O PARADOXO DA AÇÃO ANTRÓPICA: SER HUMANO CAUSADOR DA DESTRUIÇÃO FLORESTAL E DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E CRIADOR DA INTELIGÊNCIA ARTIFICAL PARA REDUZIR OS EFEITOS NOCIVOS

Cleide Calgaro

Universidade de Caxias do Sul (UCS), Rio Grande do Sul

[email protected]

Talissa Truccolo Reato

Universidade de Caxias do Sul (UCS), Rio Grande do Sul

[email protected]

Resumo: O problema de pesquisa questiona como que a inteligência artificial pode contribuir para a redução das mudanças climáticas causadas, entre outros fatores, pela destruição das florestas pelos humanos. O objetivo geral é analisar a contribuição da inteligência artificial em prol da redução das mudanças climáticas ocasionadas por vários motivos, entre eles a destruição florestal, tomando em conta que o ser humano ao mesmo tempo em que cria importantes inovações tecnológicas não consegue gerenciar a utilização adequada de recursos naturais. O primeiro objetivo específico visa identificar se a inteligência artificial é capaz de contribuir para a diminuição das mudanças climáticas. O segundo objetivo específico pretende demonstrar como o ser humano não é sensato ao prejudicar as florestas. Quanto aos métodos de pesquisa, a linguagem textual está posta via uma leitura sistemática. Usa-se o método dedutivo. Classifica-se esta pesquisa como básica. É uma análise exploratória. Por fim, com relação aos procedimentos técnicos se trata de uma pesquisa bibliográfica. Conclui-se que o ser humano pode criar máquinas e investir em inteligência artificial, mas precisa contribuir para a redução de mudanças climáticas cessando a interferência antrópica prejudicial, com ênfase na mitigação da destruição das florestas. Assim, a inteligência artificial é uma tecnologia importante, que deve ser somada a normatização, a qual regulamenta as atividades humanas, inclusive punindo atitudes nocivas ao meio ambiente. Além disso, urge estimular a educação ambiental e para o consumo a fim de que existam melhores condições de possibilidade para obter um futuro melhor.

Palavras–Chave: Ação antrópica. Inteligência artificial. Mudanças climáticas. Natureza. Socioambientalismo.

The anthropic action paradox: human being as a causer of forest destruction and climate change and creator of artificial intelligence to reduce harmful effects

Abstract: The research problem asks how artificial intelligence can contribute to the reduction of climate change caused, among other factors, by the destruction of forests by humans. The general objective is to analyze the contribution of artificial intelligence in favor of the reduction of climate changes caused by several reasons, among them the forest destruction, taking into account that the human being at the same time that creates important technological innovations cannot manage the adequate use of natural resources. The first specific objective is to identify whether artificial intelligence is capable of contributing to the reduction of climate change. The second specific objective is to demonstrate how the human being is not sensible when harming forests. As for the research methods, the textual language is put through a systematic reading. The deductive method is used. This research is classified as basic. It is an exploratory analysis. Finally, with regard to technical procedures, this is a bibliographic search. It is concluded that the human being can create machines and invest in artificial intelligence, but needs to contribute to the reduction of climatic changes by ceasing harmful anthropic interference, with an emphasis on mitigating the destruction of forests. Thus, artificial intelligence is an important technology, which must be added to the standardization, which regulates human activities, including punishing harmful attitudes to the environment. In addition, there is an urgent need to stimulate environmental and consumer education so that there are better conditions for the possibility of achieving a better future.

Keywords: Anthropic action. Artificial intelligence. Climate changes. Nature. Socio-environmentalism.

Introdução

O problema de pesquisa proposto apresenta uma perturbação que perpassa a seara acadêmica e adentra na própria realidade social do período contemporâneo. Questiona-se como que a inteligência artificial pode contribuir para a redução das mudanças climáticas causadas, entre outros fatores, pela destruição das florestas, considerando que o ser humano - ao mesmo tempo que desenvolve tecnologias surpreendentes - é incapaz de gerir o uso razoável dos recursos naturais.

Sendo assim, um dos temas centrais abordados na pesquisa é a inteligência artificial, uma vez que é recente o fato das máquinas aprenderem com experiências a ponto de terem a capacidade de receber treinamento para cumprirem atividades nos moldes da desenvoltura humana, processarem dados e reconhecerem os seus padrões. Outro tema central tange às mudanças climáticas, de modo que nos dias de hoje já se vivenciam impactos do uso desenfreado dos recursos naturais, como é o caso do aumento das temperaturas, elevação do nível dos mares, precipitações irregulares, diminuição da biodiversidade, entre outros. Ademais, como tema central também se destaca a destruição das florestas em decorrência do desmatamento e das queimadas, com ênfase para o ocorrido no ano de 2019 na Floresta Amazônica.

O objetivo geral, portanto, é analisar a contribuição da inteligência artificial em prol da redução das mudanças climáticas ocasionadas por vários motivos, entre eles a destruição florestal, tomando em conta que o ser humano ao mesmo tempo em que cria importantes inovações tecnológicas não consegue gerenciar a utilização adequada de recursos naturais. Outrossim, a pesquisa conta com dois momentos no seu desenvolvimento, cada um representa um objetivo específico. O primeiro deles visa identificar se a inteligência artificial é capaz de contribuir para a diminuição das mudanças climáticas. O segundo objetivo específico, portanto, pretende demonstrar como o ser humano não é sensato ao prejudicar as florestas, dada a relevância que possuem para o equilíbrio da vida no planeta.

Ademais, a pesquisa se justifica pela necessidade de debater sobre como as atitudes dos seres humanos são egoístas em um cenário capitalista, no qual a maior preocupação não é com a comunidade global, mas precipuamente com o bem-estar individual. Logo, o ser humano que em prol do “desenvolvimento” criou tecnologias, hoje precisa se valer destes recursos, como é o caso da inteligência artificial, para tentar consertar ou, pelo menos, para minimizar os impactos ambientais causados, os quais geram mudanças climáticas. Sendo assim, como a problemática envolve a destruição florestal também, evidente que a temática levantada é fulcral para que se avance no sentido de conscientização da preservação florestal e, por consequência, de todos os elementos de biodiversidade e equilíbrio envolvidos.

