate de domínio de natureza especial (Rodrigues Pereira, 1943, p. 112-115 e Gomes, 2008, p. 267-268). De outro, considera-se que seja uma propriedade comum, condicionada, tão somente, pela modalidade do ato jurídico empregado (Lacerda de Almeida, 1908, p. 76-78 e Sá Pereira, 1929, p. 447-452).

Acompanhando a opinião de Cunha Gonçalves (1979, p. 67-68), parece que se trata, efetivamente, de uma propriedade especial (sui generis), na medida em que não carrega um dos traços mais característicos – apesar de dispensável – do direito de propriedade, qual seja: a perpetuidade do título.

 

3.1.3 Efeitos

 

A cláusula resolutória do domínio opera seus efeitos ex tunc, ou seja, todos os negócios praticados e direitos reais concedidos medio tempore pelo proprietário durante a vigência da propriedade resolúvel subsistem apenas enquanto não se verifica a condição ou termo, resolvendo-se ex causa necessária (Barros Monteiro e Dabus Maluf, 2011, p. 336-337) ante a ocorrência do evento futuro previsto no princípio resolutivo. Daí que o proprietário em cujo favor se opera a resolução possa reivindicar a coisa de quem quer a possua ou detenha, conforme estabelece o Art. 1.359 do Código Civil de 2002, que, além de considerar resolvidos os direitos reais concedidos na pendência da condição ou pelo advento do termo, faculta ao proprietário, em cujo favor se operou a resolução, a possibilidade de reivindicar a coisa do poder de quem a possua ou detenha.

Diferente é a situação quando a causa da resolução for superveniente, pois, neste caso, os efeitos da resolução operam-se ex nunc, sendo plenamente válidos os negócios realizados ou direitos reais concedidos a terceiros pelo proprietário até a resolução da propriedade (Diniz, 2010, p. 341). É o caso da doação revogada por uma das causas de ingratidão do donatário contra o doador, previstas no art. 557 do Código Civil brasileiro de 2002, perdendo aquele a propriedade sobre a coisa. Logicamente, essa revogação não atinge nem prejudica direitos adquiridos por terceiros durante a vigência da propriedade, conforme estabelece o Art. 563 do Código Civil brasileiro de 2002.

 

3.2 Instrumentos legislativos de positivação da propriedade fiduciária

 

A propriedade fiduciária e sua figura correlata, a alienação fiduciária em garantia, ingressaram no ordenamento jurídico brasileiro por meio artigo 66 da Lei 4.728, de 14 de julho de 1965 (Lei de Mercado de Capitais). Convém registrar o fato de que há quem tenha preferido inserir a alienação fiduciária dentro do negócio fiduciário, dessa forma vislumbrando um conjunto de afinidades e distinções entre aquela e o negócio simulado, o negócio indireto, a venda com reserva de domínio e a retrovenda (Gomes, 1972, p. 23-32)

O dispositivo regulamentava a alienação fiduciária em garantia de bem móvel, estabelecendo a obrigatoriedade de venda da coisa alienada em caso de inadimplemento e ficando vedado o pacto comissório, nos seguintes termos:

 

Nas obrigações garantidas por alienação fiduciária de bem móvel, o credor tem o domínio da coisa alienada, até a liquidação da dívida garantida. [...] § 2º O instrumento de alienação fiduciária transfere o domínio da coisa alienada, independentemente da sua tradição, continuando o devedor a possuí-la em nome do adquirente, segundo as condições do contrato, e com as responsabilidades de depositário. [...] § 5º No caso de inadimplemento da obrigação garantida, o proprietário pode vender a coisa a terceiros e aplicar o preço da venda no pagamento do seu crédito e das despesas decorrentes da cobrança, entregando ao devedor o saldo porventura apurado, se houver. § 6º Se o preço da venda não bastar para pagar o crédito do proprietário fiduciário e despesas, na forma do parágrafo anterior, o devedor continuará pessoalmente obrigado a pagar o saldo devedor apurado. § 7º É nula a cláusula que autorize o proprietário fiduciário a ficar com a coisa alienada em garantia, se a dívida não fôr paga no seu vencimento. § 8º O proprietário fiduciário, ou aquêle que comprar a coisa, poderá reivindicá-la do devedor ou de terceiros, no caso do § 5° dêste artigo. [...]

