LIMITAÇÃO À INDENIZAÇÃO MATERIAL POR DESVIO DE BAGAGEM EM TRANSPORTE AÉREO INTERNACIONAL À LUZ DA EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Dennis Verbicaro

Universidade Federal do Pará (UFPA) e Centro Universitário do Pará (CESUPA), Pará

[email protected]

Carlos Gustavo Chada Chaves

Centro Universitário do Pará (CESUPA), Pará

[email protected]

Resumo: O presente artigo tem como objetivo traçar, sob a perspectiva da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, uma análise crítica do atual posicionamento firmado pelo Supremo Tribunal Federal quanto à limitação por danos materiais decorrentes de desvio de bagagens em viagens aéreas internacionais. A metodologia utilizada baseia-se no método dedutivo e em pesquisa bibliográfica e jurisprudencial. Conclui-se que a decisão adotada pelo Supremo Tribunal Federal não atende ao parâmetro da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, com especial atenção à isonomia, reparação integral e defesa do consumidor.

Palavras-chave: Limitação de danos materiais. Desvio de bagagem. Transporte aéreo internacional. Supremo Tribunal Federal. Eficácia horizontal dos direitos fundamentais.

Limitation on material indemnity for baggage deviation in international air transport in the light of the horizontal effectiveness of fundamental rights

Abstract: This article aims to draw, from the perspective of the horizontal effectiveness of fundamental rights, a critical analysis of the current position taken by the Supreme Federal Court regarding the limitation for material damage resulting from baggage diversion in international air travel. The methodology used is based on the deductive method and bibliographic and jurisprudential research. It concludes that the decision adopted by the Supreme Federal Court does not meet the parameter of the horizontal effectiveness of fundamental rights, with special attention to isonomy, integral reparation and consumer protection.

Keywords: Limitation of material damage. Baggage deviation. International air transport. Supremo Tribunal Federal. Horizontal effectiveness of fundamental rights.

Introdução

Os direitos fundamentais são uma construção histórica, isto é, resultado de várias concepções enraizadas em diversas civilizações, da conjugação de pensamentos filosóficos e jurídicos, de direito natural e ideias cristãs.

O ponto central comum seria a necessidade de estabelecimento de limitações e controles dos abusos praticados pelo Estado em face do indivíduo, assim como de um conjunto de valores necessários ao desenvolvimento da personalidade humana.

Na forma como foram concebidos no início do constitucionalismo, a partir de uma perspectiva subjetiva, os direitos fundamentais relacionavam-se às pretensões que o indivíduo poderia exigir do Estado, em decorrência dos direitos positivados na ordem jurídica. Eram, em outras palavras, apenas direitos subjetivos.

No constitucionalismo liberal, os direitos fundamentais subjetivos dos indivíduos eram exercidos contra o Estado, evitando-se que esse interviesse de forma indevida nas relações privadas, constituindo verdadeiro individualismo jurídico. Com o constitucionalismo social, as pretensões foram ampliadas para também abarcar demandas exigíveis através do Estado.

Com o pós-positivismo e a positivação de princípios que consagram os valores mais importantes de uma sociedade, os direitos fundamentais transcenderam a perspectiva de garantias de posições individuais e se tornaram valores objetivamente considerados que devem ser protegidos não só pelo Estado, mas por toda a sociedade.

A partir do momento em que se transformaram em valores objetivos (dimensão objetiva), ou seja, que passaram a ser respeitados e protegidos pelo Estado e por toda sociedade, bem como desde quando se percebeu que esses direitos também poderiam ser violados por particulares, surgiram teorias defendendo sua incidência nas relações privadas.

Assim, reconhece-se que a concepção dos direitos fundamentais, limitada à atuação estatal, não mais se coaduna com a sociedade hodierna. O poderio econômico e de influência de determinados particulares na formação e execução de políticas públicas em relação aos Estados se tornou tão grande, que hoje se defende a ideia de que a violação de direitos fundamentais pode ser também praticada por agentes privados.

Forçosa, portanto, é hoje a extensão de perspectiva quanto aos efeitos dos direitos fundamentais. De uma visão apenas verticalizada, ou seja, voltada à relação firmada entre Estado e indivíduo, passa-se agora a defesa de eficácia também às relações firmadas entre particulares.

E é neste contexto que se mostra relevante o estudo não somente das diversas teorias que se relacionam à eficácia dos direitos fundamentais às relações privadas, mas principalmente como a doutrina e jurisprudência nacionais vêm se posicionando sobre o tema.

O presente trabalho, assim, tem como objetivo analisar o atual posicionamento do Supremo Tribunal Federal de limitação às indenizações por danos materiais por desvio de bagagens em transporte aéreo internacional à luz da Teoria da Eficácia Horizontal Direta e Imediata dos Direitos Fundamentais às relações privadas. Questiona-se na presente pesquisa se a decisão da suprema corte brasileira coaduna-se com a interpretação dos direitos fundamentais a partir da matriz de sua eficácia horizontal.

Para tanto, o presente estudo será dividido da seguinte forma: na primeira seção será feita a abordagem conceitual dos direitos fundamentais; na segunda, analisar-se-ão as principais teorias que se referem à eficácia (ou não) dos direitos fundamentais às relações privadas e de que forma a doutrina e jurisprudência nacionais vêm se posicionando a respeito; na terceira seção, abordar-se-á a mudança do centro gravitacional do direito privado do Código Civil para a Constituição Federal brasileira de 1988; por fim, analisar-se-á a atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal quanto à limitação da indenização por desvio de bagagem em transporte aéreo internacional à luz da eficácia direta e imediata dos direitos fundamentais.

O artigo conclui que a tese adotada pelo Supremo Tribunal Federal, mormente no que diz respeito à aplicação da limitação de indenização prevista na Convenção de Varsóvia, não se coaduna com valores constitucionais forjados em direitos fundamentais e tidos como essenciais ao florescimento individual, mormente aqueles referentes à isonomia, reparação integral e defesa do consumidor.

1. Conceito de direitos fundamentais e sua abordagem atual

Conceituar direitos fundamentais não é tarefa fácil, existindo uma gama de perspectivas diferentes e, por vezes, passíveis de relativizar seu valor ou seu âmbito de abrangência. Não é incomum que a tentativa de definição acabe em um resultado não satisfatório e insuficiente para traduzir a abrangência e exatidão de seu conteúdo[1].

Em que pese a dificuldade, pelo menos em solo nacional, tem-se que a melhor definição está com Silva[2], para quem

Direitos fundamentais do homem constitui a expressão mais adequada a este estudo, porque, além de referir-se a princípios, que resumem a concepção do mundo e informam a ideologia política de cada ordenamento jurídico, é reservada para designar, no nível do direito positivo, aquelas prerrogativas e instituições que ele concretiza em garantias de uma convivência digna, livre e igual de todas as pessoas. No qualificativo fundamentais acha-se a indicação de que se trata de situações jurídicas sem as quais a pessoa humana não se realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo sobrevive; fundamentais do homem no sentido de que a todos, por igual, devem ser, não apenas formalmente reconhecidos, mas concreta e materialmente efetivados. Do homem, não corno o macho da espécie, mas no sentido de pessoa humana. Direitos fundamentais do homem significa direitos fundamentais da pessoa humana ou direitos fundamentais.

É costume se assinalar que os direitos fundamentais são aqueles voltados não só à proteção institucionalizada dos direitos da pessoa humana em face dos órgãos estatais, como também são normas para o estabelecimento de condições humanas de vida e desenvolvimento da personalidade humana[3]. Neste sentido, encontra-se previsto no art. VIII, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que “todo ser humano tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei”[4].

Tal maneira de ver a concepção dos direitos fundamentais, ou seja, a limitação apenas voltada aos atos do Estado em face do cidadão (eficácia vertical dos direitos fundamentais) encontra-se, pelo menos em solo nacional, ultrapassada. Não é crível pensar, diante de todo o avanço tecnológico e poderio financeiro e político de algumas instituições privadas nacionais e internacionais, que a violação de direitos apenas possa ser perpetrada pelo Estado.