Quanto aos métodos de pesquisa, neste artigo a linguagem textual está posta via uma leitura sistemática. Usa-se o método dedutivo porque se constroem conjecturas baseadas em hipóteses. Classifica-se esta pesquisa como básica (uma vez que gera conhecimentos de interesse universal). É uma análise exploratória, dado que utiliza levantamento bibliográfico. Por fim, com relação aos procedimentos técnicos se trata de uma pesquisa bibliográfica.

1. A inteligência artificial no combate às mudanças climáticas

As percepções acerca do clima estão mais dinâmicas, considerando que são nítidas as alterações da temperatura, bem como são movimentadas as mudanças na previsão do tempo, além da situação das catástrofes ambientais mais frequentes nos últimos anos. Destarte, é evidente que a tecnologia e, especificamente, a inteligência artificial, possui a capacidade de cooperação na busca de recursos que reduzam o impacto do desajuste climático atual, visto que o futuro estará comprometido se nada for feito para reverter o ritmo de desiquilíbrio ambiental e ecológico contemporâneo.

Neste viés, cabe, primeiramente, referir que o clima na Terra sempre sofreu alterações naturais e, desta maneira, sobrevive à ocorrência de mudanças climáticas há milhões de anos. Entretanto, a escala temporal na qual aconteciam reportadas transformações era distinta. Nos dias de hoje, mudanças climáticas globais ocorrem em um intervalo ínfimo, de poucas décadas[1].

Os efeitos das mudanças climáticas estão cada vez mais nítidos: incêndios, tempestades, secas e inundações estão gradativamente mais fortes e frequentes. Assim, “the 2018 intergovernmental report on climate change estimated that the world will face catastrophic consequences unless global greenhouse gas emissions are eliminated within thirty years. Yet year after year, these emissions rise[2][3].

A constância das referidas mudanças está mais manifesta nos dois últimos séculos, sobretudo a partir da chamada Revolução Industrial, isto é, a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera (como dióxido de carbono, ozônio, metano e óxido nitroso) está aumentando por causa da intensificação da atividade agrícola, de transporte e industrial, sobretudo em virtude do emprego de combustíveis fósseis. Isto significa que a temperatura média do planeta está aumentando por causa do ser humano, já que são ações antrópicas a queima de carvão, uso de petróleo e de gás natural (o que gera grande emissão de gás carbônico), bem como a destruição de florestas e de outras vegetações (o que implica em mudanças no padrão do uso do solo, uma vez que o carbono armazenado na vegetação e no solo escapa para a atmosfera), a criação de gado e cultivo de arroz (atividades que emitem metano, óxido nitroso e outros gases de efeito estufa), entre muitas outras práticas infestas realizadas pelos seres humanos[4].

É corrente que o efeito estufa tem o poderio para alterar o sistema climático por capturar mais energia na atmosfera e na superfície da Terra. Mencionado “motor de distribuição de calor” emprega especialmente a circulação atmosférica e oceânica para movimentar a energia térmica e a distribuir pelo mundo. Portanto, quanto mais energia térmica existir, mais o “motor” funcionará. Ademais, sabe-se que o processo de distribuição de energia térmica pelo sistema climático global é o responsável base pelos climas regionais, de maneira que a mudança climática terrestre causa uma inevitável alteração nas condições climáticas, as quais já podem ser notadas, como verões mais quentes, ondas de calor, invernos mais secos, menos neve e alteração na frequência e intensidade das tempestades etc.[5]

Evidente que os impactos planetários, dada as suas implicações, precisarão de adaptação dos sistemas produtivos, dos modos e locais de vida das populações. Entre os efeitos previsíveis da mudança do clima estão: a mudança nos padrões de chuva, a migração das zonas climáticas e agrícolas, o derretimento das geleiras e a dilatação térmica da água dos oceanos (elevando, portanto, o nível dos mares), a potencialização de doenças propagadas por vetores correlacionados à alteração da temperatura (como dengue e malária), a intensificação de tempestades tropicais, a escassez de água potável, o prejuízo aos países menos desenvolvidos pela falta de recursos econômicos para se precaverem contra os impactos ou, pelo menos, para a minimização dos efeitos das mudanças climáticas, o que culminará em dano social, a desertificação de regiões áridas, redução do potencial de produção alimentícia, o desaparecimento de espécies de fauna e flora, etc.[6].

Fato é que Harald Welzer[7] é bastante incisivo, o que chega a causar temor quando se reflete sobre o tema em voga, ao aduzir que as mudanças do clima não apresentam apenas um efeito de agravamento da contemporânea falta de simetria global, cujas consequências podem ser vislumbradas nas guerras, bem como nos conflitos violentos; elas também

agravam os efeitos das mudanças ambientais que não têm nada a ver com as causas das próprias variações climáticas. A opinião prevalecente no debate atual é que temos de enfrentar os problemas ambientais que se agravam progressivamente e apresentam a tendência de colocar em perigo nossa própria existência de uma maneira inovadora.

Não restam dúvidas de que o clima no futuro será diferente, sobretudo pela amplitude da concentração de dos gases de efeito estufa. Assim, o ponto de partida das projeções de climas futuros são os vários cenários que consideram a utilização de combustíveis fósseis, a criação-distribuição de tecnologia redutoras de emissões e o crescimento populacional e econômico. Destaca-se que já não existe incerteza quando ao fato que o aquecimento global médio ultrapassará 1º Celsius por volta de 2050 e talvez chegará até 6º Celsius até o final do século. Ademais, o aquecimento nas latitudes mais altas e nas regiões polares tende a ser superior as mencionadas médias globais[8].

Resta claro que a abordagem das mudanças climáticas envolve tanto o que se pode chamar de mitigação (redução das emissões) quanto a adaptação (que não é outra coisa senão a preparação para as consequências inevitáveis). Pode-se dizer que se tratam de problemas multifacetados. A mitigação das emissões de gases de efeito estufa exige mudanças nos sistemas de eletricidade, de transporte, industrial, de edificações e uso da terra. A adaptação requer planejamento para a resiliência e para o gerenciamento de desastres[9].