 

Posteriormente, o texto do artigo foi modificado pelo Decreto-Lei nº 911, de 1º de outubro de 1969, que fez referência explícita ao seu uso para garantir financiamento de veículo automotor, nos seguintes termos:

 

A alienação fiduciária em garantia transfere ao credor o domínio resolúvel e a posse indireta da coisa móvel alienada, independentemente da tradição efetiva do bem, tornando-se o alienante ou devedor em possuidor direto e depositário com tôdas as responsabilidades e encargos que lhe incumbem de acordo com a lei civil e penal. [...] § 10. A alienação fiduciária em garantia do veículo automotor, deverá, para fins probatórios, constar do certificado de Registro, a que se refere o artigo 52 do Código Nacional de Trânsito.

 

Além disso, corrigiu certas falhas e disciplinou o sistema de execução da garantia por busca e apreensão na Lei 4.728, de 1965 (Moreira Alves, 1973, p. 17-21). Já o artigo 66-B, introduzido pela Lei 10.931, de 2 de agosto de 2004 (Lei do Patrimônio de Afetação), passa a admitir a alienação fiduciária em garantia de coisa fungível, conforme segue:

 

[...] § 3 É admitida a alienação fiduciária de coisa fungível e a cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, bem como de títulos de crédito, hipóteses em que, salvo disposição em contrário, a posse direta e indireta do bem objeto da propriedade fiduciária ou do título representativo do direito ou do crédito é atribuída ao credor, que, em caso de inadimplemento ou mora da obrigação garantida, poderá vender a terceiros o bem objeto da propriedade fiduciária independente de leilão, hasta pública ou qualquer outra medida judicial ou extrajudicial, devendo aplicar o preço da venda no pagamento do seu crédito e das despesas decorrentes da realização da garantia, entregando ao devedor o saldo, se houver, acompanhado do demonstrativo da operação realizada.

 

Os artigos 1.361 a 1.368-A do Código Civil de 2002 revogaram as disposições do Decreto-Lei nº 911 de 1969 com eles incompatíveis, passando a regulamentar o direito material relativo à propriedade fiduciária de coisa móvel e infungível com escopo de garantia.

Convém notar, entretanto, que, de acordo com Maria Helena Diniz (2010, p. 602), as regras da propriedade fiduciária estabelecidas no Código Civil de 2002 têm aplicação subsidiária às normas especiais que regem o assunto, por força do disposto no art. 1.368-A do mesmo Código (incluído pela Lei 10.931 de 2004), no sentido de que “as demais espécies de propriedade fiduciária ou de titularidade fiduciária submetem-se à disciplina específica das respectivas leis especiais, somente se aplicando as disposições deste Código naquilo que não for incompatível com a legislação especial”.

Continuam em vigor os artigos 3º, 4º e 5º, do mesmo Decreto-Lei nº 911 de 1969, os quais tratam de matéria processual relativa à busca e apreensão. Por sua vez, a Lei 9.514, de 20 de novembro de 1997, regula a propriedade fiduciária de bens imóveis (Barros Monteiro e Dabus Maluf, 2011, p. 340), a qual, de acordo com o estipulado no art. 22 desse diploma, “é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel”.

As alterações trazidas pela Lei 10.931, de 2 de agosto de 2004, por sua vez, criaram o patrimônio de afetação nos seguintes termos do art. 31-A da Lei 4.591 de 16 de dezembro de 1964, segundo o qual a incorporação, a critério do incorporador,

 

[...] poderá ser submetida ao regime da afetação, pelo qual o terreno e as acessões objeto de incorporação imobiliária, bem como os demais bens e direitos a ela vinculados, manter-se-ão apartados do patrimônio do incorporador e constituirão patrimônio de afetação, destinado à consecução da incorporação correspondente e à entrega das unidades imobiliárias aos respectivos adquirentes.