Pelo contrário, é fenômeno mundial o “apequenamento” do Estado diante das grandes corporações e sistema financeiro, de maneira que as políticas públicas e produção de normas internas passam a ser cada vez mais afinadas aos interesses e influências externas e distanciadas dos desígnios da maioria da população.

Lembra Sarmento[5], no ponto, que os países que não conseguem adaptar o seu direito e suas normas internas aos interesses do grande sistema financeiro internacional são abruptamente abandonados, eis que os grandes grupos econômicos tendem a se deslocar para Estados que possuam uma linha mais afinada com as suas políticas de ganho de capital.

Neste sentido, mas voltando-se ao poder de influência do sistema financeiro às políticas públicas, defende Ianoni[6]:

B-P avalia que as linhas gerais das políticas monetária, cambial e fiscal, implementadas desde 1994, têm favorecido, especialmente, os rentistas, o setor financeiro e as multinacionais, exprimindo a captura do Estado e do BCB por esses grupos de interesse. Ele estima a captura rentista, medida em juros sobretaxados pagos pelo Estado, em 4% do PIB. No mesmo sentido, os economistas (Paulani e Teixeira, 2007) e (Cintra, 2005) afirmam que os rentistas constituem a base do poder político e econômico no Brasil atual.

A tudo isso alguns dados históricos devem ser mencionados.

A derrocada do socialismo acarretou a perda de uma visão ideológica concorrente ao capitalismo e abriu margem para que este se sentisse mais à vontade para “impor, agora sem concessões, o seu modelo econômico e social”[7], o qual, em essência, é absolutamente descomprometido com a igualdade e inclusão social, acentuando ainda mais a disparidade das diferenças nas relações privadas e possibilidade de abusos pelo agente mais forte economicamente.

Por outro lado, pelo menos desde o final da década de 60 e início da década de 70, a insuficiência de recursos estatais e os repetidos casos de corrupção trouxeram à tona ideias que defendiam a total incapacidade do modelo do Welfare State cumprir as promessas isonômicas a que se prestava.

O caráter eminentemente assistencialista do Estado e o severo ônus financeiro dificultaram a manutenção deste sistema por longo tempo. Ademais, o fato de que a democratização política criou um cenário inflacionário de certos pleitos até então difíceis de serem atendidos, mormente se associados ao envelhecimento e saída do mercado produtivo de uma quantidade importante de pessoas[8].

Assim, no final da década de 1960 e início da década seguinte, a figura do Estado provedor passou a ser questionado, haja vista que sozinho não conseguia manter as políticas sociais, tampouco, ante a força do modelo capitalista, mantinha uma economia socialmente equilibrada. O resultado foi o descolamento progressivo do equilíbrio entre os sistemas social e econômico em razão de uma primazia deste último. O festejado modelo do Welfare State ou Estado do Bem-Estar não se sustentou em face de uma economia com acelerado crescimento inflacionário, elevados índices de desemprego, alto endividamento privado e público. Essa equação tornou-se insustentável[9].

Consequência deste fenômeno é que as violações aos direitos fundamentais do homem praticados por particulares, seja ou não sob o compadrio estatal, passam a ser cada vez mais uma realidade universal. Os exemplos são os mais variados possíveis e ocorrem em qualquer lugar do planeta, agravando-se, todavia, em países emergentes, com menor expressão econômica e/ou que possuem democracias não totalmente consolidadas: poluição de rios por indústrias; cláusulas contratuais abusivas; cobrança de juros extorsivos por instituições financeiras com potencialidade de levar o mutuário ao superendividamento e exclusão social; colocação no mercado de consumo de produtos e serviços perigosos; publicidade abusiva; cláusula limitativa/excludente de responsabilidade civil; ingerência nas agências reguladoras influenciando negativamente em seu poder normativo, etc.

Tal cenário global de falência do Welfare State, e consequente diminuição da relevância estatal, de descompromisso dos cidadãos para com o exercício da liberdade positiva na efetiva ocupação dos espaços democráticos, de captura das decisões políticas mais importantes e do próprio sistema jurídico pelo grande capital etc., cria as condições ideais de vulnerabilidade dos direitos fundamentais, não apenas em relação as arbitrariedades estatais, mas também, e talvez, principalmente, decorrentes de violações perpetradas por particulares, mormente a pretexto do livre exercício da atividade econômica.

É neste sentido, tal como proposto no curso do presente estudo, que se torna basilar moldar os agentes privados, em especial aqueles de maior influência política e financeira, aos valores humanos mais caros, forjados constitucionalmente em direitos fundamentais.

Imperativa, portanto, a defesa da extensão da eficácia dos direitos fundamentais também em uma perspectiva horizontal:

Com ela, recupera-se a noção de solidariedade, revestindo-a de juridicidade. Sob esta ótica, os poderes econômicos privados têm não apenas o dever moral de garantir certas prestações sociais para as pessoas carentes com que se relacionarem, mas também, em certas situações, a obrigação jurídica de fazê-lo. Enfim, para minimizar os riscos e atenuar males do estado pós-social, é preciso reforçar a eficácia dos direitos fundamentais sobre as relações privadas, protegendo da barbárie e da opressão os excluídos, que já não contam com a proteção do welfare state[10].

Os fundamentos para a eficácia horizontal dos direitos fundamentais são os mais diversos e defendidos pela maioria da doutrina nacional.

Para Steinmetz[11], há um feixe de fundamentos constitucionais que justificam a eficácia horizontal dos direitos fundamentais: princípio da supremacia da Constituição; postulado da unidade material do ordenamento jurídico; direitos fundamentais como princípios objetivos; princípio da dignidade da pessoa humana; princípio da solidariedade; e aplicação imediata dos direitos fundamentais.

Ressalte-se, ainda, a tendência de reconhecimento pela maioria dos países europeus, assim como no Brasil, do caráter normativo dos preceitos constitucionais. Se, em tempos do positivismo jurídico, os ditames constitucionais eram precipuamente direcionados aos Poderes Legislativo e Executivo, servindo-lhes apenas de inspiração a quando do exercício de suas competências, e cabendo ao Poder Judiciário apenas a sua aplicação como “boca da lei”, passa-se agora à concepção de que os preceitos constitucionais são normas passíveis não apenas de interpretação pelos magistrados, mas também aplicáveis diretamente pelos julgadores e reivindicáveis imediatamente pelo cidadão, sem a necessidade de ponte normativa legal emanada por outro Poder[12].

Neste sentido, considerando que os direitos fundamentais se encontram sedimentados em normas constitucionais de aplicabilidade direta, não há óbice algum de que sejam reivindicados em aplicabilidade não só como instrumento de defesa contra as arbitrariedades estatais, mas, precipuamente, em face das violações emanadas de particulares, em especial quando patente o desnivelamento econômico e político das partes envolvidas.

2. Principais teorias quanto à eficácia dos direitos fundamentais às relações privadas

A formação e adoção de teorias quanto à eficácia dos direitos fundamentais às relações privadas ultrapassam o debate acadêmico, para ter quilate importantíssimo na forma de se interpretar, aplicar e julgar as relações firmadas entre estes particulares.

A adoção de uma ou outra ideia mais ou menos afinada com a imediatidade dos direitos fundamentais às relações privadas gera repercussões diretas não apenas quanto ao seu nível de proteção, mas também qual seria o estatuto normativo central e paradigmático a ser utilizado nas relações entre particulares.

Como explica Sarmento[13]:

O ponto nodal da questão consiste na busca de uma fórmula de compatibilização entre, de um lado, uma tutela efetiva dos direitos fundamentais, neste cenário em que as agressões e ameaças a eles vêm de todos os lados e, do outro, a salvaguarda da autonomia privada. As posições que priorizam o primeiro aspecto tenderão a defender uma eficácia mais ampla dos direitos fundamentais entre os particulares, enquanto as que conferem um peso maior ao segundo aspecto, vão alinhar-se às teses que mitigam de forma mais marcante esta incidência.