Tendo em consideração que as mudanças climáticas tratam de um problema global, já que o meio ambiente é incapaz de discernir os limites territoriais estatais, em que pese nem todos os países contribuíram igualmente na causa do problema e não serão, do mesmo modo, aptos a auxiliarem de forma equânime na remediação dos efeitos nocivos ao planeta, é importante que existam iniciativas conjuntas para a redução dos impactos. Sendo assim, são dois os principais tratados que disciplinam o ânimo para conter efeitos do fenômeno das mudanças climáticas: a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e o Protocolo de Quioto. Além destes dois documentos principais, a Agenda 21 é um documento internacional com recomendações e metas que, mesmo não sendo vinculativo, traçou um importante plano de atuação em prol da promoção da sustentabilidade e aborda as variações climáticas no nono capítulo sobre a proteção da atmosfera[10].

Ocorre que apesar de parte dos acordos internacionais terem sido assinados pela maioria dos países, eles precisam ser negociados também internamente, isto é, para que as metas de redução sejam cumpridas urge que os governos locais, que as pequenas empresas, que as grandes corporações e que as organizações civis, e até mesmo as religiosas, tenham envolvimento e insistam em práticas para a redução das emissões em comento[11].

Conhecida a problemática global, especificamente em termos de Brasil, vale destacar que há a nominada Política Nacional sobre Mudança do Clima (cuja sigla é PNMC), que oficializa o compromisso voluntário do país junto à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima em prol da redução de emissões de gases de efeito estufa. A mencionada Política foi instituída no ano de 2009 pela Lei nº 12.187 visando garantir que o desenvolvimento socioeconômico contribua para a proteção do sistema climático global. Desta maneira, o Poder Executivo, a partir das diretrizes da PNMC, é responsável por estabelecer os Planos setoriais de mitigação e adaptação à mudança no clima para a consolidação de uma economia de baixo consumo de carbono. Estes Planos pretendem atender metas gradativas visando a redução de emissões antrópicas quantificáveis e verificáveis, considerando setores como a geração e distribuição de energia elétrica, transporte público urbano, serviço de saúde, indústria e agropecuária, segundo as particularidades de cada setor. Cabe destacar também no âmbito brasileiro o Plano Nacional sobre Mudança do Clima, o Fundo Nacional sobre Mudança do Clima e a Comunicação do Brasil à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima[12].

Isto posto, os desafios em prol da mencionada mitigação e da adaptação às mudanças climáticas

não têm precedentes, mas não são intransponíveis. Já há elementos-chave e instituições em que se basear; mas há muita coisa a ser feita, e quanto mais tempo se adiar, mais alto será o preço a ser pago no futuro. A redução das emissões dos gases de efeito estufa em níveis seguros dependerá de muita cooperação internacional. Paralelamente, a adaptação dos mais incapazes de se proteger dos impactos climáticos terá de ser facilitada[13]

Assim, fato é que se está diante de um problema global que carece buscar minimamente uma atenuação, já que solucionar é um ideal utópico. Evidente que o aquecimento global adveio por meio do emprego imprudente e descuidado com a tecnologia. Há quem entenda que “qualquer tentativa para resolvê-lo pela utilização de “melhores técnicas” só servirá para agravar o problema, porque é uma parte dele e não a sua solução”[14]. No entanto, o ponto de observação desta pesquisa é distinto da afirmação citada, já que aqui se considera a tecnologia e, sobretudo, a inteligência artificial, como um instrumento propulsor nas tentativas de melhoria do quadro presente e futuro quantos às mudanças climáticas.

Neste sentido, a construção de uma inteligência sintética é um desafio que já conta com alguns anos de ideação. A inteligência artificial pode ser reputada, então, como uma disciplina que se situa no “cruzamento da cognição, das neurociências e da informática, buscando compreender o pensamento e o comportamento humanos, a fim de reproduzi-los artificialmente”[15].

Outrossim, a novel ideia é que a inteligência artificial será uma inteligência em rede, a qual não surgirá de uma máquina especificamente. De modo detalhado, a inteligência tende a ser uma commodity na forma de um fluxo de dados ofertado por empresas (como já ocorre com a água, energia elétrica e serviços telefônicos). Tal como a internet, a inteligência artificial estará em toda parte e em nenhuma. Na nova arquitetura, o ser humano integra uma inteligência criada coletivamente e agrega constantemente novas informações, cooperando na expansão e atualização. Em uma perspectiva filosófica e antropológica, a inteligência artificial é uma ameaça para o monopólio humano da inteligência. Pode-se questionar o que acontecerá se um dia o dispositivo físico for capaz de replicar (ou superar) a inteligência humana. No entanto, antes que tal questão cause desconforto, ainda existem muitos reveses, não somente técnicos, mas também teóricos e conceituais para que tal indagação se consolide. Caso um dia ocorra, o homem terá que repensar sua posição no universo e buscar, além da inteligência e da consciência, algo que o defina como uma criatura especial ou aceitar sua insignificância[16].

O ser humano, com sua capacidade de raciocínio, por muito tempo procurou compreender, perceber, prever e manipular um mundo muito maior e mais complexo que ele próprio. Contudo, o campo da inteligência artificial vai mais além: visa não somente compreender, mas também construir entidades inteligentes. Outrossim, a inteligência artificial é ainda considerada uma ciência recente, visto que teve início depois da Segunda Guerra Mundial e, hodiernamente, envolve uma ampla gama de subcampos, desde áreas de uso geral (como aprendizado e percepção) até tarefas específicas (como jogos de xadrez, como demonstração de teoremas matemáticos, criação de poesia e diagnóstico de doenças)[17].

Cabe dizer que a inteligência artificial não é outra coisa senão o estudo de mecanismos subjacentes ao comportamento inteligente por meio da construção e da avaliação de artefatos que tentam implementar estes mecanismos. Neste sentido, pode-se refletir que a inteligência artificial é menos uma teoria sobre mecanismos subjacentes à inteligência e mais uma metodologia empírica para construir e testar possíveis modelos para suportar referida teoria. Trata-se de um comprometimento com o método científico de projetar, executar e avaliar experimentos com o intuito de refinar o modelo e continuar a experimentar[18].