 

A alienação fiduciária em garantia de aeronave é regulada pelos artigos 148 a 152 da Lei 7.565, de 19 de dezembro de 1986, aplicando-se subsidiariamente o Código Civil, no que couber. Nesse caso, segundo dispõe o art. 148:

 

a alienação fiduciária em garantia transfere ao credor o domínio resolúvel e a posse indireta da aeronave ou de seus equipamentos, independentemente da respectiva tradição, tornando-se o devedor o possuidor direto e depositário com todas as responsabilidades e encargos que lhe incumbem de acordo com a lei civil e penal.

 

Vale lembrar que, no caso de embarcações, quaisquer direitos reais ou demais ônus devem ser registrados junto ao Tribunal Marítimo, sob pena de não valer contra terceiros, conforme disposto no artigo 12, caput da Lei 7.652, de 3 de fevereiro de 1988.

Finalmente, a Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), também trata da alienação fiduciária no seu artigo 53, declarando nula a cláusula que estabeleça a perda total das prestações em favor do credor na hipótese de resolução do contrato e retomada do bem por inadimplemento.

 

4 COMPARAÇÃO DA PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA COM O TRUST INGLÊS

 

O trust de origem inglesa tem, por motivos históricos, um alcance muito mais amplo do que a propriedade fiduciária no Brasil. Daí a dificuldade em sistematizar o instituto e “aclimatá-lo” de acordo com os parâmetros da família dos direitos de base romanística (Manhães Martins, 2010, p. 245).

Uma das principais distinções é o sistema processual de proteção que a Common law oferece àquele em favor de quem o trust é constituído (beneficiary), especialmente mediante a fiscalização da atividade do trustee por meio da atuação dos tribunais (Chalhub, 2000, p. 33). Já a propriedade fiduciária não se caracteriza pela fiscalização da atividade do fiduciário, preferindo impor um dever de geral de boa conduta em benefício do fiduciante a ser mensurado de acordo com a finalidade de cada negócio.

É assim que as várias espécies de propriedade fiduciária estabelecem determinados deveres laterais de conduta, de modo a resguardar o fiduciante. A Lei 8.668, de 25 de junho de 1993 (Fundos de Investimento Imobiliário), por exemplo, estabelece no seu art. 8º:

 

O fiduciário administrará os bens adquiridos em fidúcia e deles disporá na forma e para os fins estabelecidos no regulamento do fundo ou em assembléia de quotistas, respondendo em caso de má gestão, gestão temerária, conflito de interesses, descumprimento do regulamento do fundo ou de determinação da assembleia de quotistas.

 

Também há deveres de boa-fé inscritos no art. 15 (dever de informação) e no art. 12 (dever de diligência) da mesma lei. O mesmo se pode dizer na Lei 4.591, de 16 de dezembro de 1964 (Lei de Incorporação Imobiliária), que, no art. 31-D, estabelece uma série de deveres gerais e de informação, diligência e cuidado.

O trust parece descansar na noção de desdobramento da propriedade sobre uma mesma coisa (Moreira Alves, 1973, p. 34-35), ou em uma espécie de dicotomia do direito de propriedade (Chalhub, 2000, p. 34-35), fenômeno típico do Direito inglês que decorre da sua forte vinculação com suas raízes medievais.

De fato, todo o seu sistema de direitos reais, de certa forma, ainda adota um vocabulário e terminologia próprios do Medievo (Moccia, 2004, p. 38).