Ou seja, caso se adote teoria não compatível com a eficácia horizontal, forçosa é a conclusão de que a Constituição não pode ser encarada como o eixo central do direito privado, mas sim as normas infraconstitucionais, em especial, o Código Civil. Este, inspirado na isonomia das partes e liberdade individual, apresentar-se-ia como inspiração interpretativa e modelo de comportamento a ser seguido por todos os indivíduos em suas relações privadas. Haveria contexto de dicotomia protetiva. Nas relações do indivíduo e o Estado, a norma máxima e protetiva dos direitos fundamentais consistir-se-ia na Constituição em todos os seus consectários protetivos da dignidade humana. Todavia, em suas relações privadas, primar-se-ia pela liberdade individual em face da proteção a direitos fundamentais.

Por outro lado, e em extremo oposto, caso se adote uma teoria afinada com a aplicabilidade horizontal, ter-se-ia que aceitar a Constituição como eixo central não só das relações do indivíduo para com o Estado, como também entre os particulares. Todo o sistema normativo civil passa a ser interpretado a partir dos direitos fundamentais dispostos na Constituição Federal orbitantes na dignidade da pessoa humana. E não só isso, por serem, em regra, os direitos fundamentais estabelecidos em normas abertas de baixa densidade semântica, haverá grande liberdade interpretativa judicial no dimensionamento e forma de proteção a tais direitos em suas relações privadas.

Desta forma, em conclusão, seja qual for a teoria adotada, haverá seríssimas repercussões no nível de proteção do direito fundamental discutido.

Existem pelo menos três teorias principais voltadas ao tema[14]. A primeira nega a eficácia horizontal aos direitos fundamentais e, segundo Sarmento[15], surgiu na Alemanha, tendo como seus maiores defensores Mangoldt e Forsthoff.

Sob uma visão do liberalismo clássico, defende-se que os direitos fundamentais são aplicáveis exclusivamente como instrumento de defesa em face do Estado. Sua linha argumentativa principal é de que “a eficácia horizontal fulminaria a autonomia individual, destruiria a identidade do direito privado, que ficaria absorvido pelo Direito Constitucional, e conferiria um poder exagerado aos juízes, em detrimento do legislador democrático”[16].

Talvez a democracia ocidental de maior projeção a adotar tal teoria seja os Estados Unidos da América, sedimentada pelo menos desde 1883, pela Suprema Corte[17].

Segundo Sarmento[18],

É praticamente um axioma do Direito Constitucional norte-americano, quase universalmente aceito tanto pela doutrina como pela jurisprudência, a ideia de que os direitos fundamentais, previstos no Bill of Rights da Carta estadunidense impõem limitações apenas para os Poderes Públicos e não atribuem aos particulares direitos frente a outros particulares com exceção da 13ª Emenda, que proibiu a escravidão.

O principal fundamento seria a interpretação literal do Bill of Rights da Constituição estadunidense, a qual faz referência exclusivamente aos Poderes Públicos na maior parte das cláusulas referentes aos direitos fundamentais[19].

Outros fundamentos, talvez menos importantes, também são invocados, como a defesa da autonomia privada, que ficaria vulnerável diante da aplicação horizontal dos direitos fundamentais e também o pacto federativo, que vedaria que “as cortes federais, a pretexto de aplicarem a Constituição, intervenham na disciplina das relações privadas”[20].

Todavia, em que pese ainda ser prevalente a defesa da autonomia privada, encontra-se hoje relativizada pela chamada public function theory, que impõe a possibilidade de oposição de direitos fundamentais em face de conduta de outro particular, em duas situações: “(i) o ente privado exerce uma função estatal típica; (ii) quando se possa imputar ao Estado a responsabilidade pela conduta praticada pelo ente privado”[21].

Uma segunda teoria, desenvolvida inicialmente pelos ensinamentos de Günter Durig, prega pela eficácia indireta e mediata dos direitos fundamentais às relações privadas (Mittelbare Drittwirkung). Os particulares não poderiam invocar os direitos fundamentais como subjetivos em suas relações travadas com outros particulares, eis que é inerente à autonomia privada a possibilidade de renúncia a certos direitos. Outra justificativa consistiria em que a adoção da eficácia imediata às relações privadas acarretaria um poder imensurável ao Judiciário, o que acabaria por comprometer a liberdade individual[22].

Por outro lado, seus adeptos reconhecem que os direitos fundamentais estabelecem uma ordem objetiva de valores, os quais se irradiam por todo o ordenamento jurídico, inclusive, no direito privado, que também devem ser interpretados de acordo com os seus preceitos[23].

Caberia a defesa dos direitos fundamentais nas relações privadas, nestes termos, não diretamente por força do Direito Constitucional, mas por instrumentos do Direito Privado. Todavia, isso não escusaria o legislador privado de proteger os direitos fundamentais disputados nas relações privadas: “Dentre as várias soluções possíveis no conflito entre direitos fundamentais e autonomia privada, competiria à lei a tarefa de fixar o grau de procedência recíproca entre cada um dos bens jurídicos confrontantes”[24].

Segundo Ehrhardt Júnior[25],

A força dos direitos fundamentais em relação aos particulares não se afirmaria de modo imediato, mas apenas mediatamente, através dos princípios e normas próprios do direito privado. Quando muito, os preceitos constitucionais seriam princípios interpretativos das cláusulas gerais e conceitos indeterminados, clarificando-os, colmatando lacunas, mas sempre dentro do espírito do direito privado. Não se quer dizer, na corrente da eficácia indireta, que a liberdade dos indivíduos e a autonomia do direito privado são absolutas, mas sim que deve existir uma conciliação com os direitos fundamentais. Assim, estes incidiriam por intermédio do material normativo próprio do direito privado. Os direitos fundamentais seriam como um sistema de valores válidos para todo o ordenamento jurídico, que teriam nas cláusulas gerais do direito privado uma porta de entrada. Elas (cláusulas gerais) seriam o elo de ligação entre os direitos fundamentais enquanto sistema de valores e o direito privado.

Neste sentido, em que pese não ser possível para esta teoria a eficácia imediata em relações horizontais, os direitos fundamentais forjados em preceitos constitucionais seriam aplicáveis ora como princípios de interpretação das cláusulas gerais e conceitos jurídicos indeterminados a serem concretizados (Wertverdeutlichung) e ora para suprir determinadas lacunas existentes no Direito Privado (Wetschultzlückenschliessung)[26].

Por fim, tem-se a teoria da eficácia direta e imediata dos direitos fundamentais na esfera privada, que prega a sua aplicabilidade da mesma forma da que ocorre entre Estado e indivíduo. O primeiro a desenvolver tal teoria foi Hans Carl Nipperdey, a partir da década de 50 do século passado. Para este magistrado alemão, em que pese alguns direitos fundamentais serem oponíveis apenas em face do Estado, “outros, pela sua natureza, podem ser invocados diretamente nas relações privadas, independentemente de qualquer mediação por parte do legislador, revestindo-se de oponibilidade erga omnes”[27].

O protagonismo alcançado por grandes corporações na sociedade contemporânea acompanhado pelo crescente poder de influência sobre as decisões das instituições públicas levaram a se reconhecer a possibilidade das violações a direitos fundamentais partirem não apenas de atos estatais, mas também, e principalmente, de poderes sociais e terceiros em geral. Daí porque Nipperdey acreditava não ser mais possível a limitação da eficácia dos direitos fundamentais apenas aos atos estatais, sendo forçoso o reconhecimento de sua extensão também às relações travadas entre particulares.