Urge ter cristalino que a inteligência artificial se diferencia da informática na medida em que resolve problemas com características bastante distintas. Os óbices da inteligência artificial resistem a uma especificação e se encontram, em geral, com descrição incompleta, referem-se a domínios dinâmicos, isto é, são difíceis de serem abordados por intermédio de uma aproximação modular, encontram-se intimamente associados ao contexto do seu uso e tem soluções que costumam ser adequadas, ao invés de corretas[19].

Também é preciso ter claro que a inteligência artificial é um ramo da ciência da computação cujo interesse é bastante explícito: fazer com que os computadores pensem ou se comportem de forma inteligente. Ademais, a inteligência artificial está relacionada também com a psicologia, a biologia, a lógica matemática, a linguística, a engenharia, a filosofia, entre outras áreas científicas[20]. Além destas, pode-se acrescentar a ciência jurídica, ou o direito, como sendo um âmbito que sofre interferência da inteligência artificial e também atua sobre ela, já que esta tecnologia carece de regulamentação e causa implicações nas relações sociais.

Fato é que a inteligência artificial é promissora e tem como interesse basilar a descoberta de um modo efetivo de entender e aplicar técnicas inteligentes para a solução de problemas, para o planejamento e o desenvolvimento de habilidades de comunicação a fim de solver adversidades práticas. É fulcral enfatizar que entre as características relevantes que parecem ser comuns para todas as divisões da área da inteligência artificial estão: a utilização do computador para executar raciocínio, reconhecimento de padrões, aprendizagem, etc.; o foco em problemáticas que não respondem soluções algorítmicas; um interesse na solução de problemas utilizando informações inexatas, faltantes; um raciocínio empregando atributos qualitativos com significado em uma situação; uma tentativa de tratar de questões envolvendo tanto significado semântico como forma sintática; respostas que não são nem exatas, nem ótimas, mas são suficientes em um sentido, visto que os exatos ou ótimos são caros demais ou impossíveis; e o uso de vastas quantidades de conhecimento específico de um domínio para resolver problemas[21].

Isto devidamente esclarecido, a inteligência artificial, como visto, relacionada às mazelas dinâmicas, não encontra soluções exatas. Sabe-se que os problemas que decorrem das mudanças climáticas não serão resolvidos de forma precisa, mas necessitam de alternavas adequadas que minimizem seus impactos. Sendo assim, a inteligência artificial é capaz de contribuir para a busca de recursos que minorem os impactos dos gases de efeito estufa e possibilitem a manutenção da vida na Terra de forma equilibrada.

A fim de ressaltar como a inteligência artificial pode contribuir para a redução dos problemas causados pelas mudanças climáticas, é fundamental discorrer sobre o artigo “Tackling Climate Change with Machine Learning” escrito por pesquisadores que destacam que nos últimos anos o machine learning, ou seja, o aprendizado de máquina, tem sido reconhecido como uma ferramenta poderosa para o progresso tecnológico. Apesar do crescimento da aplicação da inteligência artificial, ainda há problemas sociais globais que precisam de um esforço conjunto a fim de identificar como mencionada ferramenta pode ser melhor aplicada, com ênfase para o combate das mudanças climáticas, por meio da engenharia eficaz e da pesquisa inovadora[22]. O artigo em questão apresenta uma lista detalhada com campos em que a inteligência artificial pode contribuir no combate às mudanças climáticas, entre as disposições estão: energia, transporte, construções e cidades, indústria, fazendas e florestas, remoção de dióxido de carbono, predições climáticas, impactos sociais, geoengenharia solar, ferramentas para indivíduos, ferramentas para a sociedade, além de educação e finanças.

Por exemplo, de acordo com o artigo, a inteligência artificial pode contribuir para a redução dos efeitos das mudanças climáticas, no tópico das construções e cidades a partir da implementação de smart cities; na seara das indústrias, por meio da otimização das cadeias de suprimentos e da melhoria dos materiais; no âmbito das ferramentas individuais em virtude do auxílio para compreender a pegada de carbono pessoal, a importância da mudança de comportamento, etc.[23]. Destarte, evidente que a inteligência artificial contribui para a gestão dos impactos das mudanças climáticas, uma vez que toca setores como a agricultura, a água, energia e transporte, por meio das redes de energia limpa, da agricultura de precisão, do monitoramento ambiental, etc., todos com forte influência na alteração da temperatura e nas consequências decorrentes da emissão exacerbada de gases de efeito estufa.

Assim, notórios são os benefícios da inteligência artificial para a redução dos impactos das mudanças climáticas, uma vez que influencia, inclusive, a promoção de um futuro mais sustentável. Sabe-se que por intermédio da inteligência artificial, diversas companhias vislumbraram nichos de mercado em prol de contribuir com a sustentabilidade e com um consumo mais responsável de recursos naturais. Um dos exemplos que pode ser citado é o programa de inteligência artificial chamado “Al for Earth” criado pela empresa Microsoft, o qual oferta recursos computacionais a partir da nuvem para organizações que procuram transformar a forma de gerir os recursos naturais da terra; de forma mais minuciosa: a ferramenta pode ser empregada para diagnosticar condições da água, do ar e do solo a partir da captura de dados e de informações para o desenvolvimento de soluções mais sustentáveis, tendo, portanto, como frentes de atuação mais relevantes a agricultura, a água, a biodiversidade e as mudanças climáticas[24].

No que diz respeito ao setor de energias renováveis no Brasil, sabe-se que a partir de sistemas inteligentes de informação e big data, tem sido possível

contribuir para assuntos como geração distribuída, mercado livre e uma matriz energética mais diversificada mirando contra um modelo centralizado e obsoleto de geração, transmissão e distribuição de energia. Essas inovações disruptivas estão ligadas diretamente aos conceitos ordinários da sustentabilidade; ter o menor impacto ambiental, proporcionar um bem social e ser economicamente viável[25].

Além do exposto, importa destacar que atualmente tramita no Congresso Nacional Brasileiro um projeto de lei sobre inteligência artificial. Trata-se do PL nº 5.051/2019, o qual, segundo a sua ementa, estabelecerá os princípios para o uso da inteligência artificial no Brasil. Este projeto é uma norma de caráter geral. Verdade é que o fundamento de transparência e possibilidade de auditoria condizem com as normas internacionais sobre o tema, no entanto, o projeto aborda de uma maneira muito simplista o árduo problema da atribuição da responsabilidade civil por danos causados por agentes artificiais autônomos. Assim, o texto ainda está longe de se tornar viável, mas ainda assim é um começo[26].