No trust intervêm, frequentemente, três pessoas (o settlor, o trustee e o beneficiary), em muitos casos, sem que haja um acordo de vontades. A propriedade fiduciária, por sua vez, pressupõe sempre duas partes: o fiduciante e o fiduciário, e o acordo de vontades baseado na confiança (Buzaid, 1969, p. 27).

Apesar disso, podem ser identificados certos valores comuns entre a propriedade fiduciária e o trust. Assim, o elemento fiduciário é comum aos dois institutos, na medida em que tanto na raiz do trust quanto no da propriedade fiduciária existe um ato que se funda, seja em maior ou menor grau, na fidúcia, isto é, na confiança depositada em alguém (Manhães Martins, 2010, p. 266-268).

Foi Pontes de Miranda (1972, p. 340) quem bem percebeu esse valor ao afirmar que qualquer outorga de direitos reais ou mesmo de posse pode encerrar um elemento fiduciário, a exemplo do que ocorre no Direito inglês:

 

Todos os direitos reais e o direito de posse podem ser o elemento outorgativo do negócio fiduciário. Mais: o elemento outorgativo pode consistir em crédito ou em outro direito. Daí devemos evitar a referência a direito real. O que importa é a outorga da titularidade, sem que se haja de pensar que só no direito inglês possa haver negócio jurídico fiduciário, que tenha por objeto equitable interest.

 

O segundo valor em comum pode ser identificado na busca de ambos os institutos por maior segurança nas transações jurídicas, cuja manifestação interna se encontra na autonomia do patrimônio afetado pela alienação relativa a riscos externos à relação jurídica, e a externa na limitação do impacto das relações do credor relativamente ao conjunto de bens sujeitos à propriedade fiduciária (Manhães Martins, 2010, p. 268-273).

Cabe notar que o sistema da Common law, por meio da equity, tem desenvolvido o instituto do trust de tal forma como ele hoje possa abarcar tanto negócios de garantia, como ocorre com o trust receipt (Moreira Alves, 1973, p. 31-35), quanto fins de administração patrimonial, a exemplo do que sucede com as modalidades que inspiraram a adoção de trust-like devices (Johnston, 1998, p. 45-56) em vários sistemas de base romanística. No primeiro caso, o trust se aproxima da fiducia cum creditore, e, portanto, cumpre uma função similar à propriedade fiduciária do Direito Civil. Já na segunda hipótese, o trust encontra uma aplicação muito mais ampla do que a da propriedade fiduciária, avizinhando-se à antiga fiducia cum amico (romana).

O interesse pelo estudo do trust em sistemas jurídicos de base romanística, bem como as iniciativas legislativas para implantá-lo em ordenamentos que pertencem à tradição jurídica civilística, sugerem a necessidade de estudos mais aprofundados sobre o tema. Alguns países da tradição civilista adotaram alguma forma de trust em virtude da sua aderência à Convenção da Haia de 1985 sobre o Direito Aplicável aos Trusts, tais como Itália (l. 16 ott. 1989 n. 364), Luxemburgo (Loi du 27 juillet 2003), Malta (Recognition of Trust Act 1994), Mônaco (Lei n. 1.216, de 7 de junho de 1999, que alterou a Lei n. 214 de 27 de fevereiro de 1936), Holanda (Convention on the Law Applicable to Trusts and on their Recognition, de 1º de julho de 1985) e Suíça (Decreto Federal de 20 de dezembro de 2006, que modificou a Lei Federal de 18 de dezembro de 1987).

Por outro lado, alguns países incorporaram alguma forma de trust anteriormente por diversas razões, como é o caso, por exemplo, de Liechtenstein (Trust EnterpriseTreuunternehmen ou Geschäftstreuhand –, previsto no art. 932a, §§ 1º e ss da Lei das Pessoas e Sociedades (Personen- und Gesellschaftsrecht) de 10 de abril de 1926), México (Ley General de Títulos y Operaciones de Crédito, de 27 de agosto de 1932, artigos 381-407) e Panamá (Ley n. 1 de 5 de enero de 1984), o estado da Louisiana, nos Estados Unidos (Louisiana Trust Code, previsto nos §§ 1.721-2.252 do Código Civil da Louisiana de 1808, acrescentados por via legislativa em 1964), e o Québec, no Canadá (Code civil du Québec de 1994, art. 1.260 e ss).