Segundo Ehrhardt Júnior[28], para esta teoria

é desnecessária uma ação intermediária para que sejam tais direitos fundamentais aplicáveis às relações interprivados. Haveria uma desnecessidade de mediação legislativa ou de artimanhas interpretativas para a incidência dos direitos fundamentais. Obviamente, a verificação da aplicabilidade deve ser individualizada, dependendo das características de cada norma de direito fundamental. Não significa dizer que todos os direitos fundamentais serão aplicáveis em todas as relações. A aplicabilidade representa um nexo de pertinência entre a norma e o caso. Há, claro, direitos que são destinados exclusivamente às relações entre indivíduos e Estado. Nesta teoria, há um forte risco à sobrevivência da autonomia privada, além do comprometimento da clareza e da segurança essenciais às relações privadas, acostumadas que são com regras claras, detalhadas e bem definidas.

Os principais fundamentos da aplicação imediata dos direitos fundamentais, segundo Nakahira[29], consistiriam no reconhecimento dos direitos fundamentais como expressão máxima dos valores adotados por um Estado e, portanto, irradiante a todo o ordenamento jurídico e, também o reconhecimento da força normativa da Constituição, devendo-lhe obediência todo o ordenamento jurídico infraconstitucional, inclusive o privado, sob pena de invalidade.

Pode-se dizer que hoje é a teoria dominante nas democracias ocidentais, sendo reconhecidamente aplicada em países como Espanha, Portugal, Itália e Argentina.

2.1. Eficácia horizontal dos direitos fundamentais à luz da doutrina e jurisprudência nacionais

Não é objeto de discussão jurídica, nem em nível doutrinário nem em jurisprudência, o fato de que as disposições previstas na Constituição da República de 1988 são dotadas de força normativa e se encontram no ápice do sistema normativo nacional, devendo, por estes motivos, todo o ordenamento jurídico a elas obediência, sob pena de nulidade.

Neste sentido, seja qual ramo estiver vinculado, público ou privado, toda lei infraconstitucional deve ser elaborada, interpretada e aplicada, levando-se em conta os fundamentos e objetivos previstos, respectivamente, nos artigos 1º e 3º, da CF/88, assim como os direitos fundamentais, estes dispersos em seu corpo, mas essencialmente previstos em forma de princípios no artigo 5º.

Mas não só a lei infraconstitucional deve obediência à Constituição da República de 1988. Todo aquele, público ou privado, nacional ou estrangeiro, que se encontre em território nacional ou submetido à normatividade constitucional brasileira, deve obediência à Constituição da República, dentre as quais se encontram os direitos fundamentais, essenciais ao pleno desenvolvimento humano.

É neste sentido, portanto, que, mesmo não havendo norma expressa, forçoso o entendimento dos efeitos horizontais imediatos dos direitos fundamentais. Não seria crível se pensar na possibilidade de distanciamento aos objetivos, fundamentos, direitos constitucionais pelo particular e, principalmente, da dignidade da pessoa humana, pelo simples fato da relação ser travada com outro particular e não em face do Estado.

Adepto desta tese, Barroso[30],[31] defende que tal teoria é a mais adequada à realidade jurídica brasileira, sendo adotada pela maioria da doutrina.

Na ponderação a ser empreendida, como na ponderação em geral, deverão ser levados em conta os elementos do caso concreto. Para esta específica ponderação entre autonomia da vontade versus outro direito fundamental em questão, merecem relevo os seguintes fatores: a) a igualdade ou desigualdade material entre as partes (e.g., se uma multinacional renuncia contratualmente a um direito, tal situação é diversa daquela em que um trabalhador humilde faça o mesmo); b) a manifesta injustiça ou falta de razoabilidade do critério (e.g., escola que não admite filhos de pais divorciados): c) preferência para valores existenciais sobre os patrimoniais; d) risco para a dignidade da pessoa humana (e.g., ninguém pode se sujeitar a sanções corporais).

Segundo Nakahira[32], os principais argumentos utilizados pela doutrina nacional em prol da eficácia horizontal dos direitos fundamentais são, dentre outros: não vedação à aplicação dos direitos fundamentais aos particulares na Constituição da República; em algumas normas, estruturalmente, os direitos fundamentais são destinados aos particulares; o artigo 5º, parágrafo primeiro, prevê a máxima otimização das normas definidoras de direitos fundamentais; reconhecimento da preponderância das normas constitucionais referentes aos direitos fundamentais e sua irradiação para todo o sistema normativo infraconstitucional; reconhecimento da dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil.

Enquanto a doutrina nacional sempre foi, em sua maioria, manifesta à eficácia dos direitos fundamentais às relações privadas, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, pelo menos em um primeiro momento, embora reconhecesse a sua aplicabilidade, não tecia maiores considerações neste sentido[33]. Ou seja, em que pese não fossem incomuns decisões judiciais do STF utilizando diretamente os direitos fundamentais para resolver questões de ordem privada, fato é que não eram subsidiadas em nenhum lastro teórico[34].

Somente no ano de 2006, no RExt. n. 201819[35], pode-se falar que o Supremo Tribunal Federal expressamente, e devidamente respaldado em densa fundamentação teórica, tomou partido pela adoção da Teoria da Eficácia Horizontal Direta e Imediata dos direitos fundamentais às relações privadas, estando o posicionamento atualmente consolidado.

A ementa ficou firmada no seguinte sentido:

SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. UNIÃO BRASILEIRA DE COMPOSITORES. EXCLUSÃO DE SÓCIO SEM GARANTIA DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. RECURSO DESPROVIDO. I. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. As violações a direitos fundamentais não ocorrem somente no âmbito das relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado. Assim, os direitos fundamentais assegurados pela Constituição vinculam diretamente não apenas os poderes públicos, estando direcionados também à proteção dos particulares em face dos poderes privados. II. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS COMO LIMITES À AUTONOMIA PRIVADA DAS ASSOCIAÇÕES. A ordem jurídico-constitucional brasileira não conferiu a qualquer associação civil a possibilidade de agir à revelia dos princípios inscritos nas leis e, em especial, dos postulados que têm por fundamento direto o próprio texto da Constituição da República, notadamente em tema de proteção às liberdades e garantias fundamentais. O espaço de autonomia privada garantido pela Constituição às associações não está imune à incidência dos princípios constitucionais que asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus associados. A autonomia privada, que encontra claras limitações de ordem jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade não confere aos particulares, no domínio de sua incidência e atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as restrições postas e definidas pela própria Constituição, cuja eficácia e força normativa também se impõem, aos particulares, no âmbito de suas relações privadas, em tema de liberdades fundamentais. [...] IV. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO.

Em conclusão, tem-se, portanto, que a doutrina nacional sempre foi majoritariamente tendenciosa à eficácia direta e imediata dos direitos fundamentais às relações privadas, tese apenas explicitamente adotada no âmbito do Supremo Tribunal Federal no ano de 2006, sendo este o posicionamento seguido desde então, sem maiores divergências.

3. O novo centro gravitacional do Direito Civil

O modelo de direito privado codificado, dominante ao longo do século XIX, na Europa Ocidental, em especial na Alemanha e França, fundado na ideia da autonomia da vontade dos indivíduos, na igualdade formal e em preceitos filosóficos do jusnaturalismo imutável e universal, representou o ápice do iluminismo e relacionava-se ao modelo do Estado Liberal, defendido pela classe econômica dominante da época.

O modelo de codificação do Estado Liberal vinculava-se a uma estrita e rígida separação entre o Direito Público e o Privado. No primeiro, que disciplinava as relações desiguais entre o cidadão e o estado, incidia a Constituição, e o segundo, que regulava as relações entre iguais na sociedade civil e mercado, centrava-se no Código Civil[36].

O Estado Liberal e todo o sistema normativo que lhe dava sustentação deixaram consequências sociais graves. Os dogmas da igualdade formal e da autonomia da vontade justificaram a opressão das classes menos favorecidas pela classe burguesa, criando desequilíbrios econômicos e injustiças sociais que se tornaram latentes, em especial, no pós-segunda guerra. Neste momento passa-se a observar uma mudança ao modelo de Estado Social, mais propício às transformações desejadas pelos excluídos do sistema econômico vigente.