Isto posto, a inteligência artificial é um recurso que precisa ser explorado no que diz respeito ao fenômeno das mudanças climáticas para contribuir na mitigação dos malefícios. Se for considerado que as alterações mais severas na temperatura, nível do mar, qualidade do ar, etc. de fato proliferaram a partir da industrialização e, por conseguinte, do aprimoramento dos bens tecnológicos, é preciso utilizar estes novos conhecimentos para em prol do bem-estar de todas as espécies de vida, ou seja, se foi a tecnologia a grande responsável pelas mazelas, não existe nada mais probo que sua utilização como antídoto do mal que causou. Assim, é importante que sejam desenvolvidas técnicas, promulgadas legislações regulamentadoras, que seja estimula a consciência voltada para a redução da emissão de gases de efeito estufa, bem como seja fomentado o uso da inteligência artificial para soluções não exatas, nem ótimas, nem corretas, mas sim adequadas e suficientes.

2. A desinteligência humana ao prejudicar as florestas

Como observado no fragmento prévio, um dos fatores que causa mudanças climáticas é a destruição de florestas, uma vez que tal devastação gera alterações no padrão do uso do solo, visto que o carbono armazenado na vegetação e no solo escapa para a atmosfera. Logo, o ser humano é o responsável por esta destruição, seja por meio do desmatamento, seja por meio de incêndios florestais, ambas ações antrópicas que prejudicam o meio ambiente. Assim, as referidas atitudes provocadas pelo homem possuem ampla relação com as mudanças climáticas.

Para compreender a magnitude do prejuízo da devastação florestal, cabe compreender algumas condições. Destarte, sabe-se que para que uma planta possa se desenvolver é preciso que ocorra uma troca de nutrientes, a qual acontece na atmosfera, na hidrosfera e na crosta terrestre. Entre estes nutrientes se encontra o carbono, que é captado da atmosfera pela planta na forma de gás carbônico durante o processo de fotossíntese, na qual há a liberação do oxigênio. Assim, uma planta armazena carbono durante a fase inicial do seu desenvolvimento. Quando esta etapa termina, a quantidade de carbono armazenada na respiração se equipara à quantia devolvida para a atmosfera pela respiração. Isto significa, então, que quando a planta deixa de crescer a quantidade de carbono armazenada não aumenta mais. Contudo, enquanto a floresta existir, este elemento permanecerá estocado formando verdadeiros reservatórios de carbono, de modo que o reflorestamento é uma opção para enfrentar o aumento do efeito estufa [27].

Depreendida esta informação, acresce-se que outros efeitos da destruição concorrem para a deterioração do ambiente e alteração da fertilidade florestal, como a eliminação da sombra, que culmina em um aumento excessivo da temperatura dos solos. Referido aumento causa a rápida destruição do húmus e da flora de fungos e outros microrganismos indispensáveis para a fertilização do solo, bem como pode aumentar a evaporação direta, o que causa a subida da umidade das regiões mais profundas do solo, carregadas de sais de ferro em solução. Tais sais, ao secarem, se depositam e originam a formação dos chamados “ladrilhos” de terra aglutinada (por sais de ferro), que são impermeáveis[28]. Por conseguinte, o impacto do desmatamento e das queimadas florestais é incontestavelmente um dos causadores das alterações climáticas.

Quando se fala em florestas, não há como deixar de mencionar a Floresta Amazônica, visto a importância de sua existência ao equilíbrio do planeta. Assim, a região amazônica abriga um dos ecossistemas mais ricos e complexos da Terra. A Floresta Amazônica possui mecanismos bastante sofisticados de interação com a estrutura viva em que se apoia e com a atmosfera. Assim, não é fácil dissociar

os efeitos dos processos biológicos, da química da atmosfera, da microfísica de nuvens e de outras variáveis que mantêm funcionando esse complexo arranjo ecológico-climático. Em particular, as fortes emissões atmosféricas de gases e partículas pela floresta, alimentando nuvens e fazendo chover de modo eficiente, são essenciais para a manutenção do intenso ciclo hidrológico que sustenta a maior bacia fluvial do mundo. Ou seja, a floresta controla parte do clima e também é influenciada por ele[29].

Ocorre que reportada estrutura está sendo intensivamente pressionada pela expansão das atividades agrícolas predatórias e pelas mudanças climáticas globais. São estes dois fatores que alteram com rapidez o ecossistema e podem atingir o arcabouço hidrológico que mantém a floresta. Outrossim, a agricultura intensiva e o desmatamento provocam alterações abissais nos ciclos biogeoquímicos que agem sobre o sistema climático da Terra. Deste modo, não restam dúvidas que a questão das mudanças climáticas globais é um dos desafios colossais socioeconômicos e também científicos com que a humanidade terá que lidar tanto neste século quanto nos vindouros[30].

Quando se aborda a Floresta Amazônica não há como deixar de mencionar o lamentável episódio das queimadas florestais que ocorreram no ano de 2019. Fato é que a quantidade de focos de incêndio registrados na Amazônia em 2019 foi uma das maiores dos últimos anos. De janeiro até agosto do referido ano, o número de queimadas na região foi 145% superior ao registrado no mesmo período de 2018[31].

Neste sentido, as queimadas e as mudanças climáticas operam em um ciclo vicioso, isto é:

quanto mais queimadas, mais emissões de gases de efeito estufa e, quanto mais o planeta aquece, maior será a frequência de eventos extremos, tais como as grandes secas que passaram a ser recorrentes na Amazônia. Para além das emissões, o desmatamento colabora diretamente para uma mudança no padrão de chuvas na região, que amplia a duração da estação seca, afetando ainda mais a floresta, a biodiversidade, a agricultura e a saúde humana[32].

Sabe-se que a Floresta Amazônica Brasileira se manteve intacta até o início da era quase “moderna” do desmatamento, ou seja, com a inauguração da chamada Rodovia Transamazônica em 1970. Verdade é que desde o ano de 1991 os índices de desmatamento aumentam em um ritmo variável, mas rápido. A principal causa do desmatamento é a criação de gado. A degradação da floresta em comento resulta do corte seletivo, dos incêndios, entre outros, de modo que os impactos das ações de desmatamento incluem a perda da biodiversidade, a redução dos ciclos da água (e também da precipitação) e o aquecimento global. Para desacelerar esta atitude antrópica é preciso que estratégias sejam adotadas, como a repressão por meio de procedimentos de licenciamento, monitoramento e multas. As penalidades precisam ser suficientes para impedir os desmatamentos ilegais[33].