No Brasil, o trust já foi objeto de vários estudos e houve, inclusive, tentativas (infrutíferas) de incorporá-lo ao ordenamento jurídico positivo nacional, como foi o caso do Projeto de Código das Obrigações de 1965.

É nesse âmbito que o estudo do trust e dos seus elementos constitutivos – especialmente aqueles desenvolvidos pela equity e as regras relativas à boa-fé das partes – pode render bons resultados, especialmente mediante o fornecimento de critérios para estremar – e melhor estruturar – figuras como o dever de confiança e a boa-fé (objetiva e subjetiva).

Assim, por exemplo, os resultados do inovador estudo realizado por Patrícia Cândido Alves Ferreira (2015, p. 83-107) acerca do princípio da confiança e sua relação com os contratos de saúde suplementar poderiam ser comparados com um estudo sobre trusts que revelasse quais os requisitos adotados na cultura jurídica do common law para responsabilizar o trustee em casos de procedimento inadequado em relação ao objeto do trust.

 

CONCLUSÃO

 

A propriedade fiduciária encontra origens na antiga fiducia romana, que se dividia em fiducia cum amico e fiducia cum creditore. Ambas as modalidades eram constituídas mediante mancipatio ou in iure cessio, porém somente a segunda se aproxima da propriedade fiduciária no sentido moderno, na medida em que era um instrumento de garantia pelo qual o credor fiduciário adquiria a propriedade de um bem como garantia até o pagamento da dívida.

A actio fiduciae era o meio apropriado para exigir a restituição da coisa, porém exprimia o problema de ser uma actio in personam, motivo pelo qual o devedor não poderia desfazer as alienações feitas pelo credor fiduciário enquanto este fosse o dono. A fiducia foi efetivamente extinta com a abolição da mancipatio e da in iure cessio, como modos derivados da aquisição da propriedade.

O trust inglês nasce com o use, que consistia na praxe medieval de deixar um bem imóvel a alguém em confiança para o benefício de um terceiro. Inicialmente, essa relação não era protegida pelos tribunais reais, mas, com o tempo a Court of Chancery, mediante a atividade jurisdicional do Chancellor, passou a tutelar a pretensão do beneficiário dessa outorga, elevando-a à categoria de um verdadeiro direito real.

O trust surgiu como consequência indireta da promulgação do Statute of Uses 1536, dado que, em sua maior parte, os uses até então existentes foram eliminados e a legislação somente não incidia em poucas hipóteses. Uma delas era o use upon a use, em que somente o segundo use era considerado válido. O segundo use passou a ser denominado trust e constitui a base do instituto na sua feição moderna.

O trust pode ser entendido, de modo simplificado, como a relação jurídica pela qual certo patrimônio é administrado por um titular formal (trustee) em benefício de um terceiro (beneficiary) ou de um determinado fim, que também é titular de direitos reais sobre o mesmo patrimônio e recebe uma proteção jurídica especial.

Ao se comparar a propriedade fiduciária e o trust, é possível perceber que, apesar das diferenças sistêmicas que separam os institutos, há uma comunhão de valores, principalmente os de confiança e segurança, com suporte nos quais se pode constituir um esforço de harmonização entre os institutos.

 

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* Bacharel, mestre e doutorando pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (FDUSP). Professor de Direito Civil na Universidade Anhembi Morumbi (UAMSP). Professor de Direito e de Relações Internacionais nas Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU). Professor Convidado do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Direito Notarial e Registral da Escola Paulista de Direito (EPD). E-mail: [email protected].

Data de recebimento do artigo: 10/01/2016 – Data de avaliação: 26/01/2016 e 03/02/2016.