Nesta esteira, diversos direitos sociais voltados à consolidação da igualdade material são deslocados para o seio das Constituições. As Constituições passam a dispor não apenas de direitos individuais de primeira geração, mas, sobretudo, de direitos sociais. As normas constitucionais passam a elucidar programas de ação para os Estados, dando feição dirigente às Constituições, moldando toda a atividade estatal.

Inicia-se, neste momento, o que se costuma chamar da fase dos estatutos. O modelo de codificação do direito privado geral e exaustivo perde espaço para os estatutos direcionados à regulamentação de específicos tipos de relações privadas. São eles caracteristicamente pródigos em cláusulas gerais e regras hermenêuticas mais consentâneas à velocidade das transformações sociais.

Resultado desta fragmentação do direito privado é que a Constituição, que agora passa a disciplinar as relações econômicas e privadas, transforma-se em epicentro unificador do direito civil.

O reconhecimento da força normativa da Constituição e de sua posição hierárquica em relação a todo o sistema jurídico, associado ao deslocamento de normas de direito privado dos Códigos à Constituição criaram as condições ideais para que a Lei Maior se transformasse no novo centro gravitacional do direito privado[37].

A constitucionalização do Direito Civil tem mudado a concepção do Direito Civil, e a ideia de que o Código Civil representa a Constituição do Direito Privado encontra-se ultrapassada. Todo o ordenamento jurídico deve ser interpretado à luz da Constituição Federal, que possui supremacia sobre todas as demais normas. Por conseguinte, é possível afirmar que é a Constituição, e não mais o Código Civil, que dá unidade ao sistema jurídico brasileiro[38].

As consequências do fenômeno da constitucionalização do direito privado ultrapassam o simples fato de deslocamento de algumas matérias de direito privado do Código para a Constituição. São muito mais profundas e multiformes do que isso.

De início, o fato de disposições de direito privado se encontrarem agora em sede Constitucional acaba por criar limitação material ao legislador infraconstitucional, que agora é bitolado em sua atividade a um conjunto de normas de estatura hierárquica superior. Da mesma forma, a legislação privada anterior incompatível materialmente com as novas disposições constitucionais resta afastada do sistema jurídico.

Outra consequência latente é de que os princípios e regras constitucionais passam a influenciar a própria interpretação do direito privado, orientando as relações interpessoais, que passam a ser centradas em fundamento superior, qual seja, o da dignidade da pessoa humana. “O reconhecimento da fundamentação da dignidade da pessoa humana impõe uma nova postura aos estudiosos do direito civil-constitucional, que devem, na interpretação e aplicação de normas e conceitos jurídicos, assegurar a vida humana de forma integral e prioritária”[39].

Por fim, pode tanto o intérprete como o aplicador valer-se da possibilidade de aplicação imediata da Constituição nas relações privadas, sem a necessidade da intermediação de normas infraconstitucionais para tanto. Não há qualquer óbice a que o Judiciário aplique diretamente normas de estatura constitucional à resolução de lides privadas, eis que é a Carta Magna, e não mais o Código, o centro gravitacional do sistema do direito privado[40].

4. Desvio de bagagem aérea, limitação à indenização e incompatibilidade com a Teoria da eficácia horizontal direta e imediata dos direitos fundamentais às relações privadas

Em maio de 2017, o Plenário do Supremo Tribunal Federal encerrou o julgamento do RExt. nº 636331 e do RExt. com Agravo nº 766618[41] e, forte no artigo 178, da Constituição Federal[42], firmou entendimento de que os conflitos que envolvem extravio de bagagens ligados à relação de consumo em transportes aéreos internacional de passageiros devem ser resolvidos pelas regras estabelecidas pelas convenções internacionais sobre a matéria e ratificadas pela República Federativa do Brasil, no caso a Convenção de Varsóvia, que expressamente limita as indenizações por danos materiais decorrentes de extravio de bagagem.

O voto do relator, ministro Gilmar Mendes, foi acompanhado pela maioria dos integrantes da Corte, sendo que a fundamentação da tese firmada tem lastro basicamente em duas premissas.

A primeira consiste em que a proteção ao consumidor, prevista no art. 5º, XXXII, e art. 170, V, ambos da CF/88, não é a única diretriz que orienta a ordem econômica nem a única determinação constitucional que deve ser respeitada pelo julgador no caso de lides envolvendo voos internacionais. Segundo este entendimento, é a própria Lei Maior brasileira, em seu dispositivo 178, explícita ao determinar a aplicação dos acordos internacionais firmados pelo Brasil em relação à ordenação do transporte aéreo internacional.

Neste sentido, havendo duas diretrizes díspares – a que determina a aplicação do CDC e a que determina a aplicação de acordo internacional – forçoso é que o magistrado construa interpretação sistematizada do texto constitucional, devendo levar e consideração todos os preceitos constitucionais.

A segunda premissa, parte do princípio de que, em se tratando de relação firmada em transporte aéreo internacional, a Conversão de Varsóvia, limitadora de indenização por desvio de bagagem, pode ser considerada instrumento legal especial em face do Código de Defesa do Consumidor, que é norma geral para as relações de consumo. Neste sentido, forçosa seria a aplicação do então vigente art. 2º, §2º, do Decreto-Lei nº 4.657/42[43].

Não haveria, por assim dizer, revogação ou derrogação das normas consumeristas. Tanto o CDC quanto a Convenção de Varsóvia conviveriam no sistema normativo, havendo apenas afastamento das normas consumeristas a quando do julgamento de lides envolvendo o transporte aéreo internacional.

A tese vencedora apresenta grave desvio de perspectiva sobre o tema e ignora que, diante da proteção ao consumidor e a reparação integral dos direitos fundamentais, não há possibilidade interpretativa que exclua suas aplicações às relações travadas entre particulares, seja qual for o instrumento normativo regulamentador.

O desvio de perspectiva do voto vencedor consiste exatamente na maneira como o aparente conflito entre princípios constitucionais foi abordado. Preferiu-se “descer” à legislação infraconstitucional (de um lado, a Convenção de Varsóvia e de outro, o Código de Defesa do Consumidor), para se concluir, equivocadamente, que, no transporte aéreo internacional, aquele diploma legal seria especial perante o estatuto consumerista.

Não se escusa mencionar, de início, que não é da competência do Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 102, III, da CF/88, processar e julgar eventuais recursos extraordinários para solucionar conflitos entre tratados internacionais e leis locais[44]. Nestes termos, se a divergência se limitasse simplesmente em especialidade ou não da Convenção de Varsóvia em relação ao Código de Defesa do Consumidor, no que diz respeito à limitação da reparação de danos materiais decorrentes de desvio de bagagem em transporte aéreo internacional, sequer caberia apreciação do caso ao STF. A divergência se esgotaria na competência do Superior Tribunal de Justiça, instância esta competente ao julgamento de lides deste viés.

O ponto nodal do Recurso Extraordinário, e isto foi solenemente ignorado na fundamentação do voto vencedor, é se seria possível, por aplicação do art. 178, da CF/88, a internalização de preceito divergente à norma constitucional regulamentadora de direito fundamental, também eficaz, nos termos de jurisprudência sedimentada em âmbito do STF, às relações privadas.

À guisa de esclarecimento, em direito internacional, inexiste um sistema normativo supra-estatal que determine o nível hierárquico que os tratados internacionais possuíram no ordenamento doméstico de cada Estado. É a Constituição de cada país que estabelecerá a estatura interna do tratado[45].

No caso brasileiro, ressalvados aqueles que versam sobre direitos humanos[46], é entendimento pacificado, pelo menos desde o julgamento do RExt. nº 80.004, de 01.06.1977[47], que os tratados internacionais, quando internalizados, possuem a mesma estatura hierárquica que a legislação infraconstitucional[48].