Reforça-se que entre os impactos do desmatamento estão a erosão do solo, a sua compactação e a exaustão dos nutrientes. Ademais, o desmatamento “acaba com as opções de manejo florestal sustentável tanto para os recursos madeireiros quanto para os farmacológicos e os genéticos”[34]. Outrossim, as funções da bacia hidrográfica são perdidas quando se transforma a floresta em área de pastagem. Além disso, a precipitação nas áreas desmatadas escoa de modo muito rápido, originando as cheias, as quais são seguidas por fases de redução, ou até mesmo de interrupção, do fluxo dos cursos d’água[35].

Isto posto, percebe-se que o desmatamento e os incêndios florestais têm um grande impacto na biodiversidade, bem como nas relações socioeconômicas. Fato é que a ocorrência de incêndios altera a estrutura, causa danos e diminui a viabilidade ecológica, por meio da diminuição das interações do ecossistema, da fragmentação dos habitats, da degradação da riqueza genética das populações, da diversidade da flora e da fauna, além de afetar as comunidades relacionadas aos recursos e aos benefícios proporcionados pelo meio. O fogo tem um potencial destrutivo sobre as florestas (sejam elas nativas ou plantadas) e sobre o ecossistema em geral, ou seja, os incêndios causam impactos ambientais, sociais e econômicos[36].

Neste viés, quando se aborda a questão dos incêndios florestais é preciso ter claro que sempre trazem consequências, tanto é que as espécies podem, inclusive, sofrer adaptações evolutivas para sobreviverem em decorrência da intensidade e da frequência com que acontecem tais queimadas. À vista disso, a análise do impacto ambiental é importante

para os aspectos ecológicos, pois são adotadas as melhores medidas de controle ambiental; para os aspectos econômicos, em que é melhor adotar medidas preventivas, de menores custos em relação às medidas corretivas e, para os aspectos éticos, quanto à conscientização da população. A prevenção, sem dúvidas, deve ser levada em consideração para que os esforços sejam revertidos em medidas profiláticas, e não corretivas. Se o custo de supressão fosse repassado para a prevenção, as estatísticas em relação aos incêndios seriam reduzidas [37].

Verifica-se que existe sim uma consciência do quanto o desmatamento e os incêndios florestais são preocupantes e prejudiciais, sobretudo no que diz respeito às mudanças climáticas. Isto significa que o ser humano não age sem conhecimento do mal que causa, de modo que movido pela ganância, pela individualidade e pelo egoísmo destrói o meio ambiente sem preocupação com as formas de vida e com a manutenção do equilíbrio ambiental futuro. Deste modo, há como prevenir, mas falta interesse e atenção em relação a gravidade do problema causado pela destruição das florestas e seu consequente impacto global.

O ser humano entende o funcionamento do equilíbrio dos sistemas naturais, de maneira que deveria assumir uma postura ética em relação a sua manutenção. Em outros termos, é necessário que o homem tenha um compromisso para consigo e para com a humanidade em geral. Ocorre que o ser humano tem se comportado de um jeito que supõe que o vigor do estado de clímax seja definitivo, inabalável e imperturbável e seu produto inesgotável. Para o homem a natureza tem sido uma fonte interminável de bens, fonte essa que, para ele, não necessita de nenhuma compensação ou reposição. Reportado conceito de recurso natural que o homem se utiliza, nos dias atuais está tornando a depredação cada vez mais acelerada (e mais perigosa), basta observar as vastas quantias de matéria-prima de que precisa para sustentar o que, erroneamente, entende como desenvolvimento. Destarte, ao longo dos últimos tempos, a ação antrópica tem se tornado predatória, no sentido de criar situações irreversíveis, sobretudo porque a natureza não é capaz de repor o que dela é amplamente retirado ou restaurar tudo o que foi destruído[38].

Neste sentido, ao tomar em conta o sistema social vigente, que não é outro senão o capitalismo, observa-se que o ser humano desvia o seu interesse para a produção de bens de consumo. Consequentemente, a qualidade de vida reduz, uma vez que há a desvalorização da ética e também ocorre a ampliação do incentivo ao egoísmo. Fato é que o homem não conhece a si mesmo e não valoriza as pessoas por se preocupar em demasia com os bens materiais. Esta situação culmina em um consumismo exacerbado e contribui com os fatores prejudiciais para a saúde do próprio ser humano e para a qualidade e a preservação do meio ambiente[39].

Tendo em vista que a egolatria do ser humano somada a estima dos bens materiais no sistema econômico global vigente causam malefícios ao meio ambiente e que entre tais óbices está a destruição florestal que, por sua vez, causa mudanças no clima da Terra, bem como ao fato de que o Brasil detém vasta parte da Floresta Amazônica, cabe verificar legalmente como a proteção das florestas é feita, de modo que existem normas que precisam ser aplicadas para estimular o ser humano a refletir o impacto de suas ações, na medida que a punição não é apenas pecuniária ou da liberdade do infrator, mas é de toda a humanidade e das demais espécies que padecem do mal causado pela devastação florestal.