É, portanto, nestes termos, que, embora inexistente dispositivo literal na Constituição Federal de 1988, os tratados internacionais internalizados devem se coadunar formal e materialmente aos dispositivos normativos constitucionais, e, como tal, também àqueles que tratam de direitos fundamentais. Caso contrário, podem os dispositivos conflitantes com a Lei Maior ser objeto de questionamento em ADI e, em caso de reconhecimento da inconstitucionalidade, declarada a nulidade e afastados do ordenamento jurídico.

Embora sem emprego de linguagem direta, a Constituição brasileira deixa claro que os tratados se encontram aqui sujeitos ao controle de constitucionalidade, a exemplo dos demais componentes infraconstitucionais do ordenamento jurídico. Tão firme é a convicção de que a lei fundamental não pode sucumbir, em qualquer espécie de confronto, que nos sistemas mais obsequiosos para com o direito das gentes tornou-se encontrável o preceito segundo o qual todo tratado conflitante com a constituição só pode ser concluído depois de se promover a necessária reforma constitucional[49].

Fixado, portanto, o erro de perspectiva do julgamento do Supremo Tribunal Federal, e feita a ressalva sobre a necessidade de compatibilidade material dos tratados internacionais às normas constitucionais, passa-se, nos parágrafos seguintes, à análise da eventual compatibilidade (ou não) da Convenção de Varsóvia com a Constituição Federal, no ponto que trata da limitação da indenização material em caso de desvio de bagagem em voos em transporte aéreo internacional.

A primeira observação a ser feita é a de que o critério da especialidade utilizado para a resolução do conflito de normas no voto vencedor se encontra equivocado. É dizer, a análise do conflito entre a Convenção de Varsóvia e o Código de Defesa do Consumidor não deve ser abordada sob a perspectiva da especialidade, mas sim, da compatibilidade das disposições constantes naquele tratado com os ditames previstos na Constituição Federal de 1988, em especial aos direitos fundamentais, previstos no art. 5º, V[50] e XXXII[51]. O critério de resolução de conflito aparente de normas, portanto, mais adequado à resolução do caso é o hierárquico.

No ponto, verifica-se que ambos os direitos fundamentais mencionados no parágrafo anterior não traçam qualquer teto indenizatório no que diz respeito ao valor da indenização por danos materiais, o que permite concluir que a posição tomada pelo constituinte é de que a sua reparação deve ser a mais ampla e completa possível, mormente quando considerarmos a existência de relação de consumo, eis que expressa nossa Carta Magna, em pelo menos dois dispositivos[52], a tomada de posição pela defesa do consumidor.

Em verdade, a proteção erigida ao consumidor e a consequente previsão de reparação integral, constitui-se em próprio princípio estruturante da Ordem Econômica (art. 170, V, da CF/88), o que indica que, mesmo sendo os tratados internacionais os instrumentos a serem observados em relação ao transporte aéreo internacional (art. 178, da CF/88), fato é que não podem se distanciarem de seus princípios interpretativos reguladores.

A própria defesa do consumidor, assumida constitucionalmente, tanto como política pública comum a todos os entes (art. 24, VIII) como direito fundamental (art. 5º, XXXII), constitui verdadeiro compromisso federativo de garantia de acesso de todo o cidadão aos bens básicos necessários a uma vida digna (art. 1º, III, da CF/88). Negar o Estado brasileiro a proteção ao consumidor ou limitá-la, seja internamente seja em suas relações internacionais, é violar ao mesmo tempo fundamento da República, assim como descumprir compromissos acertados constitucionalmente de construção de uma sociedade livre, justa e solidária[53].

Não se escusa dizer, por outro lado, que a eventual adoção de limitação de indenização material por desvio de bagagem apenas em relação ao transporte aéreo internacional é capaz de criar situações absolutamente anti-isonômicas e, portanto, violadoras também de direito fundamental previsto no art. 5º, I, da CF/88.

A Constituição Federal de 1988 adotou o princípio da igualdade de direitos prevendo a igualdade de aptidão, uma igualdade de possibilidades virtuais, ou seja, todos os cidadãos têm o direito de ordenamento idêntico pela lei, em consonância com os critérios albergados pelo ordenamento jurídico. Dessa forma, o que se veda são as diferenciações arbitrárias, as discriminações absurdas, pois o tratamento desigual dos casos desiguais na medida que se desigualam, é exigência do próprio conceito de justiça [...] O legislador, no exercício de sua função constitucional de edição normativa, não poderá afastar-se do princípio da igualdade, sob pena de flagrante inconstitucionalidade. Assim, normas que criem diferenciações abusivas, arbitrárias, sem qualquer finalidade lícita, serão incompatíveis com a Constituição Federal[54].

A violação da Convenção ao direito fundamental da isonomia pode ser explanada em exemplo hipotético. Basta se imaginar um voo que faça parte do trajeto em território nacional e parte para outro país. Na eventualidade de extravio de bagagem pertencente a passageiro que tenha realizado apenas o trajeto doméstico, por inaplicabilidade da Convenção, a indenização pelos danos materiais não estaria limitada a nenhum valor, realidade diversa se referente a extravio de bagagem de passageiro que tenha feito o trajeto internacional. Estar-se-ia perante dois casos absolutamente iguais, mas tratados de forma diferente, sem nenhuma justificativa plausível, o que vai de encontro ao princípio da isonomia.

Mas não só isso. A própria Constituição Federal, ao elevar a defesa do consumidor a direito fundamental, tomou partido na defesa do sujeito mais fraco da relação consumerista, determinando ao legislador ordinário a regulamentação de sua defesa. Ou seja, há reconhecimento do constituinte que, neste tipo de relação, uma das partes se encontra em posição de vulnerabilidade em relação à outra. E, desta forma, para que a isonomia seja resgatada, necessário o estabelecimento de normas protetivas em seu favor.

Tratando-se de novidade constitucional em termos de direitos individuais, o inciso XXXII, do art. 05º da Constituição Federal de 1988 demonstra a preocupação do legislador constituinte com as modernas relações de consumo, e com a necessidade de proteção do hipossuficiente economicamente [...] essa nova visão constitucional, em termos de inovação do rol dos direitos humanos fundamentais, de proteção ao consumidor, deve ser compatibilizada com preceitos tradicionais em nossas Constituições, como a livre iniciativa e a livre concorrência[55].

Neste sentido, a previsão de regra infraconstitucional essencialmente voltada à defesa da parte mais forte da relação, encontra-se em verdadeiro descompasso com o sistema protetivo do consumidor assumido pelo constituinte originário. A proteção da empresa aérea, sob o pretexto de compromisso do Estado em cumprir acordos internacionais, agrava a disparidade presumidamente existente e, por conseguinte, vai de encontro ao espírito isonômico buscado pelo direito fundamental forjado na defesa do consumidor.

Partindo-se da ideia, já pacificada em doutrina e jurisprudência nacionais, de adoção da teoria da eficácia horizontal direta e imediata dos direitos fundamentais às relações privadas, o desenlace interpretativo só pode ser no sentido de que, mesmo havendo dispositivo constitucional determinando que o transporte aéreo internacional deva ser regulamentado através de acordos internacionais firmados pelo país, no caso Convenção de Varsóvia, fato é que isto não significa dizer que as relações consumeristas privadas daí decorrentes não tenham que se coadunar com o rol de direitos fundamentais a elas aplicáveis. Não é crível se pensar que, em suas relações internacionais, possa o Estado brasileiro, assumir compromisso violador de direitos escolhidos como fundamentais pelo seu constituinte originário e necessários à busca de vida digna de seus nacionais.

E é, portanto, neste sentido, que a atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, no que diz respeito à limitação material de desvio de bagagem em transporte aéreo internacional, por força da Convenção de Varsóvia, encontra-se absolutamente equivocada, sem respaldo nas normas constitucionais que preveem direitos fundamentais, tidas como também aplicáveis diretamente às relações travadas entre entes privados.