Assim, no Brasil, depois da edição do chamado “Código Florestal” (ou seja, a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, Lei nº 6.938/1981), o marco normativo mais importante para a consolidação do ramo do Direito Ambiental, dado que afirma valores ecológicos no sistema jurídico pátrio, foi a constitucionalização da proteção ambiental mediante a promulgação da atual Constituição da República Federativa do Brasil no ano de 1988, precisamente por meio do artigo 225. A partir deste marco, a ecologia e a proteção ambiental passaram a ocupar posição

de destaque no âmbito do ordenamento jurídico brasileiro. A proteção do ambiente – e, portanto, a qualidade, o equilíbrio e a segurança ambiental – passam a integrar a nossa estrutura normativa constitucional e, com isso, a assegurar um novo fundamento para toda a ordem jurídica interna. A consagração do objetivo e dos deveres de proteção ambiental a cargo do Estado brasileiro (em relação a todos os entes federativos) representa a conformação de um novo modelo de Estado de Direito, o qual é denominado por alguns autores como Estado Ambiental (ou – de acordo com a preferência dos autores – Socioambiental) de Direito, superando, respectivamente, os modelos liberal e social precedentes. Além disso, e talvez esta seja a inovação normativo-constitucional de direito-dever fundamental ao direito ao ambiente ecologicamente equilibrado, colocando os valores ecológicos no “coração” da ordem jurídica brasileira e, portanto, influenciando todos os demais ramos jurídicos, inclusive a ponto de implicar mesmo limites a outros direitos (fundamentais ou não). Alinha-se a isso tudo também uma nova dimensão ecológica na conformação do conteúdo normativo do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/88). Com base no novo “programa constitucional ecológico” estabelecimento em 1988, diversas leis ambientais foram elaboradas, regulamentando o art. 225 da CF/88[40].

Ademais, além da magnitude do artigo 225 da Constituição Federal para a proteção ambiental brasileira, a Lei nº 12.651/2012, que também é conhecida como o “Novo Código Florestal” estabelece normas gerais para a proteção da vegetação nativa, o que inclui disposições sobre áreas de preservação permanente, de reserva legal e de uso restrito, bem como sobre exploração florestal, suprimento de matéria-prima florestal, controle da origem de produtos florestais, controle e prevenção dos incêndios florestais, previsão de instrumentos econômicos e financeiros para atingir os seus objetivos, etc. Ainda, importa dizer que seu texto original foi modificado em alguns pontos pela Lei nº 12.727/2012 e que algumas regulamentações foram dadas pelo Decreto nº 7.830/2012. A aplicação do “Novo Código Florestal” se insere no arcabouço jurídico de instrumentos legais que orientam e que disciplinam a conservação dos recursos naturais no Brasil, assim como outras leis o fazem como, por exemplo, a Lei nº 6.938/1981 que trata da Política Nacional do Meio Ambiente, a Lei nº 9.605/1998 que é a chamada Lei de Crimes Ambientais (e o Decreto nº 6.514/2008 que regulamenta), a Lei nº 9.985/2000 que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) e da Lei nº 11.428/2006 que dispõe sobre a utilização e proteção da vegetação nativa do bioma Mata Atlântica, além de outras[41].

A partir do exposto, é possível perceber que existem legislações nacionais vigorosas no que diz respeito a proteção florestal. Contudo, não bastam boas leis se falta zelo e diligência do ser humano, capaz de desrespeitar o meio ambiente movido pela avidez implementada pela cultura do excesso da acumulação de capital. Não se defende que ampliar a gama de bens seja errado, o equívoco está em prejudicar a humanidade e todas as demais espécies vivas para cumular posses. Sendo assim, evidente que as florestas possuem uma função fulcral no equilíbrio climático e que a corrente devastação (desmatamento e incêndios) tem causado amedrontamento nas pessoas conscientes das consequências, ainda que os efeitos climáticos não sejam percepções exclusivas de alguns, visto que todos já sentem o impacto, por exemplo, do aumento da temperatura na Terra. Portanto, o ser humano não tem empregado a sua engenhosidade e sagacidade ao prejudicar o meio ambiente, de modo que não é congruente outorgar para as máquinas toda a responsabilidade de consertar seus erros.

Considerações finais

Computadores com processadores que fascinam pela rapidez, celulares com aplicativos que facilitam o cotidiano das pessoas, automóveis cada vez mais repletos de inovações que surpreendem até os mais peritos no assunto, etc., fato é que cada dia mais os seres humanos criam tecnologias surpreendentes. Em uma frequência bastante similar, a ação antrópica está devastando parte considerável dos recursos naturais e, em virtude da atividade adversa de uns e da falta de interesse de outros, as consequências das mudanças climáticas já estão sendo sentidas. Deste modo, a tecnologia, com ênfase nesta pesquisa para a inteligência artificial, pode ser utilizada na tentativa de redução dos efeitos da alteração no clima global.

Destarte, as pesquisas inovadoras que desenvolvem inteligência artificial em geral atuam em prol da redução das mudanças climáticas nos campos da energia, do transporte, da construção, das cidades, das indústrias, das fazendas e florestas, entre outros. Entretanto, ainda que as máquinas estejam dotadas de uma eficiência considerável, o ser humano precisa contribuir para solver o problema que causou, ou seja, a humanidade precisa agir para controlar e gerir da melhor forma possível as mudanças climáticas planetárias.

Em outros termos, verdade é que a inteligência artificial pode contribuir em prol da elaboração de sistemas de energia avançados, na descoberta de materiais que sejam mais sustentáveis, no monitoramento do desmatamento, etc., porém é o ser humano quem deve interromper a atividade de destruição florestal, por exemplo. De forma direta: o ser humano pode criar máquinas e investir em inteligência artificial para contribuir com a preservação e restabelecimento do meio ambiente, possui a capacidade de criar legislações e demais instrumentos jurídicos para dispor sobre a proteção ambiental e florestal, regulamentando as atividades nocivas, o ser humano é quem constitucionaliza a proteção ambiental, etc., isto quer dizer que ao mesmo tempo em que o homem é o causador dos prejuízos também é o ator principal na tarefa de reduzir os efeitos das mudanças climáticas, mas para tanto é preciso consciência, educação ambiental, educação para o consumo, vontade de mudar e atitudes que busquem soluções adequadas e suficientes.

Ademais, vale ressaltar que, em que pese o caráter antropocêntrico presente na Constituição Federal do Brasil de 1988 no artigo 225 (e esta é uma inquietude teórica da sua efetivação), uma vez que intenta a proteção das presentes e futuras gerações (de humanos), a inteligência artificial implementada não deve ser criada apenas com a pretensão de beneficiar a espécie humana, isto é, todas as formas de vida precisam ser albergadas pela mencionada tecnologia. Neste sentido, chega-se a questionar se a inteligência artificial deveria simular a capacidade do ser humano de pensar (de ser inteligente), já que no que tange à consciência da necessidade de preservar as florestas, evitando desmatamentos e incêndios, o ser humano tem se mostrado cada vez mais incivil. Outrossim, não há inteligência artificial que consiga superar a ignorância do ser humano que causa incêndios e desmata as florestas, os prejuízos são colossais e os impactos perduram no futuro, mas se espera que estas novas criações tecnológicas auxiliem na reparação das consequências da mudança climática global, bem como na redução da destruição florestal.