Conclusão

O presente artigo teve como finalidade inicial apresentar a ideia de que a limitação dos efeitos dos direitos fundamentais às relações verticais travadas entre Estado e indivíduo não se coaduna mais ao contexto hodierno de poderio de determinados agentes privados e de “apequenamento” estatal.

Neste contexto, após serem apresentadas as principais teorias que tratam sobre a eficácia (ou não) dos direitos fundamentais às relações privadas, registrou-se que, tanto doutrina como jurisprudência majoritárias nacionais se filiam à teoria da eficácia direta e imediata, de modo que a ausência de legislação não impede a incidência dos direitos fundamentais nas relações entre particulares.

Resultado desta nova perspectiva em cenário nacional é, sobretudo, a mudança do centro gravitacional do direito civil do Código para a Constituição Federal, e, por conseguinte, uma postura mais ativa do Judiciário na interpretação e limitação de normas abertas e princípios normalmente utilizados na referência a direitos fundamentais.

Em seguida, deu-se atenção ao objeto principal do trabalho, qual seja, o confronto da atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal quanto à limitação da indenização por danos materiais decorrentes de extravio de bagagem em transporte aéreo internacional à luz da Teoria da Eficácia Horizontal Direta e Imediata dos Direitos Fundamentais.

Demonstrou-se, ao fim, que a tese adotada pelo Supremo Tribunal Federal, mormente no que diz respeito à aplicação da limitação de indenização prevista na Convenção de Varsóvia, não se coaduna com valores constitucionais forjados em direitos fundamentais e tidos como essenciais ao florescimento individual, mormente aqueles referentes à isonomia, reparação integral e defesa do consumidor. Assim, faz-se necessária uma revisão das premissas adotadas pela suprema corte brasileira, à luz da eficácia horizontal dos direitos fundamentais.

Referências

ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 1987.

AGUIAR FILHO, Valfredo de Andrade; RIBEIRO, Mikelli Marzzini Lucas Alves. Recepção dos tratados internacionais de direitos humanos no ordenamento pátrio e o novo entendimento do STF. Revista Dat@venia. v. 3. Natal. Jan./Jun. 2011, p. 22-37.

BARROSO, Luis Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito: o triunfo tardio do direito constitucional no Brasil. Revista de Direito Administrativo. v. 240. Rio de Janeiro. Abr./Jun. 2005, p. 1-42.

BASTOS, Elísio; CHAVES, Carlos Gustavo Chada. A descriminalização do porte de drogas para consumo próprio à luz do ativismo judicial. 2020. Obra não publicada.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 201819 - RJ. Min. Relatora: Ellen Gracie, Data de Julgamento: 11/10/2005, Segunda Turma, Data de Publicação: 27 out. 2006. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/762997/recurso-extraordinario-re-201819-rj. Acesso em: 30 out. 2020.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 158215 – RS. Ministro Relator: Marco Aurélio. Data de Julgamento: 30 abr. 1996. Data de Publicação: 07 jun. 1996. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/744133/recurso-extraordinario-re-158215-rs. Acesso em: 30 out. 2020.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 161.243 – DF. Ministro Relator: Carlos Velloso. Data de Julgamento: 29 out. 1996. Data de Publicação: 19 dez. 1997. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/743268/recurso-extraordinario-re-161243-df. Acesso em: 30 out. 2020.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 251.445 – GO. Relator: Ministro Celso de Mello. Data de Julgamento: 21 jun. 2000. Data de Publicação: 03 ago. 2000. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/14825705/recurso-extraordinario-re-251445-go-stf. Acesso em: 30 out. 2020.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo em Recurso Extraordinário nº 766618 – SP. Ministro Realtor: Roberto Barroso. Data de Julgamento: 25 maio 2017. Tribunal Pleno. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/769816147/recurso-extraordinario-com-agravo-are-766618-sp-sao-paulo/inteiro-teor-769816157. Acesso em: 30 out. 2020.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 80004-SE. Ministro Relator: Xavier de Albuquerque. Data de Julgamento: 01 jun. 1977. Tribunal Pleno. Data de Publicação: 29 dez. 1977. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/14614120/recurso-extraordinario-re-80004-se. Acesso em: 30 out. 2020.

CRUZ, José Augusto Gomes; MONTEIRO, Mhércio Cerqueira; POMPENET, Lucas Souza Lima. A crise do welfare state e a ascensão do terceiro setor. Revista Âmbito Jurídico. n. 162. Ago. 2017. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-administrativo/a-crise-do-welfare-state-e-a-ascensao-do-terceiro-setor/. Acesso em: 29 out. 2020.

EHRHADT JÚNIOR, Marcos Augusto de Albuquerque. Direitos fundamentais e as relações privadas: superando a (pseudo)tensão entre aplicabilidade direta e eficácia indireta para além do patrimônio. Revista Jurídica. n. 04, nº 53, Curitiba, 2018, p. 326-356.

FACHIN, Luiz Edson (Coord.). Repensando os Fundamentos do Direito Civil Brasileiro Contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.

IANONI, Marcus. Interesses Financeiros e captura do Estado no Brasil. Revista Economia Política. Vol. 37, nº 2, São Paulo abr./jun. 2017. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-31572017000200324& lng= p t& tlng=pt. Acesso em: 31 mar. 2020.

LIMA, Carolina Silva; SOUSA, Luana Pereira. A constitucionalização do direito civil como garantia de eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas. Instituto Brasiliense de Direito Público – Escola de Direito de Brasília, v. 1, nº 36, 2016. Disponível em: https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/cadernovirtual/article/view/2810/1353. Acesso em: 30 out. 2020.

MEDEIROS, Pamela Rachel dos Santos; SILVA, Joyce Almeida da. A concepção do sujeito de direito, suas reformulações e o princípio da dignidade da pessoa humana. II Seminário do Instituto de Pesquisa e Extensão Perspectivas e Desafios de Humanização do Direito Civil Constitucional: Rediscutindo a Constitucionalização do Direito Civil. João Pessoa, 2014, p. 40-50.

MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2017.

NAKAHIRA, Ricardo. Eficácia horizontal dos direitos fundamentais. Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2007.

NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro. Comentários à Constituição Federal: princípios fundamentais – arts. 1º a 4º. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997.

ONU. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em: https://www.ohchr.org/en/udhr/documents/udhr_translations/por.pdf. 1948. Acesso em: 29 out. 2020.

REZEK, Francisco. Direito Internacional Público. Curso Elementar. ed. 13ª. São Paulo: Saraiva, 2011.

SARMENTO, Daniel. Direitos Fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2004.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. ed. 13ª. São Paulo: Malheiros, 1997.

SOMBRA, Thiago Luís Santos. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações jurídico privadas: A identificação do contrato como ponto de encontro dos direitos fundamentais. Porto alegre: Sérgio Antônio Fabris editor, 2004.

STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a Direitos Fundamentais. São Paulo: Malheiros Editores, 2004.

UNESCO. Les Dimensions internationales des droits de l'homme: manuel destiné à l'enseignement des droits de l'homme dans les universités. 1978, p. 11. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000134209. Acesso em: 29 out. 2020.

VERBICARO, Dennis. Consumo e cidadania. Identificando os espaços políticos de atuação qualificada do consumidor. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017.

Submetido em: 2 nov. 2020.

Aceito em: 27 dez. 2022.

 



[1]    NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro. Comentários à Constituição Federal: princípios fundamentais – arts. 1º a 4º. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997, p. 211.

[2]    SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. ed. 13ª. São Paulo: Malheiros, 2013, p. 180.

[3]    UNESCO. Les Dimensions internationales des droits de l'homme: manuel destiné à l'enseignement des droits de l'homme dans les universités. 1978, p. 11. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000134209. Acesso em: 29 out. 2020.

[4]    ONU. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em: https://www.ohchr.org/en/udhr/documents/udhr_translations/por.pdf. 1948. Acesso em: 29 out. 2020.

[5]    SARMENTO, Daniel. Direitos Fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 47-48.

[6]    IANONI, Marcus. Interesses Financeiros e captura do Estado no Brasil. Revista Economia Política, vol. 37, nº 2, São Paulo abr./jun. 2017, p. 328. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-31572017000200324& lng= p t& tlng=pt. Acesso em: 31 mar. 2020.

[7]    SARMENTO, op. cit., p. 48.

[8]    SARMENTO, 2004, p. 43-44.

[9]    CRUZ, José Augusto Gomes; MONTEIRO, Mhércio Cerqueira; POMPENET, Lucas Souza Lima. A crise do welfare state e a ascensão do terceiro setor. Revista Âmbito Jurídico, n. 162, ago. 2017. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-administrativo/a-crise-do-welfare-state-e-a-ascensao-do-terceiro-setor/. Acesso em: 29 out. 2020.

[10]  SARMENTO, 2004, p. 53-54.

[11]  STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a Direitos Fundamentais. São Paulo: Malheiros Editores, 2004, p. 102.

[12]  Sob forte influência do modelo estadunidense compilado na obra “O Federalista” e pela ideia de que os direitos fundamentais estabelecem uma ordem objetiva de valores firmado no famoso caso Luth. Cf.: BASTOS, Elísio; CHAVES, Carlos Gustavo Chada. A descriminalização do porte de drogas para consumo próprio à luz do ativismo judicial. 2020. Obra não publicada.

[13]  SARMENTO, 2004, p. 224.

[14]  Fora as que são tratadas neste trabalho, são citadas: teoria dos deveres de proteção, teoria dos poderes privados, teoria da convergência estatística e teoria integradora. Cf.: NAKAHIRA, Ricardo. Eficácia horizontal dos direitos fundamentais. Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2007, p. 97-149.

[15]  SARMENTO, 2004, p. 226.

[16]  Em que pese esta teoria ser minoritária, estando inclusive ultrapassada em seu país de origem (Alemanha), fato é que, até hoje, ainda encontra respaldo constitucional em alguns Estados, como a Suíça (SARMENTO, 2004, p. 227).

[17]  NAKAHIRA, op. cit., p. 145.

[18]  SARMENTO, op. cit., p. 227-228.

[19]  NAKAHIRA, op. cit., p. 142.

[20]  SARMENTO, 2004, p. 228.

[21]  NAKAHIRA, 2007, p. 142.

[22]  SARMENTO, op. cit., p 238-239.

[23]  NAKAHIRA, op. cit., p. 124-132.

[24]  SARMENTO, op. cit., p 240-241.

[25]  EHRHADT JÚNIOR, Marcos Augusto de Albuquerque. Direitos fundamentais e as relações privadas: superando a (pseudo)tensão entre aplicabilidade direta e eficácia indireta para além do patrimônio. Revista Jurídica, n. 04, nº 53, Curitiba, 2018, p. 335.

[26]  ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 1987, p. 276-277.

[27]  SARMENTO, 2004, p. 245.

[28]  EHRHADT JÚNIOR, 2018, p. 333.

[29]  NAKAHIRA, 2007, p. 98.

[30]  BARROSO, Luis Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito: o triunfo tardio do direito constitucional no Brasil. Revista de Direito Administrativo. v. 240. Rio de Janeiro. Abr./Jun. 2005, p. 28.

[31]  Seguem a mesma linha de raciocínio, dentre outros, Steinmetz (2004) e Fachin (2000).

[32]  NAKAHIRA, 2007, p. 95-97.

[33]  Dentre outros julgados: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 158215 – RS. Ministro Relator: Marco Aurélio. Data de Julgamento: 30 abr. 1996. Data de Publicação: 07 jun. 1996. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/744133/recurso-extraordinario-re-158215-rs. Acesso em: 30 out. 2020; ________. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 161.243 – DF. Ministro Relator: Carlos Velloso. Data de Julgamento: 29 out. 1996. Data de Publicação: 19 dez. 1997. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/743268/recurso-extraordinario-re-161243-df. Acesso em: 30 out. 2020; ________. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 251.445 – GO. Relator: Ministro Celso de Mello. Data de Julgamento: 21 jun. 2000. Data de Publicação: 03 ago. 2000. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/14825705/recurso-extraordinario-re-251445-go-stf. Acesso em: 30 out. 2020.

[34]  SARMENTO, 2004.

[35]  BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 201819 - RJ. Ministra Relatora: Ellen Gracie, Data de Julgamento: 11 out. 2005, Segunda Turma, Data de Publicação: 27 out. 2006, grifo nosso. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/762997/recurso-extraordinario-re-201819-rj. Acesso em: 30 out. 2020.

[36]  SARMENTO, 2004, p. 92.

[37]  SARMENTO, 2004, p. 96-97.

[38]  LIMA, Carolina Silva; SOUSA, Luana Pereira. A constitucionalização do direito civil como garantia de eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas. Instituto Brasiliense de Direito Público – Escola de Direito de Brasília, v. 1, nº 36, 2016, p. 11. Disponível em: https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/cadernovirtual/article/view/2810/1353. Acesso em: 30 out. 2020.

[39]  MEDEIROS, Pamela Rachel dos Santos; SILVA, Joyce Almeida da. A concepção do sujeito de direito, suas reformulações e o princípio da dignidade da pessoa humana. II Seminário do Instituto de Pesquisa e Extensão Perspectivas e Desafios de Humanização do Direito Civil Constitucional: Rediscutindo a Constitucionalização do Direito Civil. João Pessoa, 2014, p. 49.

[40]  SARMENTO, 2004, p. 101-107.

[41]  BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo em Recurso Extraordinário nº 766618 – SP. Ministro Realtor: Roberto Barroso. Data de Julgamento: 25 maio 2017. Tribunal Pleno. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/769816147/recurso-extraordinario-com-agravo-are-766618-sp-sao-paulo/inteiro-teor-769816157. Acesso em: 30 out. 2020.

[42]  “A lei disporá sobre a ordenação dos transportes aéreo, aquático e terrestre, devendo, quanto à ordenação do transporte internacional, observar os acordos firmados pela União, atendido o princípio da reciprocidade”.

[43]  A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.

[44]  Nos termos do art. 105, III, “a”, da CF/88, cabe ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar Recurso Especial quando a decisão recorrida eventualmente contrariar ou negar vigência à lei federal ou tratado internacional.

[45]  REZEK, Francisco. Direito Internacional Público. Curso Elementar. ed. 13ª. São Paulo: Saraiva, 2011.

[46]  RE 466.343, STF/2008

[47]  BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 80004-SE. Ministro Relator: Xavier de Albuquerque. Data de Julgamento: 01 jun. 1977. Tribunal Pleno. Data de Publicação: 29 dez. 1977. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/14614120/recurso-extraordinario-re-80004-se. Acesso em: 30 out. 2020.

[48]  AGUIAR FILHO, Valfredo de Andrade; RIBEIRO, Mikelli Marzzini Lucas Alves. Recepção dos tratados internacionais de direitos humanos no ordenamento pátrio e o novo entendimento do STF. Revista Dat@venia. v. 3. Natal. Jan./Jun. 2011, p. 29.

[49]  REZEK, op. cit.

[50]  “É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”.

[51]  “O Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”.

[52]  Além do art. 5º, XXXII, da CF/88, tem-se o art. 170, V.

[53]  “A inexistência de instrumentos eficazes de proteção ao consumidor para fazer seus direitos mais básicos, como, por exemplo, a saúde, o transporte, a alimentação, fez sua defesa ser erigida como um direito individual, de modo a determinar-se a edição de norma ordinária regulamentando não só as relações de consumo, mas também os mecanismos de proteção e efetividade dos direitos do consumidor”. Cf.: MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2017, p. 233-234.

[54]  MORAES, 2017, p. 95-96.

[55]  Ibid., p. 233-234.