Referências

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Submetido em: 9 set. 2020.

Aceito em: 27 dez. 2022.

 



[1]    RIO GRANDE DO SUL, Assembleia Legislativa. Comissão de Saúde e Meio Ambiente. Aquecimento global: somos todos responsáveis. Porto Alegre: Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, 2007, p.11.

[2]    Tradução livre: “o relatório intergovernamental de 2018 sobre mudança climática estimou que o mundo enfrentará consequências catastróficas, a menos que as emissões globais de gases de efeito estufa sejam eliminadas dentro de trinta anos. No entanto, ano após ano, essas emissões aumentam.”

[3]    ROLNICK, David et al. Tackling Climate Change with Machine Learning. Disponível em: https://arxiv.org/pdf/1906.05433.pdf Acesso em: 04 mar. 2020, p. 01

[4]    RIO GRANDE DO SUL, 2007, p.112

[5]    DOW, Kirstin; DOWNING, Thomas E. O atlas da mudança climática: o mapeamento completo do maior desafio do planeta. Tradução: Vera Caputo. São Paulo: Publifolha, 2007, p.32.

[6]    RIO GRANDE DO SUL, 2007, p.13-14.

[7]    WELZER, Harald. Guerras climáticas: por que mataremos e seremos mortos no Século XXI. Tradução: William Lagos. São Paulo: Geração Editorial, 2010, p. 50-51.

[8]    DOW; DOWNING, 2007, p.36.

[9]    ROLNICK, David et al., 2020, p. 01.

[10]  RIO GRANDE DO SUL, 2007, p.14-16.

[11]  DOW; DOWNING, 2007, p. 69.

[12]  MEIO AMBIENTE, Ministério do. Política Nacional sobre Mudança do Clima. Disponível em: https://www.mma.gov.br/clima/politica-nacional-sobre-mudanca-do-clima Acesso em: 05 mar. 2020.

[13]  DOW; DOWNING, 2007, p.69.

[14]  WELZER, 2010, p. 276.

[15]  PESSIS-PASTERNAK, Guitta. Do caos à inteligência artificial: quando os cientistas se interrogam. Tradução de Luiz Paulo Rouanet. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1993, p. 193-194.

[16]  TEIXEIRA, João de Fernandes. O que é inteligência artificial. E-galáxia, 2019.

[17]  GOMES, Dennis dos Santos. Inteligência Artificial: Conceitos e Aplicações. Revista Olhar Científico – Faculdades Associadas de Ariquemes – V. 01, n.2, Ago./Dez. 2010, p. 234.

[18]  LUGER, George F. Inteligência artificial: estruturas e estratégias para a solução de problemas complexos. Tradução: Paulo Engel. 4 ed. Porto Alegre: Bookmann, 2004, p. 707.

[19]  COELHO, Helder. Inteligência artificial em 25 lições. Lisboa, Portugal: Fundação Calouste Gulbenkian, 1995, p. 20.

[20]  GOMES, 2010, p. 239.

[21]  LUGER, 2004, p. 48.

[22]  ROLNICK, 2020, p. 02.

[23]  ROLNICK, 2020.

[24]  NORONHA, Matheus Eurico Soares de; RODRIGUES, José Carlos; VALENTE, Lucas Luiz Fernandes. Sustentabilidade 4.0. 8 ed. O dogmático mercado de arte. Uma crítica contemporânea em desenvolvimento. CIANTEC, 2018, p. 210-211.

[25]  NORONHA; RODRIGUES; VALENTE, 2018, p. 210-211.

[26]  CABRAL, Guilherme Sorg. Análise do PLS nº 5051/2019 – regulação do uso da inteligência artificial no Brasil. Disponível em: https://www.academia.edu Acesso em: 04 mar. 2020.

[27]  HELENE, M. Elisa Marcondes. Florestas: desmatamento e destruição. São Paulo: Scipione, 1996, p. 54.

[28]  BRANCO, Samuel Murgel. O desafio amazônico. São Paulo: Moderna, 1989, p. 53.

[29]  CAPOZZOLI, Ulisses. Amazônia: tesouros. São Paulo: Duetto, 2008, p. 91.

[30]  CAPOZZOLI, 2008, p. 91.

[31]  GREENPEACE BRASIL. Amazônia sob ataque: queimadas têm aumento de 145% em 2019. 20 de agosto de 2019. Disponível em: https://www.greenpeace.org Acesso em: 04 mar. 2020.

[32]  GREENPEACE BRASIL, 2019.

[33]  FEARNSIDE, P.M. Desmatamento na Amazônia brasileira: História, índices e consequências. p. 7-19. In: Fearnside, P.M. (ed.) Destruição e Conservação da Floresta Amazônica, Vol. 1. Manaus: INPA, 2020, p. 08.

[34]  FEARNSIDE, 2020, p. 12.

[35]  FEARNSIDE, 2020, p. 12.

[36]  GUIMARÃES, Pompeu Paes; et al. Análise dos impactos ambientais de um incêndio florestal. AGRARIAN ACADEMY, Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.1, n.01; 2014, p. 39.

[37]  GUIMARÃES et al., 2014, p. 57.

[38]  BRANCO, Samuel Murgel. O desafio amazônico. São Paulo: Moderna, 1989, p. 30-31.

[39]  SOUSA, Nayara Machado de; FARIA, Ligia Carolina Borges. A relação do homem com a natureza e seus aspectos psicológicos na destruição e preservação ambiental. Intercursos v. 8, n. 2, jul./dez 2009, p. 86-87.

[40]  SARLET, Ingo Wolfgang e FENSTERSEIFER, Tiago. Direito ambiental: introdução, fundamentos e teoria geral. São Paulo, Saraiva, 2014, p. 241.

[41]  EMBRAPA. Entenda a Lei 12.651 de 25 de maio de 2012. Disponível em: https://www.embrapa.br/codigo-florestal/entenda-o-codigo-florestal Acesso em: 05 mar. 2020.